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Opinião Liga 3: Como o 1.º Dezembro impediu o Fafe de chegar aos lugares de subida

Pedro Clemente fez o golo da vitória do 1.º Dezembro
Pedro Clemente fez o golo da vitória do 1.º DezembroFPF/Flashscore
Nesta rubrica assinada por João Daniel Rico, o treinador propõe-se a analisar um jogo de Liga 3 por semana até ao final da época. Nas palavras do próprio, procura sempre observar os detalhes que realmente fazem a diferença, focando o seu olhar, circunstancial e sem conhecimento do processo “por dentro”, na componente estratégico-tática e na forma como os treinadores agiram durante o jogo.

1.º Dezembro 1-0 Fafe

Em Sintra, 1.º DezembroFafe entraram para a 8.ª jornada da fase de apuramento de campeão da Liga 3, vindos de resultados opostos. Para o Fafe, uma vitória simbolizava a subida ao 2.º lugar (acesso direto à subida de divisão) e para o 1.º Dezembro talvez a última hipótese de, senão pontual, pelo menos animicamente lutar por esse objetivo.

A Liga 3 é pródiga em volte-faces. E no final, a vitória dos da casa deixa-os a apenas 3 pontos do primeiro lugar de acesso direto a algo que, no inicio da época, não passaria de um sonho remoto. 

Estatísticas da partida
Estatísticas da partidaFlashscore

Vamos ao jogo.

Equipas posicionadas nos sistemas táticos habituais. 1.º Dezembro em 5-2-3 e Fafe em 4-3-3 (guarda-redes não entra nesta estrutura numérica para simplificar).

Os sistemas táticos das duas equipas
Os sistemas táticos das duas equipasFlashscore

Ainda assim, posicionamentos no momento sem bola semelhantes, sobretudo pela inclusão do médio mais recuado do Fafe na linha defensiva, formando uma linha de 5 semelhante ao apresentado, de base, pelo adversário.

Na prática, nesse momento do jogo, ambas as equipas pretendiam garantir uma superioridade defensiva evidente na linha mais recuada. 

Já os estilos de pressão foram bem distintos. Equipa da casa a optar por um posicionamento em bloco médio, apenas com o avançado na frente e os extremos preparados para condicionar a bola no corredor. Tornava-se simples, pela ação do médio-defensivo dos visitantes (Filipe Cardoso), utilizar a superioridade numérica e saltar a primeira barreira de pressão - formando linha a 3 ou perdendo no espaço entre setores).

A fase de construção do Fafe
A fase de construção do FafeFlashscore

Era claramente um comportamento tático assumido: estabelecer um bloco coeso e solidário para, após recuperação, explorar as características (físicas e técnicas) de Pedro Clemente.

Já vamos a ele.

Face à pressão alta do adversário, os guerreiros de Sintra tentavam sair curto na fase de reposição desde o guarda-redes, com um dos defesas centrais a subir para a posição de médio, formando um duplo pivô. Mas as tentativas para ligar por dentro não iam surtindo efeito (muitas vezes a bola era perdida) e a segurança era dada por uma ligação mais direta na frente.

A fase de construção do 1.º Dezembro
A fase de construção do 1.º DezembroFlashscore

E que jogo fez o avançado do 1.º Dezembro. Um jogador que “casa” na perfeição com este estilo de jogo e com os espaços que o adversário concede nas costas. É forte, de passada larga, bom controlo de bola no chão ou no ar… procurem-no no pé ou no espaço e na maioria das vezes ele vai lá, ganha e segura para a equipa chegar perto. Ou vai embora sozinho…

Para além disso, fez o golo da vitória numa altura importante do jogo, mesmo no fim da 1.ª parte. É esse, claramente, o momento do jogo.

O prémio de melhor em campo está entregue. Aliás, já estava ao intervalo…

Com bola, Fafe com mais capacidade para ligar entre-linhas mesmo que o adversário as tivesse próximas. Faltou à equipa, essencialmente, melhor definição dos lances. Chegou muitas vezes à área contrária, em condições de finalizar a jogada com mais critério.

O jogo foi, em muitos momentos, algo lento. Quando as estruturas “encaixam” e queres criar desequilíbrios, é fundamental que a bola role mais rápido de pé para pé e tires vantagem de onde a pressão é menor. Os defesas centrais laterais, especialmente quando a linha de 3 está montada, devem progredir com bola para atrair a pressão e encontrar homem livre. João Freitas, do 1.º Dezembro, é forte nessas ações de ligação e foi-se libertando ao longo do jogo. 

Acabou por ser dos jogadores em maior evidência, especialmente no plano defensivo.

Outro comportamento comum das equipas, particularmente a partir da “2.ª fase de construção”, era garantir largura máxima com os laterais e puxar os extremos para dentro em apoio ao avançado.

Entendo que este comportamento, muito comum hoje em dia, pode por vezes ser um pouco “contra natura” para alguns jogadores e, neste jogo, fiquei com a sensação que as características do Diogo Cardoso (1.º Dezembro) para essa função se ajustavam melhor do que as de Picas, extremo Angolano do Fafe que talvez tivesse tirado maior partido da sua técnica e velocidade com mais ações de corredor.

A partir dos 70 minutos começaram as mexidas dos treinadores. Jorge Pinto (Fafe) a perder, juntou 2 avançados e desdobrou a equipa em 4-4-2. Pedro Caneco (1.º Dezembro) viu a expulsão de Afonso Valente complicar-lhes os planos. 

Os últimos minutos jogaram-se em 30 metros, com a equipa da casa montada num 5+4, abdicando de ter uma referência na frente. Pensamento compreensível: a pouco tempo do fim, a ganhar 1-0 e com menos um jogador, não há mais jogo.

Os visitantes tentaram mas não conseguiram materializar o ascendente em golo. Faltou talvez fazer a linha defensiva adversária oscilar mais, com movimentos curtos de profundidade a forçar o arrastamento aos defesas centrais laterais adversários, eliminando a inferioridade numérica na zona central da área. Pediam-se cruzamentos de linha de fundo, em detrimento das muitas ações interiores onde, invariavelmente, o cruzamento encontrava os centrais de frente (tornando a interceção mais fácil).

A fase de ataque do Fafe
A fase de ataque do FafeFlashscore

Em suma, duas equipas com propostas de jogo diferentes, a tentar chegar à vitória utilizando dinâmicas de jogo próprias e treinadores a atuar de acordo com o que o jogo vai ditando. Porque o jogo começa-se a ganhar no treino, mas é no próprio jogo que se efetiva.

Nota: Mais uma jornada nesta fase de apuramento de campeão da Liga 3 onde todas as vitórias foram tangenciais. O equilíbrio é por demais evidente e, a 6 jogos do fim, apenas o 1.º lugar parece já ter dono. Se tal se confirmar faltam duas vagas, uma direta e outra para playoff. 

A análise de João Daniel Rico
A análise de João Daniel RicoFlashscore