Análise: Futebol brasileiro restabelece prestígio no Mundial de Clubes e aprende lições

Jogadores do Fluminense celebram vitória sobre o Inter
Jogadores do Fluminense celebram vitória sobre o InterMARCELO GONÇALVES / FLUMINENSE F.C.

O futebol brasileiro despediu-se do Mundial de Clubes de cabeça erguida. Os quatro clubes do país que foram aos Estados Unidos — Botafogo, Flamengo, Fluminense e Palmeiras — deixaram boas impressões e conquistaram resultados expressivos, inclusive com vitórias diante dos europeus, algo que não acontecia desde que o Corinthians derrotou o Chelsea no antigo Mundial da FIFA em 2012.

O título continua a ser uma realidade distante, aprofundado pela disparidade financeira percetível e também pelo calendário sufocante. Mas, em termos regionais, o futebol brasileiro só confirmou o que tem sido — dominante em relação aos vizinhos. 

A pirâmide do futebol mundial, obviamente, apresenta a Europa no topo, mas o Brasil aparece com certa folga à frente dos demais competidores do continente sul-americano — Boca Juniors e River Plate, os gigantes argentinos, nem sequer passaram da fase de grupos. 

Fluminense foi eliminado nas meias finais
Fluminense foi eliminado nas meias finaisMARCELO GONÇALVES / FLUMINENSE F.C.

O clube xeneize fez ainda mais pior ao não conseguir vencer o modesto Auckland, da Nova Zelândia, um emblema semi-profissional. 

O respirar dos técnicos brasileiros

Mas para além desta disputa doméstica, há quem até ache que o respeito foi devolvido ao futebol brasileiro, mesmo que os técnicos europeus, como Pep Guardiola e Enzo Maresca, apontassem que nunca houve descrédito ao Brasil — não à toa, o desejo do futebol do Velho Continente continua a ser ter jogadores brasileiros (aos montes). 

Para Renato Portaluppi, a questão é ainda mais profunda. As exibições do Fluminense e também de Filipe Luís à frente do Flamengo simbolizam uma vitória para os técnicos brasileiros, desprestigiados nos últimos anos por serem taxados como defasados em termos táticos. 

Renato Portaluppi, técnico do Fluminense
Renato Portaluppi, técnico do FluminenseMARCELO GONÇALVES / FLUMINENSE F.C.

"Eu acho que a credibilidade voltou bastante forte para o futebol brasileiro. Pelas grandes equipas, tanto o Flamengo, o Botafogo e o Palmeiras. O Fluminense a chegar à meia-final. Em termos de Europa, não só o mundo, mas que o Brasil possa olhar com outros olhos o treinador brasileiro. Valorizar mais os treinadores brasileiros também", disse Renato após a derrota frente ao Chelsea.

"Nada contra os estrangeiros, há espaço para todos, mas muita gente fala só dos estrangeiros e dão pouco interesse aos brasileiros. Acho que o Mundial fez os brasileiros subirem na cotação. Que tenhamos um pouco mais de respeito com os treinadores brasileiros. Sei que isso é difícil, mas espero que aconteça", acrescentou. 

As lições do Mundial

O torneio nos Estados Unidos apontou ainda que o futebol brasileiro consegue competir com os emblemas que estão numa considerada segunda prateleira da Europa — caso do FC Porto, que foi ao Mundial e terminou por demitir o técnico argentino Martín Anselmi após uma eliminação traumática ainda na fase de grupos.

Paulinho foi o grande herói do Palmeiras
Paulinho foi o grande herói do PalmeirasCesar Greco/Palmeiras/by Canon

Para romper a última barreira, no entanto, o processo ainda é penoso. Só que o Mundial deixou boas lições para as equipas do país pentacampeão mundial. 

"Os clubes brasileiros estiveram sempre no seu limite, enquanto os europeus tinham margem para melhorar, como vimos nas fases mais apertadas. O Fluminense chegou entre os quatro melhores da competição. Isso não é pouca coisa. Precisa de ser destacado. Mesmo o Palmeiras nos quartos merece respeito", analisou o jornalista brasileiro Robson Morelli, da Rádio Eldorado e do The Football.

"Há um caminho para clubes brasileiros no Mundial. Fiquei com essa impressão. Existe uma diferença técnica grande entre os brasileiros e os europeus. Sempre soubemos disso. As lições que Fla, Flu, Botafogo e Palmeiras levam dos Estados Unidos é uma só: com tempo para treinar e recuperar os seus jogadores, os clubes tendem a jogar mais e melhor, com mais intensidade", seguiu.

Flamengo caiu frente ao Bayern
Flamengo caiu frente ao BayernGilvan de Souza/Flamengo

"Penso que os técnicos dos clubes brasileiros saem do Mundial com a certeza da necessidade de rodar planteis e maneiras de jogar. Todos eles montaram as suas equipas de diferentes maneiras e de acordo com os adversários. A conceção de 11 titulares ficou para trás. O Mundial confirmou essa tendência para os brasileiros", concluiu Morelli. 

Sem troféu "de igual para igual"

O jornalista André Avelar, da revista Placar, apontou para outro fator que sempre cercou o imaginário das disputas entre brasileiros e europeus — o termo "jogamos de igual para igual". Existe diferença, mas o saldo da participação é positivo. 

"O troféu jogamos de igual para igual não existe. Mas, ainda assim, é louvável o desempenho dos quatro clubes brasileiros que estiveram no Mundial de Clubes. Flamengo e Botafogo caíram ainda nos oitavos de final para Bayern de Munique e Palmeiras, respetivamente. O Palmeiras parou na fase seguinte frente ao Chelsea. E o Fluminense, como o Renato Gaúcho disse, era o patinho feio nessa disputa", comentou. 

Palmeiras e Botafogo encontraram-se nos oitavos
Palmeiras e Botafogo encontraram-se nos oitavosVitor Silva/Botafogo

Avelar lembrou ainda do Mundial distópico que tomou forma nos Estados Unidos, com Renato Gaúcho, por exemplo, a dedicar-se ao estudo do futebol, enquanto Guardiola curtia, de certo ponto, a praia com os jogadores de Manchester City. 

No momento mais crucial da prova, todavia, essa disparidade de realidades conflitou-se. João Pedro, um jovem talento brasileiro, obliterou o já veterano goleador do Fluminense. 

"O Fluminense foi o elefante que subiu na árvore, ninguém sabia como chegou ali, mas era certo que caíria, natural nessa batalha de brasileiros contra europeus. O trunfo para o Fluminense ir longe na competição foi Renato Gaúcho que, olha só, agora um estudioso do futebol", analisou.

Cano durante a meia-final contra o Chelsea
Cano durante a meia-final contra o ChelseaLUCAS MERÇON / FLUMINENSE F.C.

"Longe da praia, do futevólei, o já folclórico treinador montou uma boa equipa, mas o poderio económico falou mais alto. O Chelsea tinha um jogador formado em Xerém, João Pedro, de 23 anos, que marcou dois golaços na meia-final. Já o Flu jogou com um avançado de 37 anos, a voltar de lesão, Germán Cano", concluiu André Avelar. 

Não importa onde, há sempre um brasileiro

O futebol brasileiro foi o único que chegou à meia-final do Mundial de Clubes, metendo-se na disputa com os gigantes europeus. O país também acumula importantes marcas dentro do Mundial de Clubes, como a maior quantidade de jogadores de uma mesma nacionalidade e o número de golos somados. 

Até ao momento, 30 tentos foram marcados por jogadores brasileiros na competição, 11 a mais do que a segunda classificada Argentina, com 19. Só depois aparece o futebol francês, com 16 golos marcados por jogadores do país europeu.

Marcos Leonardo é um dos melhores marcadores da prova
Marcos Leonardo é um dos melhores marcadores da provaJEAN CATUFFE / Jean Catuffe / DPPI via AFP

O brasileiro Marcos Leonardo, do Al-Hilal, é um dos melhores marcadores da competição, com quatro golos, empatado com Di María, ex-Benfica, Gonzalo García, do Real Madrid, e Guirassy, do Borussia Dortmund. 

Em termos de público, o jogo da meia-final entre Fluminense e Chelsea, no MetLife Stadium, foi o quarto maior do Mundial de Clubes — com 70.556 adeptos. Os brasileiros também foram os que mais adquiriram bilhetes para a competição intercontinental e fizeram festas memoráveis nos principais pontos turísticos das cidades-sede. 

Adeptos do Palmeiras na Times Square
Adeptos do Palmeiras na Times SquareVANESSA CARVALHO / Brazi Photo Press / Brazil Photo Press via AFP

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