Análise: Lautaro Martínez, a queda do Toro a sentir o peso do papel

Lautaro Martínez no Wanda Metropolitano
Lautaro Martínez no Wanda MetropolitanoJose Breton / NurPhoto / NurPhoto via AFP

Lautaro Martínez não é estranho a fases de altos e baixos. O seu percurso no Inter é feito de acelerações repentinas e travagens que parecem anunciar uma crise, mas que acabam por se dissipar com um golo decisivo quando a equipa mais precisa dele.

A quebra do capitão nerazzurro levanta dúvidas: será o novo sistema de Chivu, a pressão do Mundial-2026 ou dinâmicas internas a influenciar o seu rendimento?

Desta vez, porém, a perceção em seu torno é diferente: o Toro parece sentir mais o peso, reage com menos clareza e sente com maior intensidade situações que antes faziam parte do seu caminho.

Surge então a questão: porquê agora? O que está na origem deste abrandamento, não desastroso mas evidente, que suscitou dúvidas e análises até dentro do clube?

Chivu não é Inzaghi, Esposito e Bonny não são Taremi nem Arnautovic

Grande parte da discussão gira em torno da nova abordagem tática de Chivu. Lautaro sempre demonstrou uma qualidade rara: adaptar-se a diferentes sistemas sem perder protagonismo. Mas o futebol do treinador romeno é distinto do de Inzaghi.

Já não é o centro intocável do ataque, já não tem a garantia dos 90 minutos para entrar no ritmo, e precisa de se movimentar mais sem bola, sair da área, ligar com os colegas, abrir espaços e criar linhas de passe. O ataque tornou-se mais “democrático”, com rotações constantes e tarefas partilhadas. Uma mudança que pesa, sobretudo para quem estava habituado a uma centralidade absoluta e a responsabilidades ofensivas mais diretas.

O capitão também é afetado pela renovação no setor ofensivo. Correa, Arnautovic e Taremi já não estão, jogadores que muitas vezes pouco contribuíam. Este ano, o Inter conta com Bonny e Esposito, dois jovens ambiciosos que merecem oportunidades pelo que oferecem em campo. Assim, surgem as substituições, decisões técnicas que, embora corretas, têm um impacto diferente para quem estava habituado a ser a imagem da equipa.

As estatísticas de Lautaro na Serie A 2025/26
As estatísticas de Lautaro na Serie A 2025/26Opta by Statsperform / Marco Luzzani / GETTY IMAGES EUROPE / Getty Images via AFP

Pressão do Mundial? Dinâmicas internas?

Há ainda o fator mental. O Mundial-2026, mesmo distante, está sempre presente na mente de um titular da Albiceleste. Depois de liderar a equipa nas qualificações, Lautaro sente a obrigação de chegar à próxima competição como verdadeiro líder. Quando a pressão surge antes mesmo do primeiro estágio, qualquer quebra ganha contornos mais pesados. O receio de chegar esgotado, fora de forma ou em dúvida para o onze inicial é uma sombra que inevitavelmente afeta o instinto, a naturalidade nas jogadas e a tranquilidade mental.

Também não faltam dinâmicas internas. Não há ruturas declaradas nem tensões abertas, mas no verão, com a polémica à distância com Çalhanoğlu e algum descontentamento pouco disfarçado no estágio, Lautaro percebeu o que significa ser capitão também fora das quatro linhas. A liderança já não é só carisma e golos: exige mediação, responsabilidade, gestão das relações com colegas e equipa técnica. Um papel que pesa e influencia o comportamento em campo, sobretudo quando os resultados não ajudam a aliviar a pressão.

O episódio recente das duas substituições em quatro dias evidenciou outro aspeto: pela primeira vez em cinco anos, Lautaro percebe que a equipa pode terminar um jogo sem ele. Não se trata de castigo, mas de uma decisão técnico-tática. Chivu é direto, exige frescura física e mental, e não olha a nomes. É uma revolução que mexe profundamente até com o capitão, habituado a ser o rosto e o ritmo do Inter.

O rendimento ofensivo ressente-se. Lautaro não é um avançado de frieza cirúrgica: é ímpeto, intensidade, repetição. Quando a mente está livre, o golo surge quase naturalmente. Quando sente demasiado peso, bloqueia-se nos momentos decisivos. Os últimos erros à frente da baliza, pequenos mas pouco habituais, mostram um jogador que hoje pensa mais do que age por instinto, e isso limita a sua eficácia natural.

A quebra sazonal: o Toro já conhece estas pausas

Não é de todo a primeira vez que Lautaro atravessa períodos de quebra. Na época 2024/2025, por exemplo, marcou apenas um golo na fase de grupos da Liga dos Campeões, frente ao Estrela Vermelha (1 de outubro), antes de passar por um jejum de sete jornadas na Serie A entre 3 de novembro e 28 de dezembro. Para voltar a marcar na Europa, teve de esperar até 22 de janeiro.

Este ano, a situação é semelhante: entre a 6.ª e a 11.ª jornada do campeonato, o capitão não encontrou o caminho do golo, com o último tento a 9 de novembro frente à Lazio. No total, apontou quatro golos na Liga dos Campeões e outros quatro nas primeiras doze jornadas da Serie A, números comparáveis aos do ano passado, quando nesta mesma data tinha cinco golos no campeonato e um na Europa.

A comparação a 29 de novembro
A comparação a 29 de novembroOpta by Statsperform

Em suma, nada de extraordinariamente preocupante: é a habitual quebra sazonal que sempre antecedeu as suas explosões ofensivas.

A diferença, desta vez, está no contexto: novo treinador, novo sistema, responsabilidades partilhadas e pressão internacional tornam esta fase mais visível e debatida. A verdade mantém-se simples, o Inter sem Lautaro não é igual. Lautaro sem um Inter que gira à sua volta perde algo.

Mas uma coisa é certa: esta história não termina com duas substituições ou algumas expressões de desagrado. É apenas um momento, destinado a evoluir, como sempre aconteceu na carreira do Toro.