Há apenas um ano, a capital do pequeno emirado do Golfo era o centro do interesse mundial, com o início do maior torneio do planeta, realizado pela primeira vez no Médio Oriente, entre novembro e dezembro.
O evento atraiu milhares de turistas, mas também gerou polémica devido a alegações de corrupção no processo de concurso e críticas de numerosas organizações humanitárias sobre a falta de respeito pelos direitos humanos.
Doha já recuperou a calma habitual, mas o êxito da organização permitiu ao Catar, segundo os especialistas, melhorar a sua imagem no mundo árabe e manter o compromisso com o desporto numa região que voltará a acolher o Campeonato do Mundo em 2034, na Arábia Saudita.
Jassim al Jassim, do comité organizador do Campeonato do Mundo, recorda "muita tensão" em 20 de novembro de 2022, dia em que o Campeonato do Mundo arrancou com o jogo entre o Catar e o Equador, com a vitória da equipa tricolor por 2-0.
"Mas penso que, no geral, estávamos muito felizes e orgulhosos do que tínhamos conseguido como país", recorda o então diretor de operações do comité organizador.
O Catar enfrentou uma onda de críticas desde a eleição, em 2010, para organizador do Campeonato do Mundo, devido às condições dos trabalhadores migrantes nos locais de construção dos estádios, às alegações de corrupção no concurso, à desigualdade das mulheres, às leis homofóbicas e às restrições ao consumo de álcool.
Mas, de acordo com Danyel Reiche, investigador especializado em política e desporto baseado no Catar, o interesse do emirado rico em gás ia além disso, afirmando que o Golfo "se tornou o centro do desporto mundial".
A escolha da Arábia Saudita para acolher o Campeonato do Mundo de 2034 "não teria sido certamente possível sem o sucesso do Campeonato do Mundo de 2022", defendeu.
Infraestruturas
No Catar, o legado do Campeonato do Mundo é, antes de mais, material, com novas infraestruturas: metro, expansão do aeroporto, estradas, hotéis, estádios... Os 220 mil milhões de dólares investidos pelo emirado fizeram do Mundial de 2022 o mais caro da história, embora os organizadores rejeitem este rótulo, alegando que muitos destes projetos já estavam planeados de antemão.
O dinheiro gasto "valeu definitivamente a pena, embora não tenham sido feitos apenas para o Campeonato do Mundo", diz Jassim, que afirma que apenas 7 mil milhões de dólares foram investidos na construção de sete dos oito estádios utilizados para o evento (apenas um, o Khalifa International Stadium, já estava construído).
De acordo com Jassim, o novíssimo Estádio Lusail vai acolher as cerimónias de abertura e de encerramento da Taça Asiática de 2023 no Catar, de 12 de janeiro a 20 de fevereiro, depois de a China ter recusado acolher devido à COVID-19.
Outro estádio emblemático, o Estádio 974, construído a partir de contentores marítimos, não será utilizado para o torneio continental e o seu futuro será anunciado "muito em breve", disse Jassim sem entrar em pormenores.
"Ataques contra o Catar"
Na semana passada, a organização humanitária Amnistia Internacional acusou o emirado de não ter melhorado os direitos dos trabalhadores migrantes, embora Doha defenda que o Mundial "acelerou" as reformas sociais no país, deixando um "legado duradouro".
Jassim afirma que estas críticas são "apenas ataques contra o Catar" por parte de pessoas que acreditam que "não éramos dignos de acolher um torneio deste género".
Ao denunciar uma campanha classificada de racista pelas autoridades do Catar, Doha ganhou o apoio de árabes e muçulmanos de todo o mundo, afirmou Hisham Hellyer, especialista em Médio Oriente da Universidade de Cambridge, para quem o Campeonato do Mundo "reforçou a posição e a imagem" do Catar na região.
O evento também permitiu ao Catar melhorar as relações com os seus vizinhos, especialmente com a Arábia Saudita, com quem estava numa crise diplomática desde 2017, acrescentou Reiche, que recordou a imagem do emir usando um cachecol saudita durante a vitória da equipa asiática contra a Argentina.