- Vejo-o em boa forma porque li que o desporto, a competição, não parou, pois não? Não é o futebol, mas continua a competir.
- Sim, quando me reformei, passei quatro ou cinco meses um pouco desligado, mas no final, como digo sempre, aqueles de nós que estão ligados ao desporto desde muito novos estão sempre ativos. E nada, fiquei em casa durante cinco meses, entrei para o ginásio, comecei a correr, comecei também a fazer duatlos, triatlos e, bem, triatlos. Triatlos que não fiz. Nunca fui bom a nadar e não fui capaz de o fazer. Mas é verdade que comecei a trabalhar com rotinas de treino, rotinas de ginásio, tal como treinava antes. E sempre tive o desejo de competir e também compito.
- Acima de tudo, Fernando, porque se reformou bastante novo, não foi? Com cerca de 32 anos, penso eu, não foi?
- Sim, é verdade que agora tudo parece mais fácil. Quando falo do meu tempo, a verdade é que ainda tínhamos muito pouca informação sobre nutrição, prevenção de lesões e fortalecimento. Estávamos anos-luz à frente quando eu jogava. Depois temos os grandes, como o Joaquín, e os outros que, para além de serem da minha época, são maravilhas físicas. São bons tecnicamente e andam pelo campo com muita vontade. Mas é verdade que na nossa época havia pouca informação e a equipa técnica era constituída por dois ou três elementos. Agora, se olharmos para a equipa técnica de qualquer equipa da primeira divisão, vemos que há mais equipa técnica do que plantel, e isso vê-se na durabilidade. Estamos a assistir a isso em todos os desportos. No final, os futebolistas são cada vez mais jovens, lesionam-se menos, têm melhores recuperações, têm menos lesões porque têm mais prevenção e é isso que faz com que o futebolista, a vida de um futebolista ou de qualquer desportista, dure mais tempo.
"A nutrição é fundamental para um atleta de elite"
- Tem a sensação de que agora se cuidas ou que tem melhores conselhos sobre nutrição e preparação do que quando era jogador? Porque li numa outra entrevista que até pediu ao Lopera para lhe preparar um ginásio melhor, para remodelar um pouco a cidade desportiva, porque se calhar, como disse antes, não tinha as melhores ferramentas.
- Concordo a 100%. Éramos o Betis, da Primeira Divisão, uma equipa histórica e deviam ver como era o ginásio. Para além do facto de não ser utilizado. Porque eu lembro-me que era sempre utilizado por aqueles que estavam lesionados, por aqueles que estavam a ficar mais fortes depois de uma operação ou o que eu digo sempre, as pessoas utilizavam-no quando chegava o verão, quando era altura de um mês no ginásio e parecia que alguém ia ficar um pouco mais forte. Para se tonificar um pouco no verão. Mas não havia um trabalho preventivo e um treino de força bem planeado. E a alimentação, a alimentação é uma coisa muito importante. Como diz, eu reparei nisso agora porque estou com treinadores, estou com nutricionistas, a minha mulher também estudou isso e é fundamental para um atleta de elite. Um atleta depende da alimentação para poder ter o melhor rendimento possível, para durar, para ter menos lesões. Isso é fundamental e, na altura, era algo que não estava disponível.
- Nem sequer estava ao alcance do jogador, nem sequer era considerado.
- Não foi considerado porque não tínhamos conhecimento, éramos jovens. Na equipa técnica não havia essa pessoa, esse ramo dos nutricionistas, dos dietistas, até da alimentação. Cheguei a ir a Inglaterra para experimentar e à Alemanha e lá comiam nas cantinas, mesmo em algumas equipas grandes também. Ia-se para o treino e comia-se lá. Agora isso faz-se em todo o lado. Antes era impensável. Imaginem um miúdo de 20 anos que sai de casa e vai para o outro lado de Espanha viver sozinho aos 20 anos. Isso é uma bomba e é preciso estar muito estruturado em termos de alimentação, nutrição e descanso para poder dar o seu melhor.

- Reformou-se muito jovem, com 32 anos. Em que momento decidiu dedicar-se ao ciclismo e fazer um duatlo?
- Nunca pensei que fosse capaz de correr. É verdade que sabia que estava em boas condições. Sempre fui muito bom em provas de resistência, nos testes, nas provas que fizemos, sempre fui bom. Sabia disso em todas as pré-épocas ou em todos os testes que fizemos. Ou também no interior, no CAR, onde íamos muitas vezes fazer as provas de esforço. Eu sabia que tinha essas qualidades e quando comecei a correr, claro, quando comecei a correr rápido e as pessoas que correm há anos vêem-no. É porque tens uma vantagem, mas também a tua própria capacidade. E foi aí que me tornei competitivo, comecei a inscrever-me em corridas populares e, de cada vez, claro, estava a ficar cada vez melhor. Também me sinto fatigado a um nível competitivo. E depois juntei-me ao clube aqui em El Omio de Arahal, que é um clube de atletismo de longa data. Foi aí que comecei um pouco, comecei a gostar de ciclismo, comecei a alternar entre ciclismo e corrida. Fiz o circuito da Andaluzia, a Taça da Andaluzia. E a verdade é que tinha jeito para os dois. São desportos em que é preciso ter resistência.
- Ainda não entrou na água, pois não?
- Na água, não, acho que não. Aliás, já pendurei os meus ténis, pendurei-os porque, quando os calçava, tinha sempre problemas com o sóleo e o bíceps femoral. E a verdade é que estava farto de ter de parar outra vez, de começar outra vez, de fazer uma pré-época. Por isso, pendurei as sapatilhas. A bicicleta permite-me sempre sair em melhor ou pior forma e a verdade é que gosto de o fazer.
"Decidi retirar-me porque não me sentia competitivo devido às lesões"
- E foi sobretudo por isso, Fernando, que se retirou aos 32 anos, não foi? Porque penso que você próprio disse que tinha propostas para continuar a jogar, mas com aquele número de lesões...
- Quando saí do Recreativo, tive propostas de fora, mas a verdade é que eu já estava muito desmotivado com isso, porque começava um mês bem, lesionava-me outra vez, recomeçava com o ritmo de jogo, e depois caía outra vez. E ainda fui jogar para o Lugo, na segunda divisão. E foi um ano muito bom para mim, pessoalmente. Receberam-me muito bem, mas foi a mesma coisa. Quando estava a treinar, fui competitivo durante uma ou duas semanas e, na terceira semana, o desconforto do sóleo voltou. Fiz exames, não havia rutura e, no final, era sempre a mesma história. E assim acabamos por nos aborrecer, por ver que não somos competitivos. Porque, no fim de contas, é verdade que andamos por aí, fazemos contratos, mas quando não nos vemos competitivos no dia a dia, estamos a treinar fora do grupo, isso é difícil e ainda mais longe de casa. Por isso, decidi desistir e saber reformar-me a tempo.
- Com o duatlo, com o ciclocross. Mas também está ligado de alguma forma ao futebol com a Escola de Desporto do Arahal, não é verdade?
- Sim, quando terminei, estive um ano ou dois sem trabalhar e tive de começar a estudar. Antes de me reformar, obtive os níveis de treinador, 1, 2 e 3, o nível nacional também, e alguns outros cursos de futebol de base, gestão escolar, etc. E decidi, bem, aqui decidi começar o meu currículo na Escola Municipal de Desporto e a verdade é que comecei como monitor, como treinador, como qualquer outro colega. E a pouco e pouco fui gostando. Agora tenho a oportunidade de gerir a estrutura do grupo. São cerca de 600 rapazes e raparigas. Sou responsável pela metodologia, pela distribuição das equipas. A verdade é que estou muito feliz, faço muitas coisas e posso avançar neste momento naquilo que me realiza e no que gosto de planear, etc.

- Segue muito o futebol ou também tenta desligar-se e não estar tão concentrado, não ver tanto futebol?
- Continuo a ser, continuo a ser um membro com os meus filhos, a verdade é que eles são mais do que eu. Antes, eu também não via futebol, mas não era fã de ver muito futebol. Agora os meus filhos estão mais ligados ao Arahal, um é cadete e o outro é infantil. E eu digo sempre: hoje está a jogar esta ou aquela equipa. Eles puxam mais por mim do que eu por eles. E isso é porque eles também já viveram, mas são mais novos. Eles são mais lutadores do que eu no futebol.
- E por último, Fernando, tem algum objetivo pessoal no ciclismo para este ano, para esta época?
- Tento viver o dia a dia, não tenho objetivos. É verdade que tento fazer algumas das competições mais importantes. Sei que, no final, sou competitivo e estou sempre à procura do pódio. Mas, bem, tento estar no topo dos campeonatos andaluzes e um ano posso ganhar a camisola de campeão andaluz. Mas, de resto, o dia a dia, o treino com a rotina, não ficar obcecado e desfrutar da bicicleta, acima de tudo.