Exclusivo com Magnus Emeus: "Foi uma bênção ser despromovido ao terceiro escalão"

Magnus Emeus, o presidente do Mjällby
Magnus Emeus, o presidente do MjällbyMjällby

Presidente do Mjällby desde março de 2015, Magnus Emeus passou pelos pontos baixos e altos do Mjällby, recém-coroado campeão da Suécia. Em conversa exclusiva com o Flashscore, este empresário sueco revelou como o clube conseguiu passar de estar à beira da bancarrota para alcançar um dos maiores feitos do futebol sueco e europeu.

- O que significa tudo isto para o clube, para a comunidade?

- Acho que tudo, somos de uma pequena vila. Ter uma equipa a jogar na elite da Suécia é um feito, ser coroados campeões… coloca a comunidade, a vila nas bocas do mundo. Toda a gente está a falar sobre nós. É um conto de fadas que é importante para a comunidade e para o clube. Isto vai ser lembrado para sempre, os envolvidos entraram para a história, vão ser imortais como lendas, heróis. Ninguém esperava isto, além da equipa. Eles tinham crença, mais ninguém. É a nossa sexta época consecutiva na Allsvenskan, conseguimos atingir o quinto lugar na temporada passada, mas com o músculo financeiro limitado que temos, de onde vimos, não devíamos ganhar. Não foi só ganhar, foi ganhar com o recorde de pontos. Não tem a ver com as outras equipas estarem mal. Disseram que as grandes equipas não estavam a ter uma grande época, é irrelevante, mesmo que tivessem uma boa época não nos íamos apanhar. Resumindo, significa tudo e lança bases para o que estamos a construir. Queremos continuar a crescer, vamos tentar na próxima época, vamos ver como corre.

- Quando começou a acreditar que era possível?

- Estivemos no primeiro lugar durante algum tempo. Quando conseguimos vitórias consecutivas contra o Djürgarden e Hammarby em Estocolmo, num curto espaço de tempo, comecei a pensar que seria possível. Depois vencemos o Malmö. Mas só comecei mesmo a acreditar, eu sou muito cauteloso, quando vencemos o Brommapojkarna, reduzidos a 10, até jogámos melhor assim. 

- O que torna este clube especial e como se consegue atrair jogadores?

Essa equipa criou expectativas, uma mentalidade vencedora, de que este clube devia ser de elite na Suécia. Era uma loucura. Essa foi a base. Todos os que trabalham no clube tiveram de viver nessa expectativa. Aqui não é uma pressão, porque apesar de tudo sabem que fazemos o máximo que podemos. Quando cheguei, estávamos mal, com despromoções consecutivas, eu pensava que, considerando as condições, o terceiro lugar não era um desastre. Mas tinha noção de que não era bom o suficiente para nós, tínhamos de dar o melhor para elaborar um plano, executá-lo, para voltar ao topo. Isso ajudou. Depois posso falar dos últimos 11 anos em que tivemos bons jogadores. E tu perguntas, como podes ter bons jogadores se são de um sítio pequeno, não pagam grandes salários, não podemos oferecer o ambiente da grande cidade, mas demos a volta a isso, somos um clube familiar. Todos os jogadores que estiveram aqui dizem que tiveram aqui um dos melhores anos da carreira. Somos um clube que acredita que a equipa está acima de tudo. Focámos em ser os melhores nas coisas que não custam dinheiro. O espírito de equipa, toda a gente fala disso, mas aqui percebe-se isso, de manhã toda a gente cumprimenta toda a gente, é uma regra. Criámos esse ambiente e é grátis. Somos excelentes noutras áreas em que temos de ser melhores que os grandes clubes, na estratégia, plano de jogo. Se não formos melhores que eles nisso não conseguimos vencer o Malmö ou o Djürgarden. Não devemos retirar mérito aos nossos jogadores também, que são excelentes, mas os 11 criam uma união que parecem 12 ou 13 em campo. Depois temos uma filosofia de constante crescimento. Há 11 anos que crescemos nos indicadores-chaves de performance. Não podemos esperar sucesso no campo, se não existir estabilidade e sucesso financeiro fora do clube. Estas duas coisas andam de mão dadas. Muitos clubes são ansiosos e arriscam para vencer, depois não conseguem e ficam em problemas. A nossa abordagem é mais sistemática, temos sempre de melhorar em relação ao ano anterior. É a mesma metodologia das empresas que estou a gerir há 25 anos.

A festa do Mjällby
A festa do MjällbyMjällby AIF

- Falando de quando chegou, em 2015, com a equipa em risco de cair para a quarta divisão.

- Primeiro existia uma mentalidade perdedora a tomar conta do clube. Fomos despromovidos, tínhamos uma equipa decente e aconteceu algo que não é assim tão fora do normal, duas quedas consecutivas. O pior era mesmo em termos financeiros, estávamos à beira da bancarrota, tínhamos dívidas com o banco, nenhum dinheiro. Foi uma bênção ser despromovido ao terceiro escalão, porque não teríamos sido autorizados a jogar na segunda com esta situação financeira. Tivemos de implementar uma política financeira muito restrita. Os custos tu podes controlar, o rendimento varia e se tu acreditas que vais ter 100, metemos 60, 65. Toda a gente questionava, mas metíamos o que tínhamos 100% de certeza. Depois construíamos os custos de forma que se tudo corresse mal, ficávamos com algum dinheiro no final do ano com o mínimo de rendimento. Foi o que fizemos durante os primeiros sete anos, em que não vendíamos jogadores. Passámos de 5 milhões de coroas negativas para 15 milhões positivos. Nos últimos três anos demos o maior salto financeiro graças às transferências, onde somos inteligentes a encontrar jogadores a preços acessíveis para depois vender por um valor muito mais alto.

- Perante esse cenário, o que o atraiu para o clube?

- Eu sou local, conheço o clube, fui jogador aqui, tive a oportunidade de estar na equipa principal, mas estava na universidade fora e rejeitei. O Mjällby é o grande clube aqui e quando regressei à Suécia foi uma honra ter sido convidado por um diretor para me juntar à Direção e acabaram por me convencer a ir para presidente porque conhecia o futebol e era um gestor de sucesso. Quando aceitei, no verão de 2014, o Mjällby estava na Allsvenskan, quando fui eleito estavam na Superettan e quando comecei efetivamente a trabalhar estavam na terceira divisão. Não foi o início que esperava quando disse que sim. O único ponto positivo é que podia fazer grandes mudanças e ninguém questionava. Sabiam que tínhamos de fazer mudanças drásticas, não ter empregados, focar-nos no futebol e implementar as políticas que expliquei antes. Estou muito orgulhoso por isso e por ver um clube de futebol com métodos industriais, que são necessários num ambiente duro como a Allsvenskan.

- Temos vistos muitas comparações com o Leicester, mas eles tinham um dono multimilionário. O Mjällby teve de ser mais engenhoso financeiramente.

- Não retiro mérito ao Leicester, foi muito bom no contexto deles, mas a comparação acaba aí. Somos clubes tão diferentes, eu não tinha dinheiro para investir no clube. Não dá para comparar histórias. Temos 1500 pessoas a viver aqui, rendimentos muito inferiores, a regra de 50+1 que nos obriga a fazer o que fizemos. Sem isto não tínhamos alcançado este feito. 

- Aposta em Anders Torstensson, um treinador sem grande histórico, como aconteceu?

- Conheço-o há muitos anos, joguei com ele. Ele era um treinador em divisões inferiores e sempre encontrava forma de ganhar, ganhou títulos lá. É um vencedor e sempre encontrou formas de vencer adversários, tem essa habilidade. Foi o primeiro nome que me surgiu na cabeça quando estávamos em dificuldades, em 2021. Fui eu que lhe liguei a pedir ajuda e acabei por lhe oferecer o cargo de treinador. Sobrevivemos e ficámos surpreendidos quando ele disse que queria voltar à vida normal. Tivemos um ano decente, o nosso treinador saiu. E começámos a pensar a nossa equipa técnica com três personalidades diferentes. O Anders é o ADN do Mjällby, depois fomos buscar um antigo treinador da formação e para juntar a eles encontrámos o Aksum. O Anders era a figura ideal para treinador principal. Há muitos treinadores bons, mas que não sabem ser líderes, ele era a pessoa perfeita. Juntos formaram um trio de sucesso, porque nenhum deles ia conseguir sozinho, mas enquanto equipa sim.

- O que traz o futuro para o Mjällby?

- Temos de digerir um bocado isto ainda. A reposta fácil é que temos de continuar a fazer as coisas que temos vindo a fazer. O sistema funciona há 10 anos, não vemos motivos para mudar. Enquanto aqui estiver, e há eleições em março, vamos trabalhar com a mesma metodologia de melhorar ano a ano. Agora temos de estabelecer novos objetivos. E usar a oportunidade que temos nas provas europeias, porque vai dar muito dinheiro e temos de perceber como o usar para criar bases de sucesso. Temos de fazer crescer a nossa academia, é o futuro da nossa equipa. Não queremos uma equipa sem jogadores locais, íamos perder muita da nossa identidade. Vamos gastar algum dinheiro na equipa principal, não vamos entrar em loucuras nas transferências. Nunca o fizemos. Comprámos excelentes jogadores no terceiro escalão que agora são de topo na Allsvenskan. A nossa equipa de prospeção tem de encontrar jogadores com potencial. Temos de aproveitar a oportunidade, mas trabalhando da forma como temos vindo a trabalhar.