Apesar de Jerome Boateng ter uma carreira repleta de conquistas, incluindo umMundial e várias Liga dos Campeões, o desfecho difícil dos dias como jogador — marcado por uma fase de mudanças constantes de clube e pela condenação por agressão à ex-namorada — acabou por manchar o legado que construiu.
Na sexta-feira passada, o defesa-central campeão do mundo Jerome Boateng anunciou a sua retirada do futebol aos 37 anos.
"Joguei durante muito tempo, por grandes clubes, pelo meu país. Aprendi, venci e perdi. O futebol deu-me muito. Agora, chegou o momento de seguir em frente. Não porque seja obrigado, mas porque estou preparado. Sou grato por tudo. Pelas minhas equipas, pelos adeptos e por todos os que me apoiaram. Acima de tudo, a minha família e os meus filhos estiveram sempre ao meu lado. Família, amigos, fãs, chegou a hora."
Embora o momento do anúncio do jogador de 37 anos não possa ser questionado, é irónico que um dos defesas mais reconhecidos do mundo na última década tenha encerrado a carreira de forma tão discreta que muitos adeptos podem ter ficado surpreendidos ao perceber que ele ainda não tinha pendurado as chuteiras.
Para alguém que conquistou um Mundial, duas Ligas dos Campeões e e vários triunfos na Alemanha, sendo que se destacou pelo trabalho social com crianças e jovens, foi um destino cruel ver o último capítulo da sua carreira ser marcado pelo fim do contrato com o LASK Linz, da Áustria, e pela condenação por agressão à ex-namorada.
A ascensão de Boateng na Bundesliga
Nascido em Berlim Ocidental em 1988, filho de pai ganês e mãe alemã, que sempre proporcionaram um ambiente competitivo e de apoio, Boateng, juntamente com o meio-irmão Kevin-Prince, rapidamente subiu nos escalões do futebol alemão.
Num lar onde o futebol se tornou uma via de identidade e oportunidade, Jerome Boateng transformou-se num símbolo de sucesso para jogadores de diferentes origens, graças à sua perseverança, força física e inteligência tática, tornando-se peça fundamental no Bayern Munique e na seleção alemã.
Depois de se destacar nas camadas jovens do Hertha Berlin em 2002, tornou-se titular da equipa principal, mesmo com apenas 18 anos. O seu talento chamou a atenção do Hamburgo, que o contratou em 2007 por cerca de 1,1 milhões de euros, onde consolidou a sua reputação na Bundesliga.
Após chegar a duas meias-finais da Liga Europa com o HSV, o defesa passou uma época no Manchester City, mas não conseguiu garantir um lugar fixo no onze inicial e foi frequentemente utilizado fora da sua posição, como lateral-direito.
Ao regressar à Bundesliga, desta vez para o maior campeão alemão, tornou-se uma peça-chave no Bayern Munique sob o comando de Jupp Heynckes, sendo fundamental na conquista do triplete em 2012/13: Bundesliga, Taça da Alemanha e Liga dos Campeões.
Depois de vencer o Europeu Sub-21 em 2009, o auge da sua carreira pela "Die Mannschaft" foi durante o Mundial-2014 no Brasil, em que se tornou o pilar da defesa alemã rumo ao título.
Anos dourados no Bayern e na Alemanha
Na final entre a seleção de Jogi Low e a Argentina de Lionel Messi, foi Mario Gotze quem, tal como Andreas Brehme em 1990, ficou para a história com o único e decisivo golo. Mas Boateng destacou-se entre todos os heróis com uma exibição impressionante.
Nos anos seguintes, Boateng foi eleito Futebolista do Ano na Alemanha na temporada 2015/16 e integrou as equipas do ano da UEFA, mas após cinco ou seis anos de sucesso no Bayern, as lesões prolongadas começaram a afetar a sua carreira e deixou de ser imprescindível no clube. Isso levou a um desentendimento com o treinador Nico Kovac, que bloqueou uma possível transferência para o PSG e, ao mesmo tempo, relegou Boateng para o banco.
O fim sombrio de uma carreira vitoriosa
Na reta final da temporada 2018/19, Boateng — que será sempre lembrado pelo lance em que Messi o fez cair na meia-final da Champions League de 2015 — já não tinha vontade de festejar os títulos da Bundesliga ou da Taça da Alemanha com os colegas, preferindo dirigir-se diretamente para o balneário após cada conquista do Bayern.
Boateng ainda conseguiu recuperar a titularidade em alguns momentos no Bayern, mas saiu do clube em 2021 e passou os últimos quatro anos no Lyon, Salernitana e LASK, onde já não era o jogador de outros tempos.
Boateng continuou a ser notícia no final da carreira, mas não pelos feitos em campo, e sim pelas polémicas fora dele, ao ser condenado a uma multa suspensa e advertência depois de um tribunal de Munique o considerar culpado de agressão premeditada à ex-companheira, num caso que remonta a 2018.
Rudi Voller costuma dizer que quem vence o Campeonato do Mundo é campeão mundial para toda a vida. Mas para Jerome Boateng, esse título exclusivo e eterno acabou manchado pelos problemas pessoais, numa das carreiras mais premiadas do futebol alemão.