Tão icónica como a conquista de hoje em Paris-2024 foi a celebração do jovem belga, que desmontou da bicicleta ao cortar a meta, colocou-a estrategicamente à sua frente e ergueu os braços com a Torre Eiffel como pano de fundo, numa imagem pensada que ficará para história do ciclismo.
Aos 24 anos, e apenas 13 dias depois de ter subido ao pódio final da Volta a França como terceiro classificado, Evenepoel fecha o palmarés quanto aos títulos mais importantes por seleções: campeão mundial de fundo em 2022, o ainda vigente campeão mundial de contrarrelógio junta o título olímpico de hoje ao conquistado há uma semana no contrarrelógio.
O vencedor da Vuelta2022, que furou a pouco mais de três quilómetros da meta, estragou a festa francesa, com a nação organizadora destes Jogos a ficar com as outras duas medalhas: Valentin Madouas foi segundo, a 01.11 minutos, e Christophe Laporte terceiro, a cinco segundos do seu compatriota.
O melhor entre os portugueses foi Nelson Oliveira, o primeiro ‘diplomado’ da Missão nacional em Paris2024 – foi sétimo no ‘crono’ -, ao chegar na 33.ª posição, a 03.42 minutos de Evenepoel, que cumpriu os 273 quilómetros, com partida e chegada no Trocadéro, em 06:19.34 horas.
Rui Costa furou na primeira subida a Montmartre e acabou no 46.º lugar, a 07.23 minutos do vencedor.

Com um percurso demasiado longo mas sem grandes dificuldades para percorrer na região de Paris, os 90 ciclistas saíram de Trocadéro, depois de Peter Sagan dar a partida, perante umas bancadas ‘despidas’, com a primeira fuga a formar-se logo nas pedaladas iniciais, com os ‘anónimos’ Thanakhan Chaiyasombat (Tailândia), Achraf Ed Doghmy (Marrocos), Christopher Rougier-Lagane (Maurícias), Charles Kagimu (Uganda) e Eric Manizabayo (Ruanda).
Os cinco conseguiram uma vantagem que chegou a ser superior a 15 minutos, controlada à distância e sem preocupações pelas principais nações do pelotão, de onde saíram, depois, o irlandês Ryan Mullen, o italiano Elia Viviani, o russo Gleb Syritsa, a competir sob bandeira neutra, e o grego Georgios Bouglas.
Quando estavam decorridos 100 quilómetros, finalmente Bélgica, Países Baixos e Dinamarca assumiram a perseguição, com a diferença a cair drasticamente pouco antes de Viviani, Mullen e Bouglas alcançarem os homens da frente e selecionarem o grupo.
A 90 quilómetros da meta, a marcação entre as seleções começou, tornando-se mais ‘tensa’ à medida que lá à frente Mullen se isolava, com o seu compatriota Ben Healy e o cazaque Alexey Lutsenko a apanhá-lo menos de duas dezenas de quilómetros depois, para depois o deixarem.
Tiesj Benoot, o mais incansável trabalhador da Bélgica, acelerou para selecionar o pelotão no Côte de Bièvres, mas seriam os sucessivos ataques a criar um outro grupo, formado nomeadamente por Valentin Madouas, Nils Politt, Stefan Küng ou Fred Wright, que rapidamente ganhou um minuto para o pelotão.
Na primeira (estreita) subida a Montmartre, repleta de público – as imagens do Sacré-Coeur foram verdadeiramente impressionantes -, atacou Mathieu van der Poel, levando na sua roda o seu eterno ‘inimigo’ Wout van Aert, mas os dois não iriam longe, o que foi aproveitado por Evenepoel para atacar e colar-se no grupo de perseguidores, que seguia com 27 segundos de diferença para o então líder Ben Healy.
Quando o estelar belga atacou, a mais de 30 quilómetros da meta, Madouas foi o único a conseguir manter-se na roda, para delírio do pouquíssimo público que assista à prova nas bancadas de Trocadéro.
Inevitavelmente, Evenepoel descartou o francês a 15 quilómetros da meta, numa daquelas suas acelerações a que ninguém consegue responder, mas, quando seguia isolado para o ouro, furou.
Desesperado pela demora da sua seleção em trocar a bicicleta, foi batendo as mãos para acelerar o processo, contudo o susto não passou disso mesmo, pois a vantagem que trazia seria suficiente para seguir até à meta.
Foi a um quilómetro da meta que começou a festejar, foi já depois do risco que pediu o aplauso público, que irrompeu em alegria quando Madouas concretizou a prata e teve nova alegria quando Laporte bateu ao sprint o húngaro Atilla Valter na luta pelo terceiro lugar – o francês não percebeu de imediato que tinha conquistado o bronze.
“Que lugar para ganhar (apontando para a Torre Eiffel). Honestamente, sinto-me de rastos, pelo esforço, foi um dia muito duro. Estou tão orgulhoso por ganhar e por ser o primeiro de sempre a conseguir a dobradinha. É história, não é?”, declarou o extraordinário Evenepoel no final.