- Porque é que é tão difícil distinguir o que é uma mão na bola e o que não é? Especialmente dentro da área de grande penalidade, porque é aí que é mais relevante.
- Bem, acho que estão a fazer um debate onde não há nenhum, e estou a falar a sério. Quando se legisla, legisla-se, há 17 regras, e não há muitas mais regras, mas quando se legisla, legisla-se para tudo. O que é que isto quer dizer? Que 95% das mãos não são problemáticas. Quais são as problemáticas? Aquelas que estão nos dois extremos. Portanto, quando há um desses ponteiros que estão nos extremos e passam na zona, parece que toda a gente não quer perceber. Mas é muito fácil. No ano passado, de todos os ponteiros que havia, e há o rádio, acho que falhei um ou dois. Ou seja, não há assim tanto problema. Não há o problema que eles querem que nós vejamos. Há mãos que são muito, muito, muito cinzentas, claro, claro que há. Mas estou a dizer-vos, são as que estão nos extremos. Se há mil mãos num ano, de quantas é que estão a falar? Sete, oito, 10? Ou seja, eu não vejo o problema como tal, o que é que se passa? Estamos a falar de mãos que podem ou não ser penalidades, e isso tem muita cobertura mediática. Mas eu vejo mais problema, e digo-lhe mais, no futebol, na simulação do que nas mãos.
- Já que falou nisso, como é que lidaria com a questão da simulação e como é que pode ajudar o árbitro?
- Olha, no nosso tempo, sem VAR, a simulação era muito mais clara. Não era preciso mascará-la tanto. Agora, porém, como existe VAR, o avançado vai sempre procurar o contacto com o defesa. O que ele vai fazer é mascarar esse contacto. Um exagera-o e o outro mascara-o. E estamos a falar do facto de haver muitos penáltis, muitos penáltis que, se houver contacto, com a câmara lenta esse contacto é ampliado e parecem muito mais do que são. Esquecemo-nos de que o futebol é um desporto de contacto. E agora com as câmaras de câmara lenta, com tanta televisão, qualquer contacto é ampliado.
- Penso que isso está um pouco relacionado com o que Pérez Burrull me disse numa entrevista não há muito tempo, quando afirmou que numa fotografia não se pode apreciar a intensidade, o choque, o contexto da jogada?
- É verdade, é verdade. É que a fotografia para a arbitragem não serve para nada. A fotografia para a arbitragem só é útil onde bate. É tudo uma questão de intensidade. Quer dizer, como é que se mede a intensidade de um empurrão, como é que se mede a intensidade de um agarrão? Não se pode medir, é impossível. Depois, é uma questão de artimanha do atacante e de astúcia do defensor para disfarçar o que está a fazer.
- E depois, mudando de assunto, que não é tão atual, mas que o tem sido nestes últimos dias e que provavelmente voltará a ser abordado ao longo da época, é o caso do cartão vermelho de Dean Huijsen. Se o CTA reconhece um erro de um árbitro num jogo, como é que a sanção não é retirada pelos diferentes comités?
- Bem, essa é uma pergunta muito boa, mas é uma pergunta de sim e não. Ou seja, a Comissão Técnica de Árbitros não foi clara sobre esta ação. Porquê? Se estão a dizer que para eles é amarelo, mas entendem que é cinzento para o VAR, e por isso não entra, então também é cinzento para o árbitro. Se é cinzento para o VAR, é cinzento para o árbitro. E o que o CTA devia ter feito era concordar com o árbitro nessa ação. Não se pode dizer "para nós é amarelo, mas entendemos que para o VAR é cinzento". Vejamos, se para o VAR, olhando para quatro ou cinco imagens, é cinzento, para o árbitro que só tem uma, também será cinzento, não é? Portanto, tem de concordar com o árbitro e dizer que é cartão vermelho. Porque se disseres que é amarelo, tens de dizer "e o VAR devia tê-lo assinalado". É tão simples quanto isso. Com a atual questão da revisão das jogadas, temos de ser muito claros quanto à mensagem e temos de ser muito cuidadosos com a mensagem. E há aqui uma contradição muito, muito clara. Está a dizer às pessoas para compreenderem que o VAR não entra porque é cinzento para o VAR, e está a dizer ao árbitro que é um amarelo. Não, não, não, não, não, não. Será muito mais cinzento para o árbitro, que só tem uma imagem, do que para o VAR, que tem cinco.
- Acha então que, por exemplo, neste caso, talvez o CTA quisesse, não sei bem como dizer, satisfazer as pressões?
- Estou a dizer-lhe. Para parecer bem aos olhos de toda a gente.
"O CTA tem de ser um organismo tão forte que não se deixe pressionar"
- Exatamente, era isso que eu queria dizer. Para parecer bem diante das pressões que surgiram.
- Claro que sim. E o CTA não está lá para fazer boa figura perante toda a gente. Quero dizer, preocupa-me a forma como o CTA se está a desviar. O CTA tem de ser um organismo muito, muito forte no seio da Real Federação Espanhola de Futebol, ou independente, como queiram os árbitros. Mas tem de ser um organismo tão, tão forte que não se deixe pressionar. Agora, como vê, há cada vez mais carreiristas no CTA, cada vez mais pessoas de fora do CTA que não sabem o que é a arbitragem, não sabem o que é a arbitragem. E eu estou a ficar preocupado por causa das pressões da Liga e das pressões dos clubes.
- Falando um pouco dessas pressões, acha que tem de haver um esforço suplementar para ser, entre aspas, surdo e cego antes e depois dos jogos para evitar essa pressão, por muito impossível que seja?
- Não, mas vejamos, se a pressão sobre o árbitro, quando ele sobe à Primeira Divisão, passou por todas as categorias onde teve muito mais pressão e onde teve muito mais exposição à agressão física do que na Primeira Divisão. A primeira divisão é, entre aspas, onde toda a gente quer estar, porque é, vá lá, é onde sonhamos estar. Quer dizer, na primeira divisão não há problemas, que pressão é que se pode ter na primeira divisão? Se tivermos tudo. Penso que o árbitro está muito habituado a este tipo de pressão, tanto por parte dos meios de comunicação social como por parte do público quando entra em campo. Não vejo qualquer problema com esse tipo de pressão. O que eu vejo como um problema é a indefensabilidade que temos, e há cada vez mais, e há pessoas fora da arbitragem que querem corrigir a arbitragem. E penso que isso é um problema e um grande erro.

"Toda essa conversa sobre melhorar a arbitragem é uma treta"
- O que pensa também, agora que falávamos do CTA, do facto de haver um antigo treinador, Manzano, na comissão que nomeia os árbitros para os jogos da La Liga?
- É a quota-parte de poder que a Liga tem nesse comité de nomeação, porque há três pessoas. Uma é escolhida pela Liga, outra pela Federação e outra por consenso. Portanto, é um desastre. É um desastre. É uma tentativa não de controlar, mas de tentar tomar o poder em todos os órgãos da Real Federação Espanhola de Futebol. Estamos a ver que a Liga quer controlar tudo. Ou seja, vejam, até a ideia deles era retirar os delegados de jogo, que são os que vão fazer o relatório do árbitro no campo, porque é a única ligação que a Real Federação Espanhola de Futebol já tem dentro de um jogo da primeira divisão, o delegado federativo. E até isso é o que eles querem eliminar. É tudo uma questão de controlo. Tenho vindo a dizer isto desde o ano passado. Toda essa conversa sobre a melhoria da arbitragem e todas essas histórias são só tretas. Só querem ter controlo. Só querem o controlo e ter cada vez mais poder dentro da Federação e dos órgãos federativos. É legítimo, todos têm legitimidade para lutar pelo que querem, mas o que é que fazem durante 90 minutos? O que é que pode ser melhorado em 90 minutos? Ninguém diz o que é preciso fazer para melhorar os noventa minutos, que no fundo é o que interessa a toda a gente. Os adeptos? Não querem saber como se entra, como se sai, como se escolhe? O que é que interessa aos adeptos? Que durante os 90 minutos o árbitro acerte. Os adeptos importam-se que o árbitro seja previsível. Porque é que digo que o árbitro é previsível? Porque é o árbitro mais previsível num jogo de futebol, porque é preciso saber quando é um andebol, quando é fora de jogo, quando é apitado, quando não é, quando entra o VAR... E, neste momento, o árbitro é muito mais imprevisível do que éramos antes.
"Para que não haja ninguém ligado a Negreira, é preciso que passem três décadas"
- Falando de outro tema da atualidade, Negreira, o que pensa sobre este caso?
- Bem, deixe-me falar-lhe sobre isso. Mudaram o CTA porque não queriam que estivesse lá ninguém relacionado com o Negreira. Vamos lá ver, para não haver ninguém ligado ao Negreira, têm de passar três décadas. Porque a maior parte dos árbitros que estão na Primeira Divisão têm sido parentes do filho ou do pai. Ou seja, tem sido um dos casos mais abomináveis do futebol. Que um clube pague a um vice-presidente do CTA, mas também vos posso garantir que esse vice-presidente do CTA não teve qualquer influência nos árbitros, por muito que digam e por muito que queiram alimentar a história. Ele não teve qualquer influência sobre os árbitros. Não teve, e ao contrário do que dizem, não nomeou jogos internacionais. Isso não é verdade. Os jogos internacionais são nomeados pela UEFA ou pela FIFA. Não fui eu que mandei árbitros para cima ou para baixo. É verdade que ele lhe telefonou a dizer que tinha sido promovido ou despromovido, mas não o promoveu nem despromoveu. Porquê? Porque todas as comissões de arbitragem sempre foram presidenciais. Ou seja, quem mandava e quem fazia e desfazia as coisas era o presidente. O que acontece é que é uma história interessante para vender, porque há o Barcelona e o Madrid, as duas equipas transatlânticas. No fim de contas, é do interesse deles vender esta história. É triste que falem do caso Negreira e não do caso Barcelona, que é o que valeu a pena, porquê? Porque o sítio mais indefeso é sempre o árbitro. Caso Negreira. Em todo o caso, será o caso Barcelona-Negreira, não é?
- Esta pergunta talvez não possa saber, mas para que poderia ter ido esse dinheiro se não fosse para os árbitros?
- É evidente que eu não tive essa influência nos árbitros. Para começar, repare que estamos a tratar do caso há três anos e, em três anos, não há uma única prova, não há uma única indicação de que um euro tenha ido para um árbitro. Em três anos, não é? Ou seja, é dinheiro que foi pago e com fatura. Porque eu lembro que isto é descoberto por uma inspeção fiscal, que através de uma inspeção fiscal se descobre todo o caso.
- Não faria sentido comprar árbitros com faturas, pois não?
- É por isso que lhe estou a dizer. Já é o máximo. Vai-se adulterar uma competição, vai-se pagar a árbitros e faz-se uma fatura. Eu acho que, mas bem, isso cabe ao juiz dizer, seja o que for. Estou a dizer-vos porque foi o que eu disse. Chamaram muitos árbitros para testemunhar e eu estive a testemunhar durante três horas e meia e disseram-me: "Para onde acha que foi o dinheiro?" Disse-lhes muito claramente e digo, sem qualquer prova, que acredito que o dinheiro saiu e foi devolvido a alguém.
- Essa é talvez a outra teoria que estava a ser investigada, a da administração desleal e a de que se tratava de um circuito fechado de dinheiro.
- Claro, mas estou a dizer-lhe que o disse por dedução, sem ter qualquer ideia. Porque eu nem sequer tenho as provas. O que se está a passar, o juiz e a Guardia Civil estão a investigar. O que eu digo é que, como árbitro, e esta é a opinião dos árbitros, quanto mais depressa tudo se esclarecer, melhor. Porque, no fim de contas, é um descrédito para a arbitragem, para o futebol espanhol e para toda a competição, Quanto mais depressa se esclarecer e se encontrar o rasto do dinheiro, digo isto como árbitro, espero que o encontrem para que possamos ter um pouco de tranquilidade.

"Durante metade do mandato de Negreira as nomeações foram feitas por sorteio"
- Bem, e já falámos um pouco sobre isso, mas é uma pergunta que também não foi feita por muita gente: em que consistia o cargo de vice-presidente de Negreira nessa altura? Pergunto também por desconhecimento, porque tem sido referido que ele não tinha influência sobre os árbitros, que muita gente diz que ele tinha influência sobre as promoções, mas agora diz-me que não tinha.
- O vice-presidente? Quer dizer, ele ia lá às reuniões, mas, repare, eles não iam às reuniões connosco quando lá estávamos. Nós íamos lá sempre na semana anterior ao início do campeonato. Havia um estágio de uma semana em Santander. Ele estava lá em Santander, mas não estava connosco. E havia outro vice-presidente, Urízar Azpitarte, que era vice-presidente, assim como Franco Martínez, já falecido, que era de Múrcia. Ou seja, fazia parte de um conselho de administração. Mas, dentro dessa direção, não tinha poder para descer e subir árbitros, nem para nomear árbitros. Durante mais de metade do mandato de Enríquez Negreira, a nomeação dos árbitros era feita por sorteio e depois por um triunvirato que era, como agora, composto por um membro da liga, um membro da federação e um membro de consenso. Por outras palavras, o que é que ele tinha a dizer sobre as nomeações? Nada. Não tinha qualquer poder nas nomeações. Digo-lhe, se a maioria era por sorteio e depois era pelo triunvirato. Quando fomos para lá, ele disse-lhe em que grupo estava? Claro que vos disse em que grupo estavam. Diziam-nos o grupo 1, o grupo 2, o grupo 3, melhor isto, melhor aquilo, melhor o outro. Mas quando se tratava de decidir se se ia ser internacional, isso era muito presidencial. O Negreira teria tarefas dentro do CTA, claro. Dentro do conselho de administração, claro que tem tarefas. Mas, no fundo, é como muitos clubes. Muitos clubes têm diretores, mas nem todos os diretores têm poder de decisão. No final, é o presidente que dá as ordens.
"A credibilidade dos árbitros sempre esteve em falta"
- Pelo que percebi, considera que, também devido a casos como este do Negreira, etc., o respeito pelo coletivo de árbitros se perdeu ainda mais desde que se reformou, digamos assim.
- Isso é bem dito, ainda mais. Porque o respeito perde-se sempre. Mas, enfim, não é uma questão de Negreira, que foi o que fez explodir tudo, é evidente. E eu percebo isso. Compreendo que expluda e compreendo que as pessoas pensem assim. Compreendo-o perfeitamente. Porque tem sido, digo-vos, tem sido como uma facada no coletivo de arbitragem o que o Barça fez e o que o Negreira fez. Uma facada de descrédito total. Mas no fundo, a credibilidade da arbitragem sempre faltou. Sempre. Mas desde que os árbitros começaram. Se é a maior... Como hei-de dizer? É a espada de Dâmocles que temos sempre. O árbitro vai ter sempre falta de credibilidade e as pessoas vão sempre acreditar que se ele for a favor de uma tendência ou de outra. E como é que se pode mudar isso? É impossível. É impossível. É a cultura que todos nós temos. E a falta de credibilidade seguirá sempre a arbitragem. Mas não é novo, não é com o caso Negreira. Sempre existiu.
"Não sou anti-Negreira, não era anti-Madrid"
- Bem, agora falando dessas convicções, das tendências dos árbitros, o senhor, não sei se ainda mais depois de se reformar, tem sido acusado por sectores centralistas de ser um árbitro anti-Madrid, o que pensa disso?
- Bem, no fundo, isso é outra história. Quer dizer, eu não sou anti-Madrid. E não me interessa o que dizem. No fim, há que criar uma história. Eu não era anti-Madrid, claro, mas é que na época em que vivi ou em que arbitrei, coincidiu com a melhor equipa do Barça da história. Quando a melhor equipa da história coincide contigo, dizes, bem, bem, é que o Barcelona ganha sempre mais, claro. É o mesmo que se tivesses de arbitrar o Brasil nos anos 70. Claro que o Brasil ganha sempre com vocês, claro que estamos lixados, não viram a equipa que eles têm?
- E esta é uma tendência recente na arbitragem, que também pode ser considerada um avanço social, como é que se avalia o facto de haver um jogo quando há insultos racistas e de outro tipo? E porque é que não se fazia antes e talvez agora haja mais sensibilidade para isso?
- Bem, porque no final a sociedade muda, não é? A sociedade não é a mesma de há 10 anos, graças a Deus, e a sociedade está a mudar e a ganhar valores. Espero que também ganhe valores no futuro. E antes daqueles gritos que eram normalizados, a sociedade está agora a dizer: "Já chega, já chega, isso não pode ser permitido." E este é um passo em frente. E aqui temos de agradecer à Liga, à Federação, ao facto de todos estarem na mesma página. Ou seja, são avanços que o futebol está a fazer e agora já não se ouvem esses gritos como se ouviam no meu tempo, quer queiramos quer não, porque muitas vezes se fazia ouvidos de mercador, porque já estava normalizado. Ou porque não tínhamos as ferramentas que os árbitros têm agora, o protocolo, não tínhamos essas ferramentas para poder parar um jogo. Lembrem-se do célebre jogo do Saragoça que o Esquinas Torres apitou, quando o Eto'o quis abandonar o relvado, o Saragoça-Barça, por causa de insultos racistas. Agarraram Eto'o para o impedir de sair. Hoje em dia, o que foi dito ao Esquinas nessa altura, olha, convencemos o Eto'o a ficar, acabámos o jogo, hoje em dia isso não teria lugar, esse comportamento não aconteceria, porque já passámos à frente. Naquela altura era normal, mas hoje já não podemos olhar para isso com esses olhos.
"Dei-me muito bem com Karpin e Mostovoi"
- Falando agora um pouco da sua carreira, lembra-se de algum jogador com quem se tenha dado muito bem e de algum jogador com quem se tenha dado menos bem?
- Não, dei-me muito bem com todos aqueles que eram, entre aspas, arruaceiros, arruaceiros, dei-me bem com todos eles; com Karpin, Mostovoi.... Dá-se bem com quem se vê mais e, como corríamos em diagonal, os do centro são aqueles com quem se tem mais contacto, geralmente com os da ala, como não se chega à ala não se tem muito contacto, o árbitro geralmente tem contacto com os do centro. Fui bastante falador e não tive qualquer problema com os jogadores.
- Por falar em diálogo, já agora, qual é a importância da comunicação do árbitro com os jogadores e como é que equilibra isso para que eles também não o influenciem?
- É importante, mas é preciso saber onde é que se põe o limite. Se formos demasiado longe, acabamos por ser muito condescendentes e um árbitro não pode ser condescendente. O diálogo é sempre bom, mas dentro dos limites. Não se pode explicar todas as jogadas, não se pode explicar todas as decisões, não se pode explicar tudo, porque o jogador não o vai entender. O jogador quer jogar e, geralmente, quando se está a tentar explicar alguma coisa é quando se vai ter problemas. É que, com a bola em movimento, o árbitro não tem problemas. Quando é que os árbitros têm problemas? Quando a bola está parada, quando está parada, quando está parada, quando está parada, quando está parada, quando está parada, quando está parada, quando está parada, quando está parada. Por isso, o que o árbitro tem de tentar fazer é que quanto mais a bola estiver em movimento, melhor, porque menos problemas e menos pressão terá. Portanto, o diálogo é bom, mas sempre um diálogo moderado, e cada vez há mais gente a tentar explicar cada vez mais coisas, e o diálogo e a transparência estão a ser confundidos com o que deve ser um árbitro sério e íntegro.

"É mais complicado arbitrar um jogo de despromoção do que o Clássico"
- Apitou o Clássico, como é que o compara com qualquer outro jogo da Liga ou de qualquer outra competição?
- Dentro da mesma competição é uma história diferente, muito mais mediática. Toda a gente fala do Clássico, é o jogo mais mediático que existe, mas não é o mais difícil. O jogo mais difícil para um árbitro é um jogo de despromoção, porque um jogo entre o Madrid e o Barcelona vai estar no topo todos os anos e se um não ganhar num ano, ganha no seguinte. Por outras palavras, não há grande problema. Por outro lado, os da despromoção, quando se desce, toda a cidade desce, o comércio sofre, os jornalistas em vez de escreverem 1500 palavras vão ter de escrever 150 no próximo ano porque estão em segundo lugar, portanto essa pressão é muito maior para um árbitro na hora de acertar ou errar do que num clássico. Num Clássico, o teu erro será ampliado nos meios de comunicação social, o teu êxito será esquecido, mas o teu erro será muito ampliado, mas, por outro lado, num jogo de despromoção, isso durará para o resto da tua vida. Por outro lado, num jogo de despromoção, isso vai durar para o resto da vida. E os próprios jogadores, os nervos que têm, a tensão que têm, não os deixam jogar da forma que sabem. É muito complicado num jogo como este.
- Há algum tempo, saiu na imprensa uma declaração sua sobre a pressão que tinha recebido de Florentino Pérez e do Real Madrid. O que pode dizer sobre isso? Lembra-se desse capítulo?
- Não, não foi uma pressão. Depois de um jogo no Bernabéu, que o Real Madrid ganhou por 6-0, levaram-nos para uma sala e disseram-nos que o que queriam era que assobiássemos para eles como fazíamos para o Barcelona, mas não foi pressão nem nada. Comentei esse episódio e a imprensa do outro lado distorceu-o, mas nunca recebi pressões de nenhum dos lados.
- Há algum tempo, Pavel Fernandez, numa outra entrevista, disse que as equipas não querem uma boa arbitragem, querem que esta as favoreça.
- Sim, mas isso acontece com toda a gente na vida, não no futebol. É o que eu sempre disse, ou seja, não querem justiça, querem lucro. O que é a justiça? Quando te beneficiam ou quando cometem um erro a teu favor, protesta também. Isso é justiça. Justiça é querer o que é correto, querer o que é bem feito. Se vos beneficiam ou se cometeram um erro a vosso favor, isso é algo que está errado. Nesse caso, também devemos protestar e dizer: "Não, não é assim, eu não fui penalizado". Mas ninguém faz isso, porquê? Porque beneficiam com isso, por isso calam-se. Portanto, as pessoas não querem justiça, querem lucro.
- Queria também perguntar-lhe sobre o VAR e a sua chegada. Considera que foi uma aquisição bem sucedida para o futebol em geral?
- Em termos de objetividade, sim. Em termos de fora de jogo, se é fora de jogo ou não, é evidente que o objetivo não é discutível. Mas quanto à interpretação, eu deixaria em aberto. Ou seja, no caso dos agarrões e dos empurrões, deixaria isso apenas ao critério do árbitro. Porque, no fim de contas, introduz-se mais um critério para interpretar acções que têm de ser interpretadas pelo árbitro. Penso que, no que diz respeito ao aspeto objetivo, é ótimo, mas no que diz respeito ao aspeto interpretativo, haverá sempre problemas.
"O VAR facilita a vida do árbitro"
- O facto de haver VAR aumenta ou diminui a pressão sobre o árbitro?
- Não, facilita a vida ao árbitro. Sabem o que é viver com os erros, como nós vivíamos? Sabes o que é, agora com o VAR, acabar um jogo e saber que não cometeste um erro muito grave. Um erro que dizemos: "Uau, como é que não vi isso?" Agora com o VAR isso não existe. Mas agora, por exemplo, meter a bola na baliza, meter a bola na baliza, meter a bola na baliza, meter a bola na baliza, meter a bola na baliza. Mas agora, por exemplo, marcar um golo com a mão não é permitido. Não é permitido marcar um golo em fora de jogo que nos faça ganhar um jogo. Nesse sentido, o árbitro ganhou muita tranquilidade.
- Considera que o VAR pode tornar o jogo demasiado lento, que os tempos devem ser reduzidos porque há pausas de dois ou três minutos, ou justifica-se para determinadas situações?
- Não, mas no fim de contas o importante é tornar o futebol mais justo. Se tivermos de perder dois minutos a ver uma jogada, perdemo-los. A questão é fazer as coisas bem feitas. Muitas vezes, todas as mudanças também trazem prejuízos. E essa é uma das desvantagens, que o futebol, se o VAR entrar demasiadas vezes, deixa de ser tão dinâmico. Mas não há jogos em que o VAR entre, vamos ver, haverá alguns jogos em que o VAR entra três ou quatro vezes, mas geralmente não há jogos em que o VAR entre tantas vezes.
- Concorda com a política ou as instruções desta época para ser um pouco menos intervencionista?
- O VAR tem de intervir quando tem de intervir. Por isso é que eu digo que é preciso ter muito cuidado com a mensagem, porque é que tem de ser menos intervencionista? Se o VAR tem de intervir dez vezes num jogo, então tem de intervir. E se tiver de entrar uma vez, então uma vez. E se não tiver de intervir, então ganhamos todos. Mas tem de ser assim, é como dizer: "Olha, mesmo que vejas penaltis, não vamos ser demasiado intervencionistas e não vamos entrar". Então, porque é que querem o VAR? O VAR não tem de ser demasiado ou pouco intervencionista. O VAR tem de ser o que é, para intervir em erros claros, óbvios e manifestos.
"A atitude do Real Madrid perante os árbitros é uma exposição muito vantajosa"
- Falando agora de outro dos outros temas um pouco quentes, também muito reincidentes, que são as contínuas queixas do Real Madrid, acha que não têm razão de ser ou há aí alguma justificação?
- Não, vejamos, eles têm o direito de o fazer, mas é uma exposição muito vantajosa. Mas para o público deles, e o pior de tudo, eu sempre critiquei esses vídeos, porque o que eles fazem é criar uma opinião errada, porque só mostram os erros contra eles, não mostram os que são a favor deles. Assim, estão a criar uma opinião muito beligerante em relação a um coletivo. Por outras palavras, estão a tentar doutrinar as suas massas que um coletivo está contra elas, o que não é verdade. Seria verdade se colocassem os erros e os favores que tiveram, ou seja, aqueles que erraram contra vós, mas também aqueles que erraram a vosso favor. Isso seria informação, isso seria objetivo. Mas deixa de ser objetiva quando só coloca os erros contra si. E se só apontam os erros contra vocês a uma massa social de pessoas que vêem a vossa televisão, o que é que estão a fazer? A doutrinar essa massa.
- Considera que estes vídeos da Real Madrid TV afetam ou influenciam de alguma forma o árbitro?
- Não o árbitro, o ambiente sim, o coletivo sim, mas não o árbitro. Não o árbitro, para ele é a mesma coisa apitar contra o Real Madrid ou contra o Barça, e para ele é a mesma coisa, quer façam 20, 30, 40 vídeos. Afeta mais o ambiente do coletivo de árbitros, afeta mais o ambiente contra o coletivo de árbitros do que o próprio jogo. Nunca afetará o jogo em si.
- Por isso, acha que os árbitros precisam de mais apoio da federação, ou que esse apoio deve ser mais visual, mais visível?
- Mas não só da federação, mas também da sociedade, no fundo. Ou seja, eles precisam, sabendo que têm de ser o coletivo mais forte e mais apoiado, e, no final, parece que estão um pouco entregues a si próprios. E bem, hei-de ver, acho que precisam de muito mais apoio para o coletivo de árbitros. Quando um jogador é mais propenso do que os outros, talvez a fazer "pooling", isso pode afetar a perceção do árbitro? Quer dizer, eu pensaria que era penálti, mas neste caso não sei. É por isso que eu sempre disse que o árbitro tem de atuar, não de pensar. Um árbitro que pensa mal, um árbitro que actua bem. Ou seja, que vê a ação e age de acordo com a ação, não de acordo com o jogador, não de acordo com a situação. Quer dizer, é engraçado, mas penso que, em campo, ele é o que menos tem de pensar. Porque se pensarmos bem, que este jogador remata muito... e não, não temos de pensar se ele remata muito ou pouco. Agimos, agimos de acordo com o que vemos em campo. Ou seja, quanto menos pensarmos, melhor. Agimos e depois pensamos.