Uma delegação desportiva fez uma "viagem de recordação" a Auschwitz antes dos Jogos Olímpicos

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Uma delegação desportiva fez uma "viagem de recordação" a Auschwitz antes dos Jogos Olímpicos

Richard Dacoury em frente ao memorial de Auschwitz-Birkenau, no domingo.
Richard Dacoury em frente ao memorial de Auschwitz-Birkenau, no domingo.BARTOSZ SIEDLIK/AFP
O desporto também tem "um papel a desempenhar" na luta contra o antissemitismo e o racismo, em especial "entre as gerações mais jovens": foi esta a mensagem da visita sem precedentes de uma delegação desportiva francesa ao campo de extermínio de Auschwitz-Birkenau, no domingo, antes dos Jogos Olímpicos.

"Vamos passar seis horas no campo, o que é mais do que a maioria das pessoas que foram deportadas para lá": com esta recordação brutal de que 80% das pessoas que chegavam eram enviadas diretamente para as câmaras de gás, o guia deu o mote no autocarro que levou os cerca de vinte desportistas e dirigentes de federações (boxe e basquetebol) ao maior campo de extermínio construído pelos nazis no sul da Polónia.

Estavam presentes alguns antigos campeões: Richard Dacoury (basquetebol), Camille Lacourt (natação), Fabrice Santoro (ténis), Michaël Jeremiasz (ténis em cadeira de rodas) e Jean-Marc Mormeck (boxe).

A delegação visitou o que restava do campo de Birkenau (em grande parte destruído pelas SS), desde a rampa de chegada até às ruínas dos crematórios. Depois de uma cerimónia comemorativa, o grupo passou a tarde no campo de Auschwitz I, com as suas casernas de tijolo e vitrinas cheias de sapatos, malas e cabelos.

"A lógica da transmissão"

Os rostos são sérios, as perguntas precisas: "E as crianças?" "É tudo original ou foi restaurado? "Poderão praticar a sua religião, mesmo em segredo?"

Esta "viagem da memória dos campeões", inédita neste ano olímpico, pretende fazer "parte de uma lógica de transmissão", explica Yonathan Arfi, presidente do Crif, sublinhando a importância dos valores desportivos "na luta contra o antissemitismo e todos os ódios".

"Temos um verdadeiro papel a desempenhar", concorda Jean-Marc Mormeck. O objetivo é "sensibilizar e interpelar os jovens que, por vezes, são impermeáveis a um certo número de questões", segundo Michaël Jeremiasz, que, após o sangrento atentado do Hamas em Israel, a 7 de outubro, lamentou "o silêncio dos desportistas", que, na sua opinião, "não estão à altura da situação".

A viagem estava inicialmente prevista para o final de novembro, mas foi adiada após o atentado, seguido da retaliação do exército israelita contra o Hamas. Pierre Fraidenraich, presidente do comité desportivo do Crif, lamenta que alguns participantes tenham entretanto desistido. "Para alguns, estava ligado à sua imagem: não queriam ser associados, como se esta viagem fosse um ato pró-israelita."

No entanto, a iniciativa pretende ser "humanista e educativa", certamente "não política", explica Richard Dacoury, patrocinador da viagem, que está alarmado por ver a sociedade "a deslizar para cada vez mais violência, racismo e antissemitismo".

"Liquidados"

Para este público de "campeões", o historiador Olivier Lalieu, do Mémorial de la Shoah (organizador das viagens a Auschwitz), recorda que em Auschwitz também houve uma história desportiva, com jogos de futebol e um ringue de boxe. " Para os nazis, a organização de jogos fazia parte da perversidade do sistema e, para eles, era uma forma de lazer", afirma.

Vários desportistas famosos foram deportados para cá por serem judeus, apesar de serem adorados nos seus países: o pugilista Young Perez, campeão do mundo em 1931, o nadador Alfred Nakache, várias vezes campeão francês...

"O facto de serem desportistas não significa que sejam favorecidos aqui. Talvez recebam um pouco mais de atenção, uma ração extra de sopa. A partir do momento em que este valor recreativo deixa de existir, os desportistas são também liquidados", explica Olivier Lalieu.

O jovem Perez, por exemplo, morreu durante as marchas da morte organizadas pelas SS para escapar ao campo. O alemão Julius Hirsch, uma grande estrela do futebol do seu país antes da guerra, também foi morto nos campos. Alfred Nakache sobreviveu. O nadador voltou a treinar e chegou mesmo a participar nos Jogos Olímpicos de 1948, em Londres. Morreu em 1983, com 67 anos.