Na zona norte do país, apareceu Vitinha, filho de Vítor Manuel, um médio que fez quase 200 jogos na Liga Portugal, a maioria pelo clube da região, o Desportivo das Aves. Uma carreira que cedo se percebeu que não teria paralelo com o patamar que Vitinha poderia vir a atingir como jogador profissional.
O talento precoce foi detetado pelo FC Porto, que começou a construir aquela que seria, muito provavelmente, a melhor geração de jovens da história do clube. Com apenas 11 anos, Vitinha, que na altura até era adepto do Benfica, já vestia de azul e branco, juntamente com jogadores como João Mário e Fábio Vieira. O início de uma era que viria a terminar em ponto de rebuçado.
Numa equipa recheada de talentos (Diogo Costa, por exemplo), as capacidades de Vitinha não tardaram a sobressair, o que desde logo serviu como um claro atestado da qualidade do médio. Numa geração tão apetrechada, era difícil não ficar desde logo encantando com as qualidades deste jovem. Difícil, mas não impossível.

Apesar de ter ajudado o clube a vencer a Youth League e o título nacional de juniores, a captação de talentos do FC Porto não terá reparado naquilo que parecia estar à vista de todos. Felizmente para os dragões, o Wolverhampton também não estava atento.
Apesar de se ter destacado naquela equipa de sub-19 e dos vários elogios feitos por Rui Barros, então técnico da equipa B, Vitinha não teve tanto espaço como seria de esperar na equipa principal do FC Porto. É certo que foi promovido por Sérgio Conceição, mas depois de 12 jogos e da renovação rumou a Inglaterra de forma surpreendente, até porque a cláusula era tão baixa (20 milhões de euros) que rapidamente fez com que os adeptos azuis e brancos considerassem a decisão como "gestão danosa".

Wolves poupou 20 milhões de euros e o FC Porto ficou a ganhar
Conhecedor das capacidades de Vitinha, Nuno Espírito Santo acreditou que as capacidades técnicas do jogador, aliadas à sua inteligência, iriam ser suficientes para ultrapassar a exigência da Premier League, apesar da pouca experiência do médio até então.
A verdade é que Vitinha raramente conseguiu sobressair no futebol inglês. Ao lado de médios como João Moutinho e Rúben Neves, só foi titular cinco vezes para o campeonato. O que para o jogador foram más notícias, para os adeptos do FC Porto foi uma festa. Contra todas as expectativas de quem conhecia e não duvidava do talento do seu talento, Vitinha voltou à Invicta.
Se o estatuto de suplente em Inglaterra acabou por surpreender, o facto de Vitinha ter começado a época como suplente de Bruno Costa indignou ainda mais os portistas. Seria o jovem médio apenas um produto das redes sociais? Um jovem sobrevalorizado pelo que fez na formação? Iria perder-se mais um talento na transição para sénior?
A época 2021/22 vai ficar marcada para sempre na carreira de Vitinha. Afinal, foi aí que se afirmou finalmente no seu clube de formação, mas a verdade é que, ao fim de quatro meses, o médio só foi titular quatro vezes. Em dezembro, Sérgio Conceição dá a Vitinha a primeira sequência de titularidades - Portimonense, Atlético Madrid, SC Braga, Vizela e Benfica (duas vezes) - e, no início de janeiro, a Liga anuncia os prémios de melhor médio e melhor jogador do mês - Vitinha levou os dois.
A influência do jogador foi tal que, no final da época, com o FC Porto a conquistar a dobradinha, ficou conhecida por ser "a melhor da era de Sérgio Conceição". Vitinha, eleito Jovem Jogador do Ano na Liga Portugal, foi, de forma unânime, o grande culpado.

41,5 milhões de euros com sabor a pouco
A sina dos clubes portugueses é um pouco esta: formar para vender. O talento lançado por Portugal nos últimos anos tem servido pouco tempo às equipas nacionais, mas vem funcionando como uma forma de equilibrar as contas. Numa altura em que as do FC Porto estavam tão desequilibradas (mais do que se sabia), os 41,5 milhões de euros que o PSG pagou para contratar Vitinha foram obrigatórios, mas souberam a muito pouco.
Depois de uma época de estrelato, que fez com que fosse lançado por Fernando Santos na seleção nacional, Vitinha assinou por um PSG que contava ainda com o trio Messi-Neymar-Mbappé, mas cuja instabilidade e pouca competitividade da liga davam a sensação de desperdício.

Apesar de ter sido quase sempre titular, Vitinha não convenceu logo os adeptos do Paris SG, mas na época seguinte, já com o trio desfeito e com a chegada de Luis Enrique, não havia dúvidas quanto ao talento do jogador português. O próprio espanhol ficou rendido: "Para mim, Vitinha é o jogador da temporada".
A seguir a Mbappé, Vitinha foi o mais utilizado na primeira época do antigo selecionador espanhol na capital francesa e Luis Enrique viu no internacional português o centro do projeto 2024/25, entregando a batuta do PSG ao pequeno maestro.

Estatuto de estrela para confirmar na seleção
Apesar da importância dada pelo treinador espanhol, Vitinha continuava a ser visto como uma espécie de génio silencioso. O próprio Roberto Martínez, entretanto contratado como selecionador português, tardou em perceber o talento que tinha em mãos. Com um grupo acessível e espaço para testes, o jogador do PSG foi titular apenas uma vez na qualificação para o Euro-2024. Preterido pela capacidade física e defensiva de João Palhinha, Vitinha voltou a ser desprezado pelo mesmo motivo do diminutivo.
No entanto, numa espécie de exercício de consciência e inevitabilidade, tendo em conta a época do internacional português, Roberto Martínez deu-lhe um lugar no onze nos particulares antes da prova realizada na Alemanha e foi aí que Vitinha passou a ter estatuto de titular. Um dos melhores do mundo numa das melhores seleções do mundo. Finalmente fazia sentido.

Mas nem isso foi suficiente para que Martínez deixasse de olhar para outros estatutos. Se é verdade que Vitinha foi titular em quatro dos cinco jogos do Europeu, também é factual que foi substituído em cada uma dessas partidas, ainda que tenha sido, de forma quase unânime, o melhor jogador português a passar pela Alemanha.
Se as épocas anteriores serviram para convencer Luis Enrique e Roberto Martínez (não por completo), a temporada 2024/25 está a ser a época em que o mundo acorda para o talento de Vitinha, "o melhor médio da Europa", segundo o selecionador nacional.
Aos 25 anos, líder do PSG na Ligue 1 e na Liga dos Campeões, com exibições espetaculares em palcos como Anfield, e capaz de conduzir Portugal de volta aos títulos, caso assim lhe seja permitido, Vitinha atingiu finalmente o lugar que lhe era atribuído: o topo do mundo do futebol. Agora, se 41,5 milhões de euros parecem uma pechincha, o que dizer dos 20?