Exclusivo com Jhon Arias: Do sonho em Quibdó à idolatria no Fluminense e a elite da Premier League

Jhon Arias conquistou a Taça Libertadores e a Recopa Sul-Americana com o Fluminense em 2023 e 2024, respetivamente
Jhon Arias conquistou a Taça Libertadores e a Recopa Sul-Americana com o Fluminense em 2023 e 2024, respetivamentePablo PORCIUNCULA / AFP / Profimedia

Jhon Arias (28) concedeu uma entrevista ao jornalista Pipe Sierra para o Flashscore. Nomeado para o The Best 2024, Arias conta como descobriu a sua nomeação por acaso e o que significa para ele estar entre os melhores médios do mundo. Fala ainda sobre o seu novo clube, o Wolverhampton, e como tem sido a adaptação ao frio, ao futebol inglês, à língua e ao nível de exigência da Premier League. Tudo isto sem esquecer o seu vínculo com o Fluminense, o legado que deixou no clube brasileiro, os amigos e os rumores sobre um eventual regresso ao Brasil.

Nomeação para o The Best

- Reforço do Wolves desde o início da época em Inglaterra, recentemente nomeado para os prémios The Best como um dos melhores médios. Como tem lidado com o frio neste inverno em Inglaterra?

Bem, estou a sentir-me bem. Sim, o inverno já começou aqui em Inglaterra, o clima é um pouco mais complicado, mas está tudo a correr bem, graças a Deus.

- Achas que para um colombiano, tendo em conta que é a tua primeira experiência com este tipo de clima, a adaptação ao inverno é difícil? Sei que ainda não está no auge, mas como tens vivido isso?

Gosto do frio. Vivi em cidades na Colômbia como Bogotá e Tunja, onde também se sente frio durante grande parte do ano. Não é igual, mas sinceramente gosto do frio. É uma questão de adaptação, todo esse processo é natural.

- O que estavas a fazer quando viste o teu nome na lista do The Best e como te sentiste?

Foi curioso. Estávamos a jantar em casa de um colega do clube. Quando regressei a casa, entrei no carro e ia procurar qualquer coisa no telemóvel, já nem me lembro o quê, e apareceu-me uma notificação de uma publicação do Fluminense. Entrei, vi e depois reparei em todas as mensagens que tinha, mas na verdade só percebi por acaso.

É um motivo de orgulho para mim estar nomeado para o The Best. Era um sonho e um objetivo: estar entre os melhores jogadores do mundo. A época passada foi excelente para mim a nível pessoal, com muitos aspetos positivos, culminando com o Mundial de Clubes, onde tivemos uma participação excecional e quebrámos muitos paradigmas, contrariando muitas das previsões que todos tinham sobre o Fluminense.

Estatísticas de Jhon Arias
Estatísticas de Jhon AriasFlashscore

Fluminense

- Ainda acompanha o Fluminense? Deixou uma marca, é um ídolo para os adeptos.

É complicado por causa dos horários. Não consigo ver os jogos porque acabam sempre de madrugada, devido à diferença horária. Mas sim, acompanho os resultados, os golos, a campanha que estão a fazer no Brasileirão, que é boa. Pelo que sei, garantiram a qualificação para a Taça Libertadores.

- Deixou bons amigos, têm estado atentos a si desde que saiu?

Foram bons anos, bons tempos no Fluminense, ficou esse carinho e respeito. Sim, tenho grandes amigos, excelentes colegas e às vezes falamos sobre como estou, como estão eles por lá. Esse vínculo não se perde, desejo-lhes o melhor na meia-final da Taça do Brasil e que tudo termine da melhor forma para eles.

Jhon Arias jogou o Mundial de Clubes 2025 com o Fluminense
Jhon Arias jogou o Mundial de Clubes 2025 com o FluminenseČTK / imago sportfotodienst / IMAGO

- Recentemente surgiu o rumor de que, devido ao momento que os Wolves atravessam, havia um clube brasileiro interessado em si, que não era o Fluminense, e que existia essa possibilidade. Pelo que percebo, não é verdade, mas disseram-lhe algo sobre isso?

Acho que é algo normal. No mundo do futebol há sempre rumores e especulações, ainda mais por tudo o que conquistei no Brasil. É natural que me associem a um ou outro clube. Faz parte do processo. Pela situação atual do clube, que não é das melhores, tivemos um mau início de época e, como as temporadas são diferentes, no Brasil já se pensa na próxima época e esses rumores aparecem.

Com a janela aberta, acredito que a especulação sobre um ou outro grande clube brasileiro vai aumentar, mas estou tranquilo, consciente do momento que vivemos no Wolverhampton, e estou a trabalhar muito para alcançar o objetivo e inverter a situação.

Wolverhampton

- Estreou-se pelos Wolves num amigável de pré-época e marcou um golo em poucos minutos. O que significou esse momento?

Foi uma bela estreia, um amigável contra o Girona. Era o meu primeiro jogo, as minhas primeiras sensações. Estava há três dias no clube, por isso foi um momento especial. Estou a trabalhar muito e focado para que as coisas melhorem, para poder marcar na Premier League e ajudar a equipa a sair desta situação. Acho que temos os recursos humanos necessários, mas não podemos negar que tivemos um mau arranque de época e precisamos de melhorar.

- No momento em que se estreia na Premier League, ou ao assinar o contrato, o que lhe passou pela cabeça depois de todo o percurso daquele menino que cresceu em Quibdó e que agora cumpre o sonho de jogar numa liga que, para muitos, é a mais importante do mundo?

É a concretização de sonhos, de metas e objetivos de vida. Qualquer pessoa, em qualquer profissão, quer chegar à elite, aos melhores lugares, aos melhores palcos, isso é natural e mostra a minha ambição e o meu carácter de querer sempre mais, de procurar sempre o melhor para a minha carreira.

No momento em que tive a oportunidade de vir para o Wolverhampton, que foi o clube que me abriu essa porta para a Premier – e para mim também, é a melhor liga do mundo – era um projeto que sabia que seria desafiante, complexo e uma oportunidade de realizar esse sonho, esse objetivo pessoal de chegar à melhor liga do mundo, de estar rodeado dos melhores jogadores.

É isso que se ambiciona quando se começa a jogar futebol, estar entre os melhores, essa foi a minha motivação. É a realização de sonhos pessoais, da minha família, das pessoas que estiveram comigo e me ajudaram, que fizeram parte deste processo. Só posso agradecer. Tive a sorte, ao longo da minha carreira, de quebrar muitos paradigmas e probabilidades. Sabia que vir para o Wolverhampton, com a idade com que vim, para um clube da Premier, pelo valor pago, estava fora do padrão do futebol atual. Por isso estou feliz com esta oportunidade que me foi dada.

Arias ainda procura o seu melhor nível no Wolverhampton
Arias ainda procura o seu melhor nível no WolverhamptonMI News/NurPhoto / Shutterstock Editorial / Profimedia

- Como tem sido a adaptação ao futebol e à língua? Sei que já estava a ter aulas de inglês mesmo antes de assinar pelos Wolves.

É uma liga totalmente diferente, o que até é positivo porque te faz evoluir como jogador e como pessoa. Ajuda-te a crescer mentalmente pela complexidade, porque é uma liga com uma margem de erro muito pequena, a qualidade dos jogadores é superior. O ritmo, o aspeto físico, tudo é diferente das outras ligas a que estamos habituados. Isso por si só explica porque é considerada por muitos a melhor liga do mundo.

É muito exigente, mas sinceramente, independentemente da situação do clube, tenho-me sentido bem. Tenho evoluído com o passar dos jogos, o que é normal. A adaptação faz parte das mudanças, da transição de uma liga para outra; no meu caso, de um continente para outro. Por isso, tenho-me sentido bem. Hoje sinto-me muito melhor, mais integrado na Premier League.

No Wolverhampton, sou uma pessoa muito centrada, tranquila e consciente das coisas. Sei o que me trouxe até aqui, até onde posso ir. O que me fez alcançar grandes coisas foi manter-me humilde, a trabalhar e focado. É a única forma que conheço de alcançar objetivos. Estou consciente da situação em que estamos, mas também sei que tenho tudo o que é preciso para inverter este momento. Tenho essa convicção. Também tivemos um pouco de azar, mas é preciso continuar a trabalhar, confiar em Deus e acreditar que as coisas vão melhorar.

- Chegou agora à equipa Rob Edwards, que conhece muito bem a idiossincrasia dos Wolves… O que espera ele de si e o que lhe disse diretamente nas conversas pessoais?

Bem, o mister aproximou-se de mim no primeiro dia em que cheguei, porque quando foi nomeado treinador eu estava com a seleção. Desde então tem sido uma pessoa muito transparente comigo, disse-me que sabe o grande jogador que sou. Ele conhece as minhas qualidades, tudo o que posso dar ao clube e o que esperam de mim.

Sabe que é um processo de que precisamos como clube, não só a nível individual, porque no fim somos uma equipa. Tem sido alguém que, à sua maneira, tem tentado transmitir-me confiança e segurança, porque talvez as coisas estejam bem, mas precisam de estar ainda melhores. A complexidade da situação, do momento, e o facto de o futebol exigir resultados e reações imediatas, ainda mais num lugar como a Premier League.

- Ladislav Krejci, seu colega nos Wolves, como o vê, acha que pode vir a ser capitão da Rep. Checa?

Sim, acho que sim, é um grande jogador, excelente defesa-central, também joga por vezes a médio, uma pessoa com muita qualidade. Surpreendeu muita gente no clube pela positiva, é alguém muito sólido. É um grande defesa. Para mim, particularmente, é mesmo muito, muito bom. É um dos grandes nomes do seu país. É alguém que quase sempre vai à seleção. Acho que é um excelente rapaz, humilde, trabalhador. Chegou ao Wolverhampton com essa ambição e vontade de contribuir e evoluir.

- Outro colega é o norueguês Jorgen Strand Larsen. Como o vê numa altura em que os avançados noruegueses, como Haaland ou Sorloth, se têm destacado tanto?

É um grande jogador. Foi um dos principais nomes do clube na época passada. É um excelente colega, alguém que também me recebeu muito bem aqui no clube. Tem estado atento a mim, ajudando-me, orientando-me nas coisas que considera importantes, já que está cá há mais tempo, e sabe que me podem ser úteis. É alguém com quem criei uma sinergia positiva. Cada vez nos entendemos melhor em campo, no que ele gosta, no que eu gosto.

Acredito que podemos fazer coisas boas e até incríveis juntos. Ele tem essa competitividade na seleção, com grandes avançados, mas também é um deles. Tem grandes hipóteses de estar no Mundial, de conquistar o seu espaço e ser também uma peça importante nesse ataque da Noruega.

- Já jogou contra o Crystal Palace, Aston Villa, Chelsea, Manchester City... dos que já viu e enfrentou, qual lhe pareceu o mais difícil?

O interessante é que todas as equipas são diferentes. Têm as suas próprias ideias e formas de alcançar os objetivos. Para mim, o Chelsea atravessa um excelente momento. Com alguns jogadores que, individual e coletivamente, estão num nível muito alto. É um clube que está numa fase positiva. Surpreendeu-me pela positiva. Defrontei-os com o Fluminense, defrontei-os com o Wolverhampton e, atualmente, considero que estão entre os melhores clubes do mundo pela forma como jogam, como estão compactos e ligados uns aos outros.

O Crystal Palace já todos conhecemos. Bem, os colombianos conhecem-no um pouco mais por causa do Daniel (Muñoz), do (Jefferson) Lerma, que acompanhámos mais de perto. É um clube que tem feito coisas importantes nos últimos anos. Tem-se mantido sólido e tem capacidade para lutar por objetivos importantes esta época.

Declarações de Jhon Arias
Declarações de Jhon AriasOpta by Stats Perform / Pablo PORCIUNCULA / AFP / Profimedia

Seleção da Colômbia

- Yerson Mosquera já está há algum tempo no clube, sofreu uma lesão grave, mas mesmo sem jogar o clube decidiu renovar com ele. Como tem sido a experiência ao lado dele e como vê o seu futuro?

O Yerson é um excelente rapaz, alguém que tem estado sempre atento a mim desde que cheguei, sempre disponível. Temos essa proximidade, primeiro pela nacionalidade e depois porque é uma grande pessoa. Antes de vir, ele já falava comigo, explicava-me um pouco sobre o clube e, quando o interesse se tornou oficial, foi das primeiras pessoas a ligar-me, explicou-me como era o clube, a dinâmica. Desde que cheguei, tem estado sempre presente, a ajudar-me, a mostrar-me, a ensinar-me. Já está há muitos anos aqui na cidade, no clube. Ele está muito mais familiarizado com tudo. Tem sido uma grande ajuda para mim. Apesar das lesões, é um grande talento. É um excelente defesa-central e o mais importante é que está disponível para a Colômbia, tanto no presente como no futuro.

- Quais são as suas expectativas depois de ter disputado a maioria dos jogos de qualificação e estando a poucos meses do início do Mundial-2026?

O meu foco agora é chegar o melhor preparado possível ao Mundial, esse é o sonho de qualquer jogador: disputar um Mundial, o torneio mais importante e um privilégio estar lá. Temos uma grande oportunidade pela frente para conseguir algo histórico para a Colômbia, para o nosso país e dar uma alegria ao povo que merece e precisa.

Vamos passo a passo, a seguir o processo, conscientes da complexidade da fase final e da esperança de nos entusiasmarmos com o Mundial, pela equipa que temos, pelo trabalho realizado, por tudo o que foi este processo muito positivo. Já estamos muito perto, mas ainda há aspetos a melhorar para chegarmos ainda melhor a essa fase final.

Jhon Arias, com a camisola da Colômbia
Jhon Arias, com a camisola da ColômbiaWinslow Townson / GETTY IMAGES NORTH AMERICA / Getty Images via AFP / Profimedia

- Algo que temos visto de si na seleção da Colômbia é que se tornou um verdadeiro todo-o-terreno. Já não vemos o Jhon Arias extremo pela direita ou esquerda, mas a ajudar na ausência do Luis Díaz, que vai para o meio. Tem jogado como médio interior com o Richard Ríos e o Lerma, à direita, à esquerda... Como tem sido nessa posição?

Estou disponível para ajudar onde for preciso, onde o professor Néstor (Lorenzo) considerar mais adequado para o grupo, porque no fim quem beneficia é a equipa. Para mim, é positivo porque me torna um jogador mais completo, capaz de atuar em várias posições, o que no futebol moderno é fundamental. Sinto-me confortável em todas elas e procuro evoluir, seja a jogar como interior, como extremo, à esquerda ou à direita, tento sempre dar o meu melhor. É uma vantagem mútua: são precisos jogadores assim e para mim é ótimo poder jogar dessa forma e continuar a crescer.

- Passou pelo Patriotas, pelo Santa Fe, pelo América. Algum destes três clubes lhe deixou mais gosto ou ligação?

Acho que tenho o mesmo carinho pelos três. Todos marcaram a minha história de forma positiva, bonita e especial. O Patriotas foi o primeiro clube profissional da primeira divisão que me abriu as portas, que confiou em mim, que acreditou em mim. É um clube com o qual mantive sempre um vínculo. Sempre estiveram atentos a mim. Por isso tenho esse carinho e gratidão por eles.

O América é um clube grande, dos maiores da Colômbia e da América do Sul. Foi o clube que me permitiu conquistar o meu primeiro título profissional, por isso guardo essa recordação e carinho de ter sido o primeiro clube a dar-me um título.

O Santa Fe foi o clube que me projetou para o exterior, provavelmente o que me permitiu ir para o Brasil, ter essa experiência e estar hoje onde estou. Tenho essa gratidão e carinho. Mais do que comprometer-me com algum deles, tenho um carinho diferente por cada um. Se surgir a oportunidade, estaria aberto a regressar a qualquer um deles. Aos três guardo uma recordação e um carinho especial.

Jhon, muito obrigado pelo teu tempo, obrigado por levares a bandeira da Colômbia ao mais alto nível.

Obrigado pela entrevista e pelo espaço. Um abraço e que Deus te abençoe.

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