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"Sinto-me em casa"
- Miguel, antes de mais perguntar como é que está a correr esta temporada? Que balanço é que faz desta época?
- Nesta época, tenho sido quase sempre titular e tenho um balanço positivo. Já marquei quatro golos e fiz uma assistência. A equipa também tem se saído bem. Continuamos na luta, jogo a jogo.
- O que é que o tem feito permanecer em Viana do Castelo?
- É um clube onde me sinto muito bem acolhido. Desde os adeptos até às pessoas que trabalham na estrutura, e até mesmo o pessoal de fora do clube. Já conheço algumas pessoas que se familiarizaram comigo. Tenho-me sentido muito bem aqui. Até a minha filha já estuda aqui e já tem as suas amigas. Gosto de estar aqui, sinto-me em casa. E, acima de tudo, acredito que estou aqui também para ajudar o clube a alcançar os patamares que merece.
- Como é que tem sido viver em Viana do Castelo?
- É uma cidade muito completa. Tem tudo o que possamos imaginar. É uma cidade onde, quem quer viver com a família, pode vir sem problema. É bem acolhedora e não falta nada. Além disso, o ambiente aqui é excelente. As pessoas são muito unidas.
- Chegaste em 2023, vocês sobrem à Liga 3. Na época passada as coisas não correram tão bem e desceram de divisão. Agora, no Campeonato de Portugal, continuam na luta. Como tem sido viver esta montanha-russa de altos e baixos?
- Cheguei cá em 2022/2023 e conseguimos a subida. Inclusive, jogámos a final no Jamor. Foi um ano em que a cidade e o clube se uniram. Já há muito tempo que não se via essa união entre o clube e a cidade. No ano passado, as coisas não correram tão bem na Liga 3, mas, de certa forma, serviu como exemplo para crescermos, tanto como homens como jogadores. Este ano é um novo começo. Estamos na luta e procuramos voltar a pôr o clube no topo. O importante é nunca baixar os braços.
- Como foi o regresso ao trabalho depois da descida de divisão? Nunca é fácil descer e dar a cara perante os adeptos...
- O regresso foi um pouco complicado, pois vínhamos de um ano menos bom. Foi um ano difícil, em que trabalhámos muito, mas não conseguimos alcançar o objetivo da manutenção. Este ano, no entanto, renovaram-se as energias, com uma atitude mais positiva. Acreditamos que, fazendo jogo a jogo, e sempre confiando no processo, só assim conseguiremos algo positivo.
- Descreva o ambiente que se vive no Vianense na presente temporada?
- Somos um grupo muito unido, composto maioritariamente por jovens, mas também temos pessoal entre os 27 e 28 anos. São todos pessoas humildes e trabalhadoras. E, acima de tudo, acredito que é assim que se alcançam as coisas: trabalhando e acreditando sempre na ideia do treinador. O mister Pedro Lomba é um treinador que nos dá muita liberdade. É um bom conselheiro e, acima de tudo, um amigo. Acho que é assim que faz sentido trabalharmos todos unidos. Sempre que temos algo a dizer, falamos, para corrigirmos e melhorarmos. Porque, se nós ganharmos, ele também ganha. O sucesso dele depende sempre de um pouco de cada um de nós.

- E que análise faz do Campeonato de Portugal?
- Eu não diria que é um campeonato tão tático, mas sim mais baseado na vontade. Para chegar à Liga 3, depois à 2ª Liga, já se exige um nível maior de tática, com mais posicionamento e essas questões. No Campeonato de Portugal, a competição é muito mais na base da entrega e da luta. Por exemplo, na nossa série A, qualquer equipa pode ganhar a qualquer outra. É muito equilibrado. Se olharmos para a tabela, vemos tudo muito perto. É uma série em que se luta até à última jornada. Só na última jornada é que se poderão fazer as contas sobre quem sobe, quem desce e quem se mantém. É realmente muito competitivo.
- O que é que os vossos adeptos podem esperar de vocês?
- O que posso dizer aos adeptos é que nós prometemos sempre muito trabalho e honrar o símbolo que carregamos ao peito. Pensamos jogo a jogo, sempre em busca dos três pontos, pois essa é a única coisa que podemos prometer. Podemos prometer o que está nas nossas mãos. O que não está sob o nosso controlo, não podemos mudar. Portanto, é isso que prometo: trabalho duro, para conquistar os três pontos, jogo a jogo. Acho que estamos todos a caminhar no caminho certo e, se Deus quiser, no fim vamos poder sorrir e festejar tudo o que conquistarmos.
- Como um dos jogadores há mais tempo no clube, qual a mensagem que tem passado aos seus companheiros?
- O que eu costumo dizer é que este clube é o mais antigo de Portugal. Acho que todos os que vêm para cá devem dar o máximo de si, não só para ajudar o clube, mas também como atletas profissionais que são. Devem procurar, com todo o respeito, honrar o clube. Se ambicionam outros patamares, têm de dar tudo quando chegam aqui, pois é um clube com muita visibilidade. E mesmo nós, que somos dos mais antigos, sempre digo que ninguém aqui baixa os braços. Quando vemos alguém a baixar os braços, puxamos essa pessoa para cima, para que sigamos sempre o rumo certo. Este é um clube onde damos sempre 100%, ou até 200%, para continuar a seguir o bom caminho.

O papel de treinador: "Tento ser amigo dos meus jogadores"
- O Miguel tem acumulado o papel de jogador com o de treinador nas camadas jovens do Vianense. Como é que surgiu essa possibilidade?
- Antes de ir para o Chipre, estava a tirar o curso de nível 1. Quando voltei, surgiu o convite do Vianense, que era um projeto de subida, e tentei perceber se dava para fazer o estágio do curso na formação. Na altura, até perguntei: 'Será que posso fazer o estágio no Vianense?' Eles aceitaram e incluíram-me no escalão sub-17. Como treinador adjunto, fui campeão nesse escalão. Subimos à segunda nacional e, no ano seguinte, continuei com a mesma equipa técnica, mas tivemos que optar pela equipa sub-16 devido à falta de horários. Nessa altura, já não era estágio, era uma função de trabalho. Assumi os sub-16, e fomos novamente à fase de campeão para subir de divisão, mas não conseguimos porque, nesse ano, os sub-17, que estavam na nacional, acabaram por descer e nós não podíamos subir. Este ano, com o curso já completo, fui convidado para assumir a equipa sub-19. É um projeto interessante, com miúdos, quase todos de primeiro ano, tendo 3 ou 4 jogadores sub-17 e um sub-16. O trabalho que estou a desenvolver tem sido muito bom, dado a idade dos miúdos. Estamos a tentar entrar na luta para ver se conseguimos subir, mas para mim, o objetivo principal é que se tornem grandes homens e saiam daqui com as aprendizagens certas. Claro que, ao mesmo tempo, nunca viro a cara ao lado competitivo. Fiz-lhes acreditar nisso e eles caminham todos comigo. O segredo está na união e no trabalho. E os miúdos têm uma união incrível, o trabalho tem sido fantástico, e o apoio dos pais também tem sido excecional. Eles entendem que, se o filho joga ou não, as decisões são do treinador, mas estão felizes, todos estão felizes. Isso é o mais importante para mim, e acredito que, no fim, podemos fazer algo muito bom.
- Tem sido fácil conciliar? Como é o seu dia-a-dia?
- O meu dia-a-dia é bem preenchido. Normalmente, dou treinos à segunda, quarta e quinta-feira. À segunda e quarta, costumo terminar o treino dos miúdos por volta das 22:00, começando por volta das 20:30. Nos seniores, treino todos os dias de manhã, o que me permite descansar um pouco à tarde. Depois, tenho o jogo dos miúdos ao sábado à tarde e, ao domingo, costumo ter o jogo dos seniores, o que ocupa o dia inteiro. Portanto, posso dizer que praticamente vivo no Vianense. É mais ou menos isso.

- Acredito que alguns jovens dos juniores acabam por treinar com os seniores. Nesses momentos, continuam a tratá-lo por mister?
- Muitos deles chamam-me mister, é normal. É um hábito, estão lá em baixo, têm respeito. Na equipa sénior, sou até um dos mais velhos, então até os miúdos que estão comigo às vezes chamam-me cota e fazem aquelas brincadeiras. Mas com os miúdos mais novos, é sempre 'mister, como é que faço isto' e por aí. Eu respondo tranquilo, mas digo-lhes que aqui não precisam de me chamar treinador. No entanto, pelo respeito que têm, acabam sempre por me chamar mister.
- Que tipo de treinador é que o Miguel procura ser?
- Sou treinador, mas além de querer passar tudo o que vou aprendendo ao longo do tempo, também tento ser amigo. Procuro primeiro perceber como está o atleta, o seu estado mental, porque isso é fundamental. Um jogador que não esteja bem mentalmente não vai render. Tento compreender as dificuldades que possam ter, para podermos trabalhar nelas. O meu objetivo é explorar e extrair o melhor de cada um. Eles sabem sempre que estão à vontade, porque, acima de tudo, há momentos para brincar e para trabalhar. Eles sabem que, como treinador, sou primeiro amigo deles, depois sou treinador. Portanto, sobre qualquer coisa, sabem que podem chegar a mim e dizer: 'Mister, não me sinto bem assim' ou 'acho que poderia ser assim'. E eu converso com eles à vontade, temos uma relação muito aberta.

"Acho que ainda tenho muito a dar como jogador"
- Aos 31 anos, como é que o Miguel encara o futuro? Acredito que ainda sinta vontade de jogar mais uns aninhos...
- É isso mesmo. Agora, estou a exercer a função de treinador e jogador ao mesmo tempo. Estou a tirar os níveis necessários para o futuro, a preparar-me para o que vem. Mas claro, ainda quero continuar a jogar mais uns aninhos, até porque me sinto muito bem fisicamente. Não estou à rasca. Acho que ainda tenho muito a dar como jogador. Porém, estou também a preparar o meu futuro.
- Mas sente vontade de seguir o caminho de treinador?
- É algo que eu gosto. Gosto muito do treino, do processo que envolve o treino. Gosto de ver o trabalho que fazemos fora de campo refletido no sucesso dentro dele. E acho que, acima de tudo, não é sobre ter chegado a fases de campeões e coisas do género, porque isso, nestas fases, não é o mais importante. O que realmente importa é o atleta estar preparado, crescer como homem, melhorar como pessoa. Acredito que posso ter sucesso no mundo do treino. Quero alcançar patamares que não consegui como jogador.

- Já vê futebol mais numa perspetiva de treinador?
- Pois, agora é isso. Quando assumimos essa posição, já começa a ser um pouco mais difícil. Passamos a reparar mais em detalhes que, talvez, enquanto jogadores não notávamos. Às vezes, é até em questões de apoio e leitura de jogo. Por exemplo, quando vejo jogos, como os do Real Madrid, reparava que o Toni Kroos, quando ele ainda lá estava, que está sempre a indicar com as mãos e tem uma postura corporal excelente para receber a bola. Ele está sempre a fazer aquele scanning do campo. Há muitos detalhes que agora reparei que antes não percebia, como os bloqueios, as bolas paradas, entre outras coisas. Agora, consigo ver muito mais. E, como sempre, desde criança, sou alguém que vive o futebol. Acho que sou daqueles que realmente ama o desporto, neste caso.

"O futebol deu-me as coisas mais bonitas da vida"
- O futuro passa pelo Vianense?
- A minha ideia é continuar a dar o meu contributo. Nunca sabemos quando podem surgir grandes propostas, o futuro é incerto. Mesmo a minha mulher, às vezes, puxa por mim e diz: 'Se surgir uma oportunidade melhor, sabes que, por mais que o coração esteja num sítio, às vezes temos de agarrar essas oportunidades.' Se surgir a verdadeira oportunidade, terei todo o prazer em abraçá-la. Mas, neste momento, sinto-me bem aqui, sinto-me em casa. Trabalho sempre no limite, algo que aprendi desde miúdo. E, como treinador, faço o mesmo: trabalho sempre no máximo, procuro sempre aprender, evoluir e querer mais. E é assim que vejo a minha função, tanto como jogador como treinador.
- Olhando para o passado o que tem a dizer sobre a carreira que construiu?
- Sinto-me muito orgulhoso de mim mesmo. Quando era miúdo, tinha o sonho de ser jogador profissional, e consegui realizá-lo. Agora, nesta fase da minha vida, o meu sonho é ser campeão com este clube. E, no futuro, também tenho o sonho de ser um treinador de alto nível e estar nos melhores campeonatos, se for possível.
- Qual a mensagem que passa aos jovens que procuram seguir o futebol como vida?
- O que lhes digo é que não podem deixar para amanhã o que podem fazer hoje. Se trabalharem hoje, no futuro vão colher os frutos. E, no mundo do futebol, às vezes é difícil admitir, mas, de cada 10 pessoas, talvez uma seja realmente tua amiga. Por isso, tens de ser forte por ti e acreditar sempre em ti mesmo, porque se não acreditares, mais ninguém o fará. Trabalhem, mesmo que um colega diga que não consegues, que não podes ou que não vais fazer. Não acredites nisso. Na tua cabeça, diz-te a ti mesmo que consegues, e segue em frente com essa mentalidade até ao fim. É assim que alcançamos o sucesso, acreditando em nós mesmos.

- Para finalizar a entrevista, que mensagem tem para o futebol?
- Posso dizer que o futebol me deu as coisas mais bonitas da vida. Desde a minha mulher, a minha filha, até aos caminhos por onde já passei e tudo o que vivi. O futebol foi, praticamente, a minha vida – podemos resumir assim. Deu-me a oportunidade de ser jogador e, futuramente, poderá dar-me a de ser treinador. Tenho vivido experiências incríveis, que nunca imaginei viver, como os lugares que viajei e tudo o que o futebol me proporcionou.