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Exclusivo com Magrão: "Gosto de ser lembrado por ter sofrido o golo 1000 do Romário"

Magrão tem o seu nome cravado na história do Sport
Magrão tem o seu nome cravado na história do SportMarcello Zambrana / AGIF / AGIF via AFP
Magrão demorou, mas conseguiu cravar o seu nome na história do Sport como um dos maiores guarda-redes que defenderam o Leão. Foram 14 anos no Rubro-Negro do Recife, com títulos significativos, como o da Taça do Brasil, resultado que fez o clube participar na Libertadores, marco que contribuiu para ele entrar no hall de maiores jogadores do clube pernambucano.

Em entrevista exclusiva ao Flashscore, Magrão lembra o início no Sport, quando assinou um contrato de apena sete meses, sem imaginar no período de mais de uma década que ficaria no clube. Afastado dos relvados desde 2019, ele aproveita a boa vida no Velho Continente, sabendo usufruir da renda que guardou e dos investimentos que fez para acompanhar, de longe, o regresso do Leão à elite do futebol brasileiro depois de três anos. 

Ele também fala sobre ter sofrido o golo 1000 de Romário, da tentativa de entrar na vida política e como a seleção brasileira poderia ter feito parte da sua vida se tivesse tido o mesmo desempenho, mas por um clube do Sul ou Sudeste, com a questão regional a interferir para  ficar de fora da convocatória. 

- Conseguiu acompanhar a campanha que fez o Sport regressar à elite do futebol brasileiro?

- Não muito, estou na Europa com algumas horas à frente. Quando os jogos eram mais cedo, consegui ver alguns. Contra o Santos, jogo que confirmou o acesso, vi algumas lances e fiquei muito feliz com o regresso ao Brasileirão. 

- Onde você mora atualmente?

- Estou há cinco anos em Itália. Neste momento, estou a passear com a família pela Escócia e Inglaterra. Eu preparei-me durante seis anos para fazer esta mudança na minha vida. A Itália era um destino frequente das férias e sempre tive a vontade de morar neste país. A adaptação foi boa e hoje estou afastado do futebol. Vivo do que conquistei, da minha renda guardada e de investimentos feitos. 

- Você jogou em vários clubes antes de chegar ao Sport, certo?

- Sim, foi somente no Sport que me afirmei e tive continuidade. Fiquei 14 anos por lá, criei uma grande identificação e pude retribuir todo o carinho e gratidão recebidos. Foi onde encontrei a melhor fase da minha carreira. 

- O que teve de diferente no Sport?

- Ali eu fiquei bom de bola (risos). Cada jogador tem um tempo e local de amadurecimento, ali foi o meu. Guarda-redes, normalmente, fica mais maduro a partir dos 27 anos, é difícil você afirmar-se num clube com pouca idade. Cheguei um pouco mais velho no Sport e foi um casamento perfeito. Os adeptos eram exigentes, as coisas aconteceram naturalmente, apesar de ter muita pressão. Conquistar títulos foi fundamental para ficar tanto tempo por lá. 

- Momentos turbulentos foram inevitáveis, imagino...

- Com certeza, no futebol não há como passar somente por boas fases. Como em qualquer clube, o Sport teve altos e baixos, passei por elogios e críticas. O início foi difícil, não era conhecido e tive dificuldade para me afirmar. Convivi com críticas dos adeptos e da imprensa, isso só me fez crescer. Com os anos, consegui afirmar-me como titular, dei conta do recado e participei de um bom período de títulos e vitórias. Passei por alguns momentos delicados, mas segui sempre em frente. 

Os altos e baixos fizeram eu conviver com muitos treinadores, foram várias trocas por lá. Quando se muda, é porque não está dando certo, mas a paciência foi pouca, como acontece normalmente no futebol brasileiro. Somos muito imediatistas, não se tem tempo para trabalhar e fazer surtir algum efeito. Quando o resultado não aparece, sobra para o técnico e vi isso muito de perto, várias vezes, no Sport. 

- Os títulos foram fundamentais para você colocar o seu nome na história do clube?

- Certamente, o que marca são as taças levantadas. Você pode ser bom, mas só fica na história de um clube com títulos, isso coloca-o num outro patamar. Foram 10 títulos em 14 anos de Sport. 

- Teve algum ponto marcante na sua passagem pelo Sport?

- Foi em 2007, no Brasileirão. Eu tinha chegado em 2005 e oscilei entre titular e suplente até 2006. Foi somente com o Geninho que me afirmei, ali as dúvidas acabaram e o meu papel começou a ser outro. 

- Você imaginava ficar tanto tempo no Sport depois de assinar um contrato de apenas sete meses?

- De forma alguma. Cheguei em abril, com vínculo até o final do ano. Vinha de passagem por vários clubes e procurava consolidar-me, pensando também no bem-estar da família. As coisas aconteceram e fui feliz por ter ficado tanto tempo no Leão.

- Você sofreu o golo 1000 de Romário. Quais as lembranças que têm daquele dia?

- Gosto de ser lembrado por isso, não me incomodo. Claro que não queria sofrer aquele golo, mas não houve demérito nenhum. Foi um momento marcante pra ele e pra mim.

Eu já imaginava que poderia sofrer o golo 1000 dele nas jornadas anteriores. Acompanhava os jogos e nada dele marcar, com o jogo contra o Sport a aproximar-se. Eu sabia que ia sobrar para mim (risos). O Vasco estava a jogar no Maracanã e decidiram mudar o jogo contra o Sport para São Januário. Ali eu vi que não ia ter escapatória.

Na véspera do jogo, liguei para o meu pai como sempre fazia e ele alertou-me que tinha boas chances de um penálti ser marcado para o Vasco. Eu sabia dessa chance real. O meu pai alertou-me que o Romário batia sempre no canto direito do guarda-redes, eu falei que era no esquerdo. Resolvei ir na sugestão dele na hora da cobrança e dei-me mal. 

- Você ficou conhecido pela sua capacidade de defender grandes penalidades. Qual o segredo?

- Em boa parte da minha carreira, não existia ainda a função do analista de desempenho. Quando eu comecei a ter contato com este profissional, recebi grande ajuda.

Até então, o treinador dava algumas dicas, mas eu buscava sempre observar a posição do cbatedor, como ele batia as faltas e cantos, além de tirar proveito da minha intuição no momento. Depois de 2007, consegui uma sequência de mais de 30 penáltis defendidos. Se não fosse pelo meu pai, este número seria maior (risos). 

- A perda de tempo que muitos guarda-redes do futebol brasileiro fazem incomoda-o?

- Demais! Acho muito feio, na minha época já tinha isso, mas hoje está demais. Apanhei um treinador no Ceará que me pedia para fazer isso e eu fui contra. Hoje estão a exagerar para ganhar tempo. 

- O Magrão chegaria à seleção se tivesse tido aquela boa fase do Sport mas numa equipa do Sul ou Sudeste?

- Não tenho dúvidas. Jogadores de clubes do Sul e Sudeste fazem quatro bons jogos e já são chamados. Jogadores do Nordeste, até hoje, precisam fazer uma temporada perfeita para serem lembrados. 

- Você tentou entrar na política mas não deu muito certo. O que aconteceu?

- Vi muitas coisas desagradáveis. Estava propenso a entrar para aquele mundo. Tive um segundo convite, mas preferi seguir no futebol. Não demorei a perceber que aquilo não era pra mim. Eu mal havia chegado e já me diziam para dar metade dos cargos disponíveis para pessoas que nem eram capacitadas, não quis fazer parte daquele tipo de jogo antes mesmo de entrar na política. 

É algo que também acontece no futebol e desanimou-se a ser dirigente ou assumir outro cargo. Quando você é jogador, você engole as coisas. Mas, como dirigente, eu não aceitaria participar destas artimanhas de bastidores. 

- Existe um meme com o seu nome que até hoje é lembrado, de um adepto a provocar o guarda-redes Saulo, suplente do Sport, chamando-o de suplente de Magrão. Lembra-se disso?

- Claro, não tem como esquecer. Foi num jogo contra o Petrolina. O adepto era muito chato, provocava egozava com todos, mas tenho de admitir que ele também foi muito criativo. Era aquele adepto raiz. Não guardo mágoa disso, eu acho é graça até hoje.