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"Deixei os Estados Unidos porque queria jogar futebol profissional"
- Quais as primeiras memórias que a ligam ao futebol?
- Tinha 4 anos quando comecei a jogar com os meninos na minha cidade, Affalterbach. Eles estavam à procura de mais jogadores e todos os meus amigos estavam a jogar, por isso também queria jogar. Só me lembro de jogar com os meninos quase até aos 14 anos. Gostei muito. Pelo meio, quando tinha 12 anos, estive numa equipa de meninas durante dois anos e depois voltei a jogar com os rapazes.

- Mais tarde acaba por ir para os Estados Unidos. Como surgiu essa possibilidade?
- Aos 15 anos falei com a minha mãe sobre isso. Queria ir para os Estados Unidos para jogar, mas sabia que seria difícil entrar no liceu. Na minha equipa (Sindelfingen) houve 3 ou 4 pessoas que foram, e elas contaram-me que tinham ido para lá através de uma agência. Acabei por ir para lá estudar com a minha melhor amiga. Fiquei na mesma universidade durante cinco anos.
- O que estudou?
- Psicologia.
- Difícil?
- O primeiro ano foi muito difícil, estava com vergonha de falar inglês e foi uma experiência completamente nova, fora de casa, mas ela (melhor amiga) ajudou-me muito. Sempre tinha alguém em quem podia confiar.
- Olhando para trás, podemos dizer que foi uma experiência que mudou muito a Paula?
- Sim, acho que estar fora de casa é sempre uma experiência que te faz crescer. Foi a primeira vez longe de casa durante tanto tempo, e foi uma experiência incrível. Também no futebol, encontrei algo muito diferente do futebol da Europa. Estão sempre a correr, é mais físico, aposta-se mais no ginásio. Não tenho dúvidas de que ajudou muito a desenvolver a jogadora que sou hoje.

- Cinco anos depois, a Paula regressa à Europa pela porta de Portugal. Explique-nos como tudo aconteceu.
- Deixei os Estados Unidos porque queria jogar futebol profissional. Foi tudo muito rápido. Numa semana, deixei tudo: as minhas coisas e as minhas amigas. Vim uma semana para Portugal e depois ainda fui a Espanha. Na minha cabeça, pensei: 'Eu não vou voltar aos Estados Unidos.' Mas tenho de lembrar que não vim logo com um contrato. Vim fazer uma prova, não sabia se ia ficar aqui...
- Era a primeira vez em Portugal?
- Foi a primeira vez e gostei, mas foi diferente. Nos Estados Unidos, as universidades têm muito dinheiro, e o apoio às jogadoras é imenso. Aqui, é muito diferente. Mas, no final, era uma equipa (Clube de Albergaria) da primeira liga e era uma boa oportunidade. Não podia voltar atrás na decisão. Ainda fiz um teste em Espanha com o Alavés, gostei muito, mas o Albergaria meteu muita pressão, queria uma resposta rápida, enquanto em Espanha não havia certeza de que fosse ficar.

"Nada está perdido até ao final da época"
- Sentiu algumas dificuldades na adaptação? Qual o balanço que faz deste ano e meio?
- Sim, era uma língua que eu não falava. Sabia um bocadinho de espanhol e isso ajudou, mas foi difícil. Encontrei outra cultura e um futebol muito diferente. Nos primeiros meses, tive dificuldades com isso. Aqui, é mais ficar com a bola, mais jogar com os pés, enquanto nos Estados Unidos era mais bater para a frente e correr. E as pontas de lança são muito mais técnicas, o que torna tudo mais difícil na defesa.
- O que aprendeu sobre o Clube de Albergaria?
- As pessoas do clube querem o melhor para as jogadoras, querem sempre ajudar. É mais como uma família.
- O que mais a impressionou no futebol português?
- Sobretudo esta época, sinto que as jogadoras são muito mais fortes, competitivas e técnicas. Sinto que o futebol está a desenvolver-se. É um futebol diferente, também diferente do futebol na Alemanha ao qual estava habituada.

- Em que pontos evoluiu como jogadora durante esta passagem em Albergaria?
- Acho que aprendi a ter mais força e uma mentalidade vencedora, além de ter melhorado os meus números e as minhas estatísticas. Sinto que melhorei o meu jogo com os pés, esquerdo e direito, e consigo jogar longo ou curto. Aprendi mais sobre o controlo do espaço e a observar o movimento das adversários. Também aprendi mais sobre outras posições.
- Para quem não conhece, o que diz sobre a nossa Liga?
- Digo que é uma liga muito competitiva, especialmente esta época. Acho que as equipas como o Sporting e o Benfica são mais fortes, mas também são as equipas com mais dinheiro. Depois temos uma segunda metade com equipas cada vez mais competitivas, veja-se a recente vitória do Estoril contra o SC Braga, por exemplo.
- Não tem sido um ano fácil para o Clube de Albergaria. Qual o balanço?
- É difícil, mas temos uma boa equipa e estamos juntas. Sabemos que precisamos de fazer melhor, mas não é impossível. Temos mais jogos e nada está perdido até ao final da época.

- O que costuma dizer às pessoas que lhe perguntam sobre o clube?
- Com pouco, tentam fazer muito. Estou cá desde a época passada e posso dizer que está muito melhor do que no ano passado.
- Mudaram recentemente de treinador. Está a gostar?
- Gosto muito da nova equipa técnica. Está a acreditar em todas as jogadoras e na capacidade da nossa equipa. Sentimos a mudança, tanto nos treinos como nos jogos. Acho que jogamos com mais confiança, os treinos são mais intensos e mais objetivos, mais competitivos, há mais trabalho de ginásio...
- Não está arrependida da decisão?
- Não, para mim individualmente tem sido bom. Estou a jogar 90 minutos de forma regular, sou uma das capitãs e já marquei três golos.
- O que podes prometer ate ao final da época?
- Não vamos deixar as coisas até ao final. Queremos que o clube continue na Liga e eu quero dar tudo o que posso. Sei que a equipa está com o mesmo pensamento. Temos de estar positivas.

Paula Ruess num português (quase, quase) perfeito: "Ajuda-me dentro e fora de campo"
- A Paula fez questão de conceder esta entrevista em português. E posso dizer que é um português quase perfeito...
- Esta época é a que estou a aprender mais. Pessoas como a Laura (Luís) e outras ajudam-me muito, pois estão sempre a falar comigo e a escrever mensagens em português. E em janeiro também comecei as aulas de português.
- Como tem sido esse processo?
- Sim, é difícil, mas o alemão também é (risos). Mas também quando vou à Alemanha, dizem que o meu alemão está mau, porque já não estou lá há muito tempo. As minhas colegas gostam quando falo, porque acham engraçado e estão sempre a gozar comigo. Mas é algo que me ajuda dentro e fora de campo.
- Qual foi a primeira palavra que aprendeu em português?
- 'Chato'. Foi logo no primeiro dia (risos).

- O futuro passa por onde? Portugal?
- Sempre quis jogar em Espanha, mas depende das opções que tiver no final da época.
- Se eu fosse um diretor de um clube, o que a Paula me diria para a contratar?
- Sou uma jogadora que já desempenhou várias funções em campo, sou boa no passe longo, tenho boa visão de jogo e sou forte no 1x1. Posso não ser a mais rápida, mas antecipo bem. Sou boa de cabeça – já marquei dois golos. E também sou uma boa colega fora de campo.
- A psicologia ajuda?
- Em situações em que estou nervosa ou ansiosa, consigo aplicar o que aprendi na universidade. E também posso ajudar outras pessoas.

"Estou a tirar o curso de treinadora"
- Falamos muito sobre a evolução do feminino em Portugal e no Mundo. O que tem a dizer sobre esse crescimento?
- Está cada vez mais em evolução. Tenho muitas amigas que estão na Alemanha e estão a jogar frente a 20-25 mil pessoas, na segunda divisão alemã. E ver aqui o Benfica e o Sporting a jogar na Luz é incrível. Há 5-6 anos, isso não era possível. Mas as pessoas têm de perceber que não se pode comparar o futebol masculino com o feminino.
- É verdade também que está a tirar o curso de treinadora?
- Comecei em novembro a tirar a licença UEFA C. Sempre gostei de treinar, nos Estados Unidos estava a treinar uma equipa com jogadoras de 12-14 anos, e gostei muito.
- Tem como objetivo ser treinadora no futuro?
- Ainda não sei, só quero ter todas as possibilidades em aberto e sinto que isso também me ajuda enquanto jogadora.

- Aos 25 anos, quais são ainda os seus objetivos?
- Quero jogar na melhor equipa possível, jogar na Champions, ir à seleção nacional. Sempre foi um sonho. Hoje em dia, as coisas mudam muito rápido. Há jogadoras de 30 anos a serem convocadas pela primeira vez.
- Por falar em seleção, estamos em ano de Europeu. O que espera?
- Acho que vai ser mais competitivo, vamos ver mais talento. Acho que não vai haver tanta diferença entre as equipas.
- E quando deixar de jogar, como gostaria de ser recordada?
- Quero que tenham uma ideia positiva de mim, de alguém que deu sempre importância ao clube e às pessoas que estão dentro dele. E que se lembrem de mim como uma boa defesa.
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