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Opinião: Inglaterra não precisa de Jude Bellingham para ter sucesso no Mundial

Talvez Jude Bellingham simplesmente não faça parte do melhor onze da Inglaterra
Talvez Jude Bellingham simplesmente não faça parte do melhor onze da InglaterraNigel French/Sportsphoto/APL / Mary Evans Picture Library / Profimedia

Desde que foi deixado de fora, multiplicaram-se os apelos para que Jude Bellingham seja reintegrado na equipa de Inglaterra de Thomas Tuchel o mais rapidamente possível. No entanto, depois de garantir a qualificação para o Mundial e de impressionar sem ele, surge a questão: talvez a seleção inglesa não precise afinal da sua estrela.

No início da campanha de qualificação da Inglaterra, este autor defendeu que só saberíamos se a equipa de Tuchel tem qualidade suficiente para vencer o Mundial quando já fosse tarde demais, tendo em conta a falta de adversários de peso nos jogos nos jogos oficiais e também nos particulares escolhidos (uma derrota frente ao Senegal e uma vitória mais recente sobre o País de Gales).

Mantenho essa opinião. Não sabemos se têm qualidade para conquistar o Mundial, mas é certo que estão a ganhar embalo (marcaram 15 golos sem resposta nos últimos quatro jogos). No entanto, isso não significa que não tenhamos aprendido nada sobre estes Três Leões neste período. Na verdade, aprendemos bastante. Por exemplo, percebemos quem são os jogadores em quem Tuchel confia e gostamos de ver algumas das novas caras integradas no grupo.

Sabemos que Elliot Anderson está à altura, depois de ter brilhado no meio-campo nas três últimas vitórias da Inglaterra. Ficou claro que Djed Spence é uma opção fiável para lateral, em ambos os flancos. E que Marcus Rashford voltou a ser considerado para o lado esquerdo no 4-2-3-1 preferido pelo treinador, embora, neste momento, pareça estar atrás de Anthony Gordon na hierarquia.

Anthony Gordon celebra o seu golo frente à Letónia na terça-feira
Anthony Gordon celebra o seu golo frente à Letónia na terça-feiraBradley Collyer / PA Images / Profimedia

Na verdade, já conhecemos cerca de dois terços do onze que vai iniciar o Mundial, e não é polémico afirmar que a maior parte da convocatória se faz praticamente sozinha. Contudo, há ainda algumas posições em aberto. E é precisamente nesses lugares que se concentram os grandes debates.

Inglaterra impressionou sem Jude

Uma das questões mais debatidas tem sido, sem dúvida, o motivo pelo qual Jude Bellingham não foi convocado para a mais recente pausa internacional. Ainda não estaria totalmente recuperado? Foi simplesmente preterido? Terá sido um aviso de Tuchel devido à sua tão falada ‘atitude’? Caiu em desgraça? Ou será tudo apenas um exagero? Muitos comentadores deram a sua opinião.

E apesar de parecer haver uma fonte inesgotável de antigos jogadores a lamentar a ausência dele e de outros na seleção, os jogos de outubro mostraram que a Inglaterra consegue apresentar exibições eficazes e vitoriosas sem nomes como Bellingham, Phil Foden, Jack Grealish, Cole Palmer, Adam Wharton, Reece James, Trent Alexander-Arnold, Noni Madueke e até do seu capitão Harry Kane (como ficou especialmente evidente frente ao País de Gales).

Esqueci-me de alguém? Provavelmente. O leque de opções é mesmo tão vasto.

O selecionador de Inglaterra, Thomas Tuchel, durante uma conferência de imprensa
O selecionador de Inglaterra, Thomas Tuchel, durante uma conferência de imprensaAction Images via Reuters / Peter Cziborra

E embora não tenhamos ainda a certeza se a Inglaterra tem qualidade para vencer o Mundial, ou sequer para chegar longe, há algo que já ficou claro. Tirando Kane (que está realmente num patamar acima), não precisam necessariamente da maioria dos jogadores referidos para atingir o nível exigido para competir com as melhores seleções do mundo.

Alguns dos que não têm sido chamados deverão, sem dúvida, voltar a entrar nas contas – James e Madueke teriam provavelmente sido opção se estivessem aptos, Palmer também. Mas quanto a Bellingham, apesar de ter qualidade para estar presente, de repente parece ser dispensável. Vamos analisar isto mais a fundo.

Taticamente, Bellingham simplesmente não encaixa

Analisando o onze da Inglaterra, é seguro afirmar que Declan Rice é dono de um dos dois lugares mais recuados do meio-campo no sistema 4-2-3-1, enquanto Bukayo Saka é a primeira escolha para a direita. Gordon ou Rashford, como já referido, parecem ser as opções preferidas para o lado esquerdo. Isto deixa em aberto o outro lugar de médio mais defensivo e o número 10 atrás de Kane, no que toca ao meio-campo.

A dominar o corredor esquerdo: o mapa de calor de Jude Bellingham no recente dérbi de Madrid
A dominar o corredor esquerdo: o mapa de calor de Jude Bellingham no recente dérbi de MadridOpta by StatsPerform / ANGEL MARTINEZ / GETTY IMAGES EUROPE / GETTY IMAGES VIA AFP

Começando pelo papel mais recuado, a primeira coisa a dizer é que essa não é, de todo, a posição de Bellingham. À medida que a sua carreira evoluiu, foi-se deslocando cada vez mais para a esquerda e para zonas mais adiantadas do que o papel clássico de médio-centro que parecia destinado a dominar, sobretudo no Dortmund.

Aliás, em alguns momentos da sua carreira no Real Madrid, especialmente na época 2023/24 (a mais produtiva de sempre em golos), chegou mesmo a atuar como avançado improvisado, um ‘falso nove’, por assim dizer. Noutras ocasiões, vimos Bellingham no lado esquerdo de um ataque a dois.

Tendo em conta o impacto de Anderson, há ainda outro argumento – Bellingham não está entre os dois melhores médios defensivos que o país tem à disposição.

Além disso, depois de Rice e Anderson, não esqueçamos Wharton e os jogadores que Tuchel realmente escolheu para dar profundidade a essas posições em vez de Bellingham, Jordan Henderson e Ruben Loftus-Cheek.

A avançar para a frente e para a esquerda: zonas de toque de Jude Bellingham pelo Real Madrid na LaLiga em 2023/24
A avançar para a frente e para a esquerda: zonas de toque de Jude Bellingham pelo Real Madrid na LaLiga em 2023/24Opta by StatsPerform

Portanto, não é um médio defensivo de raiz, e talvez nem esteja entre os dois melhores. Mas e mais à frente, na posição onde atualmente prefere jogar?

Aí surge outro problema (feliz para Tuchel, diga-se), chamado Morgan Rogers. O jogador do Aston Villa tem estado em grande plano atrás de Kane nas três últimas vitórias da Inglaterra, e quando sai, Eberechi Eze entra com classe a partir das alas.

Não sendo um criador clássico, mas sim um segundo avançado de grande mobilidade quando atua no apoio, há ainda o receio de que Bellingham tenda a desviar-se para a esquerda, invadindo a zona do extremo (como mostram os gráficos acima) ou ocupando espaços onde Kane gosta de atuar, um problema que já afetou a Inglaterra no passado.

Dado que Kane gosta de recuar para zonas do meio-campo, é preciso uma certa arte para combinar com ele de forma eficaz. Não é que Bellingham não seja capaz, mas Rogers e Eze parecem mais talhados (e atualmente preferidos) para esse papel. Palmer é outra opção interessante, e não esqueçamos Foden.

Ou seja, não é evidente que Bellingham esteja entre os dois melhores números 10 da Inglaterra.

Morgan Rogers pode ser a melhor opção da Inglaterra para a posição 10
Morgan Rogers pode ser a melhor opção da Inglaterra para a posição 10ČTK / imago sportfotodienst / Paul Terry

A hipótese de Bellingham jogar à esquerda é ainda menos convincente do que ao centro. Gordon tem estado irrepreensível, Rashford reencontra-se em Barcelona e até Grealish parece uma alternativa mais provável, certamente mais natural.

Sem esquecer que Eze também pode atuar à esquerda, tal como Madueke se regressar ao grupo.

Portanto, se não se escolhe Bellingham como seis ou oito, como dez ou extremo… Talvez simplesmente não se escolha. E talvez tenha sido exatamente essa a conclusão a que Tuchel chegou na última convocatória.

É verdade que Tuchel referiu que a falta de ritmo competitivo de Bellingham pesou na decisão. No entanto, olhando para a forma como o grupo está a ser construído e, sobretudo, para o rendimento atual da equipa, é difícil imaginar o alemão a forçar o regresso do jogador do Real Madrid só por obrigação.

Assim, embora a questão sobre se a Inglaterra tem qualidade para vencer o Mundial continue em aberto, há algo que se tornou mais claro: não precisam de Jude Bellingham para lá chegar.

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AutorFlashscore