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Análise: Leão de pólvora seca

Gyokeres e Hjulmand, duas das figuras do Sporting
Gyokeres e Hjulmand, duas das figuras do SportingProfimedia
A palavra é muitas vezes usada de forma leviana, mas parece indesmentível neste momento. De principal candidato ao bicampeonato e com o sonho dos oito primeiros da Liga dos Campeões em aberto, o Sporting entrou numa crise de confiança e perdeu quatro vezes consecutivas, pela primeira vez em 12 anos. E a falta de golos muito contribuiu para isso.

No espaço de menos de um mês, o ar de confiança que se respirava em Alvalade desapareceu. A saída de Ruben Amorim, por mais planeada que estivesse, teve um efeito maior do que muitos esperavam. O atual treinador do Manchester United era figura-chave no Sporting, tinha uma ligação única aos jogadores, mas a ausência do técnico não ajuda a explicar tudo.

Após a goleada ao Amarante, na Taça de Portugal, o Sporting de João Pereira somou quatro desaires consecutivos (Santa Clara, Arsenal, Moreirense e Club Brugge). A distância de seis pontos no primeiro lugar pode transformar-se num segundo se o Benfica vencer o Nacional no jogo em falta, e na Liga dos Campeões, os 10 pontos deixados por Amorim podiam fazer sonhar com os oito primeiros, mas esse balão já esvaziou por completo e ficar no topo do quadro do play-off tem de ser o objetivo realista.

Crise é a palavra que mais se ouve no reino do leão e muito disso deve-se à falta de golos e às mudanças na forma da equipa atacar.

Os últimos resultados do Sporting
Os últimos resultados do SportingFlashscore

Pólvora seca

O Sporting era uma das máquinas goleadoras da Europa. À entrada para a pausa internacional de novembro (quando Ruben Amorim saiu), os leões tinham 56 golos marcados em 18 jogos, 39 deles nas 11 jornadas do campeonato. De lá para cá, o Sporting marcou 9 golos, mas seis foram na Taça de Portugal diante do modesto Amarante.

Nos confrontos mais exigentes, os leões marcaram um golo a Arsenal (1-5), Moreirense (2-1) e Club Brugge (2-1), mas ficaram em branco diante do Santa Clara (0-1) - desde 23 de janeiro, na meia-final da Taça da Liga com o SC Braga, que isso não acontecia. O Sporting está a atravessar um período de pólvora seca e isso é demonstrado pela forma como ataca.

Com João Pereira, os leões sentem muitas dificuldades em atacar o espaço interior e chegar às zonas de finalização. Isso ficou provado mais uma vez diante do Club Brugge, quando fizeram apenas dois remates enquadrados com a baliza.

Os remates do Sporting contra o Club Brugge
Os remates do Sporting contra o Club BruggeOpta by Stats Perform, Sporting CP

Gyökeres mais longe da baliza

Pode ajudar a explicar uma nova função de Gyökeres. Um dos avançados mais temíveis do futebol europeu, especialista a atacar os espaços, tem saído cada vez mais de zonas de finalização durante este período.

Utilizado muitas vezes como apoio, onde nem sempre se sente confortável, o sueco não tem aparecido muito onde pode fazer a diferença e quando o tem feito, sofreu com algumas pechas na hora de rematar à baliza (o cabeceamento desperdiçado com o Santa Clara).

O posicionamento de Gyökeres com o Brugge
O posicionamento de Gyökeres com o BruggeOpta by Stats Perform, Sporting CP

Os corredores

À semelhança do que fazia na equipa B, João Pereira procura utilizar um losango no meio-campo. Hjulmand normalmente fica mais recuado, Morita/ Daniel Bragança/ João Simões adiantam-se num vértice mais avançado, com os dois avançados interiores a baixarem ligeiramente. Contudo, ao sentir a dificuldade em furar os blocos que enfrentou, e em desvantagem nos jogos, o novo técnico procura utilizar, talvez em demasia, os corredores.

Contra o Santa Clara bateu o recorde de cruzamentos esta temporada: 40. Em Moreira de Cónegos e na Bélgica voltou a apostar nas bolas para a área de forma a reverter as desvantagens em que se colocou. Contudo, o plantel do Sporting não é favorecido por esta forma de jogar.

A direção dos ataques dos leões
A direção dos ataques dos leõesOpta by Stats Perform, AFP

Viktor Gyökeres não é um cabeceador por excelência – ainda não marcou através de um cabeceamento com a camisola leonina esta época – e os cruzamentos não estão a encontrar gente suficiente. De resto, quando João Pereira lançou Harder, o outro avançado de raiz, para o jogo, o dinamarquês posicionou-se sempre na esquerda, onde essencialmente tirou cruzamentos. Diz-nos a física que se é ele que envia a bola para a área, é impossível ser ele que a vai receber.

O posicionamento de Harder com o Brugge
O posicionamento de Harder com o BruggeOpta by Stats Perform, Sporting CP

Não é o único problema, mas é um fator que ajuda a explicar em grande parte esta crise do Sporting e que João Pereira tem de resolver se quer diminuir o tom da contestação.