Ano 2017. Em vias de trocar de clube no Brasil, Daniel dos Anjos recebe uma proposta surpreendente do Benfica e num movimento relâmpago acaba mesmo por mudar-se para a cidade de Lisboa, para a primeira experiência no Velho Continente.
O avançado brasileiro trabalha com Bruno Lage (Botafogo) e Renato Paiva (Bahia) na equipa das águias, dois treinadores que estão neste momento no Brasileirão, e mereceu uma oportunidade na equipa principal do Benfica, pela mão do icónico Jorge Jesus, antes de um problema cardíaco revelar-se um rude golpe na sua afirmação.
Fechado o capítulo Benfica, Daniel dos Anjos seguiu para Tondela no verão de 2021, onde permanece até aos dias de hoje. Sente-se "em casa" nos beirões e deu disso conta numa entrevista de coração aberto ao Flashscore.

Do Figueirense ao Benfica: "Mudou tudo em 24 horas"
- Bom dia, Daniel. Como começou esta aventura no mundo do futebol?
- Começou quando tinha 10 anos. O meu pai comprou-me umas chuteiras, juntamente com a minha mãe, e começou a deixar-me sonhar. Comecei a lateral-direito, não deu certo e fui para o ataque. Comecei a fazer golos, comecei a gostar mais e mais, a ver mais jogos, e virou paixão.
- O início foi no Figueirense...
- Sim, sim. Comecei no Figueirense, depois passei pelo Flamengo, Atlético Goianiense, Benfica e Tondela.
- Como foi o processo de vinda para Portugal?
- Foi uma mudança muito repentina. Estava para acertar com outro clube brasileiro e houve um contacto entre o meu empresário e um representante do Benfica e ficámos à espera... Mudou tudo em 24 horas. Assim que recebi a notícia da proposta oficial do Benfica, fiquei alegre, mas confuso, porque seria a primeira vez na Europa. Aceitei porque era um sonho jogar na Europa. Aconteceu e passado uma semana vim para Portugal.
- Hoje em dia, com o aumento da competitividade no Brasil, acredita que os jogadores já pensam menos em vir para a Europa?
- Ainda acredito que seja o sonho de muitos vir para a Europa, porque sonham jogar a Liga dos Campeões. A competitividade da Europa é o sonho de todos os jogadores. A Europa é outro mundo.

"Estamos a formar uma equipa muito competitiva"
- O Daniel cumpre a 3.ª época no Tondela. Na época passada fez nove golos, depois de cinco na primeira. Como se sente em Tondela e quais as ambições da equipa para esta temporada?
- Venho em crescendo no clube e este ano tem de ser mais. O nosso grupo? Temos 17 jogadores novos, estamos a formar uma equipa forte e competitiva em todos os setores e isso é o mais importante. Agora, é algo que vai levar o seu tempo, não é de um dia para o outro. Mas vamos estar fortes.
- Objetivo é o regresso à Liga Portugal?
- Sabemos que a segunda liga é competitiva, não posso falar de subida no começo do campeonato, mas o que posso dizer é que vamos lutar pelos três pontos jogo a jogo. Internamente temos objetivos, mas fica entre nós e vamos lutar para os conquistar. Agora, seja num ano ou mais, o Tondela vai regressar à Liga Portugal, porque a Liga 2 não é o lugar do Tondela.

- Na Liga 2 têm adversários com peso no futebol português: Marítimo, Paços e os regressados UD Leiria e Belenenses. É cada vez mais complicado?
- Sim, sim. São equipas com os seus objetivos e isso traz mais competitividade. Não dá para falar agora, mas vamos ver no fim. É jogo a jogo, pelos três pontos e no final vai dar certo.
- As diferenças entre primeira e segunda existem, mas há cada vez mais qualidade na segunda?
- Ano após ano é mais competitiva. Deve-se olhar mais para cá porque há jogadores com muita qualidade. Saem jogadores daqui para a primeira e não sentem diferença. A segunda liga é uma liga com boas equipas e bons jogadores.
- Como se sente em Tondela, num meio pequeno e acolhedor?
- Sinto-me em casa, abraçado por todos. As pessoas nas ruas são bastante recetivas. É um clube acolhedor, sinto-me bem e confortável e posso trabalhar tranquilo sem stress.
- Quais são os objetivos aos 27 anos?
- Estou no meu último ano de contrato e o foco é o Tondela. Se o coletivo fizer uma boa temporada, o individual destaca-se. Esse é o meu objetivo. Ainda não conversamos sobre a renovação, mas o objetivo é o Tondela neste momento.

"Já se via qualidade no Bruno Lage na equipa B do Benfica"
- O Daniel fez um jogo pela equipa principal do Benfica e depois sofreu um problema de saúde (cardíaco). Como recorda essa fase da sua carreira?
- Aprendizagem. Passei por uma fase menos boa na minha carreira, mas sinto-me ainda mais preparado. Sofri bastate, mas a vida tem altos e baixos. Hoje vejo as coisas com tranquilidade. Não me desespero a olhar para aquilo. Tive uma oportunidade única no Benfica, um momento inesquecível. Mas também trabalhei muito para ela.
- Sente que esse percalço influenciou a sua carreira?
- Nunca vamos saber. De certa forma, pode ter atrapalhado um bocado, mas temos outras oportunidades para dar a volta por cima.

- Vamos regressar ao Brasil. O Daniel foi treinado pelo Bruno Lage no Benfica e ele está agora na liderança do Brasileirão (com o Botafogo), depois de assumir um bom trabalho de outro treinador português (Luís Castro). Está surpreendido com o trabalho do Bruno Lage?
- Não. Desde que estava na equipa B, via-se qualidade e passava segurança para os jogadores. Acreditávamos muito no seu trabalho. É um excelente treinador, que conversa com todos e é sincero. Tem a sua qualidade, sempre em busca de evoluir e é isso que está a mostrar no Brasil.
- Muitos treinadores portugueses estão no Brasil, sendo que o Abel Ferreira é o expoente máximo. Surpreende-o?
- Os treinadores portugueses são muito exigentes, estão sempre a estudar para se adaptarem ao futebol moderno. E isso, querendo ou não, reflete-se dentro do campo e explica muito o sucesso deles no Brasil e noutras partes do mundo.
- Mas ainda são olhados com alguma desconfiança. Sente isso?
- É normal. Veem ali um treinador português com um trabalho espetacular e pensam: 'o que ele faz que eu não faço?'. O futebol é muito isso. Mas não importa a nacionalidade, o que importa é a qualidade.

- Enquanto profissional de futebol, está surpreendido com este ataque saudita às grandes estrelas do futebol mundial?
- O dinheiro às vezes não chega. Vamos ver. O futebol saudita está a levar jogadores com muita qualidade, que vão acrescentar a sua qualidade ao campeonato. Todo o mundo vai acompanhar e todos esperamos que seja uma liga competitiva para aumentar a competitividade no mundo do futebol.