Depois da polémica com o Vilaverdense, no início da época passada, devido a um grave problema financeiro - caso que o Flashscore retratou em reportagem -, a nova edição da Liga Feminina também promete fazer correr muita tinta, com o Famalicão a considerar impugnar o arranque da Primeira e da Segunda Divisão do futebol feminino.
Uma decisão tomada devido ao processo que envolveu o Tribunal Arbitral do Desporto (TAD) e manteve o Damaiense no principal escalão, relegando o emblema minhoto para a segunda divisão, depois de ter sido convidado a participar no primeiro escalão.
Contexto do caso
Importa fazer um enquadramento temporal para se compreender melhor o caso. A 7 de junho, o Famalicão perdeu o play-off de manutenção e despromoção frente ao Rio Ave e caiu desportivamente para o segundo escalão. No entanto, a 21 de junho, foi revelada a lista de clubes licenciados e o nome do Damaiense não constava.
De acordo com o acórdão da FPF, estavam “em causa incumprimentos nos critérios mínimos exigidos em áreas como infraestruturas, recursos humanos, requisitos legais e situação financeira”, facto que levou o organismo que tutela o futebol nacional a convidar o Famalicão, no dia 24 de junho, para ocupar a vaga na Liga.
A partir desse momento, o emblema famalicense iniciou a preparação da nova época acreditando que iria competir na principal divisão, mesmo depois de, a 2 de julho, o Tribunal Arbitral do Desporto (TAD) ter aceite a providência cautelar do Damaiense para a sua integração no principal escalão.
O processo avançou e o Famalicão apresentou a nova equipa técnica, assegurou reforços de peso com jogadoras com créditos firmados na competição e fechou patrocínios com base numa premissa clara: o clube iria participar na Liga 2025/26.
Contudo, a 4 de setembro, o TAD decidiu a favor do Damaiense e a FPF foi obrigada a reintegrar o clube da Damaia, que entretanto anunciou que irá jogar no Algarve, notificando de forma telegráfica o Famalicão de que estaria incluído no sorteio da segunda divisão, apenas a umas horas do mesmo.

"Temos de ter respeito pelas pessoas"
Estalou o verniz! Com “tudo pronto” para participar na Liga Feminina, o Famalicão não aceita este desfecho. Após a divulgação do comunicado oficial, o Flashscore procurou obter mais pormenores sobre o caso junto do presidente dos famalicenses.
"Fomos informados telefonicamente de que o Damaiense tinha interposto uma providência cautelar a contestar a situação, mas nunca esteve em causa a nossa participação, nem o risco de o Famalicão não jogar na Liga. Reforço: a FPF nunca nos comunicou, em momento algum, que havia dúvidas sobre a nossa participação na Liga", introduz José Pina Ferreira, em declarações exclusivas ao nosso portal.
A poucos dias do arranque da competição, o clube vê em risco contratos, patrocínios e sobretudo a vida profissional e pessoal de atletas e equipa técnica. O líder do Famaicão fala em desrespeito, desigualdade e numa decisão “desumana”, que “nunca aconteceria no futebol masculino”.
“Estamos a falar de um ataque direto aos direitos das atletas e da equipa técnica. Nunca isto aconteceria no futebol masculino. O que se está a passar é gravíssimo. Temos jogadoras que vieram do outro lado do mundo, que acreditaram no nosso projeto, que deixaram tudo para trás e agora vêem a sua vida e a sua carreira colocadas em causa a quatro dias do início da competição. É desumano", acusa.
“Temos jogadoras que se estão a recusar a continuar. Já temos duas que saíram porque não querem jogar na segunda liga, e compreendo-as... Eu não quero jogadoras insatisfeitas. Temos de ter respeito pelas pessoas. Havia expectativas criadas e eu não posso obrigar ninguém a jogar na segunda liga", continua.
"Não são apenas as jogadoras: estamos a falar de sete elementos da equipa técnica que também têm família, compromissos e contratos. Esta decisão afeta carreiras, estabilidade profissional e pessoal, e não pode ser tomada com esta leviandade, sem salvaguardar os interesses das partes envolvidas", reforça.
"Isto é brincar com a vida das pessoas. Nunca vi nada assim. É inaceitável que a Federação trate o futebol feminino desta forma, desvalorizando atletas, treinadores e todo o esforço que foi feito. Se queremos igualdade de género no desporto, não podemos permitir que estas situações aconteçam. O impacto é brutal e mostra uma falta de respeito enorme pelo trabalho, pela dedicação e pelos sonhos destas pessoas”, atira.

"Famalicão vê posta em causa a sua situação financeira"
Perante a decisão que o quer afastar da Liga e o remete para a segunda divisão, o Famalicão denuncia um cenário caótico, com impacto financeiro, estrutural e humano, que colocam em risco a sustentabilidade do projeto.
"O impacto é muito negativo. Se nos tivessem dito que havia risco, não teríamos preparado a equipa para esse cenário, porque isso faz uma enorme diferença de planeamento e investimento. O Famalicão não tem suporte financeiro para arcar com estas consequências. Estamos a ser tratados de forma leviana. Queremos que o futebol feminino cresça, mas não é com esta postura da Federação que isso vai acontecer. Assim, não vamos longe”, advoga.
"Alugámos um estádio, temos contratos com patrocinadores que agora querem desistir, porque não lhes interessa fazer publicidade na segunda liga. Com este processo, o Famalicão vê posta em causa a sua situação financeira e também a formação, que é a génese do clube. Isto não pode ser assim", sublinha.
"Solução? A Federação tem de assumir o que fez e alargar a competição"
Perante todo este imbróglio, José Pina Ferreira, presidente do Famalicão, não tem dúvidas sobre qual seria, na sua opinião, a única solução capaz de minimizar os danos causados por esta situação. Para o dirigente, a Federação Portuguesa de Futebol deve assumir responsabilidades e encontrar uma decisão que proteja o clube e as jogadoras.
“A solução seria alargar a competição, nem que fosse para 11 equipas. O Famalicão foi convidado pela Federação e preparou-se para jogar na Liga. A Federação tem de assumir o que fez. Há uma falta de sensibilidade enorme", defende.
"A FPF não quer assumir as suas responsabilidades. Até posso compreender que o TAD tenha dado razão ao Damaiense, mas a responsabilidade não é do Famalicão. Temos contratos fechados, patrocinadores confirmados, e agora vemos tudo posto em causa. Tive uma conversa com o presidente da FPF e, sinceramente, acho que não esteve bem. Há formas de tratar as coisas e a Federação não está a assumir as consequências”, prossegue.
“Esperava que a Federação tivesse a coragem de assumir o erro e alargar a competição. Espero que assumam aquilo que assumiram connosco. É vergonhoso que estas notícias saiam e não haja um líder capaz de resolver o problema. O futebol feminino está a ser desvalorizado pelo Pedro Proença. Ele devia ter outra preocupação com a modalidade", completa.
Nota: Até ao momento, não houve qualquer posicionamento público por parte da FPF sobre o tema.
