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A simpatia e descontração do jovem defesa de sorriso fácil escondem bem o animal competitivo que solta quando entra em campo. Ainda há cerca de um mês, regressou a Alvalade para uma exibição em que (quase) secou Gyokeres (2-2) e trouxe um ponto importante da sua antiga casa para uma equipa que ainda não garantiu a manutenção. Depois de um mau arranque de temporada, Chico Lamba é totalista há 15 jornadas consecutivas, curiosamente durante o melhor período de Vasco Seabra ao leme dos lobos.
O azar já lhe bateu à porta duas vezes. A primeira logo após um dos momentos mais altos da carreira: no dia 22 de outubro de 2022, estreou-se pela equipa principal do Sporting, entrou ao intervalo quando a equipa perdia por 0-1 e acabou por ajudar à vitória por 3-1 sobre o Casa Pia, na época 2022/23. Ia ser aposta de Amorim, mas uma lesão travou-o e só regressou no final de fevereiro do ano seguinte... pelos sub-23. Há duas semanas, foi dispensado dos trabalhos da seleção sub-21 por alegados problemas físicos, no último estágio antes da convocatória para o Europeu, em junho.

Chico, no entanto, não cede, nem muito menos muda a personalidade. Ao fim de três épocas nos sub-23 leoninos, aceitou o convite para assinar pelo Arouca, que não quis arriscar e colocou-lhe uma cláusula de rescisão de 10 milhões de euros. Seguiu o mesmo trajeto do ex-colega Rafael Fernandes (agora no Rangers) e encontrou na vila o lugar certo para crescer, com 22 jogos realizados e um golo marcado.
Nesta entrevista ao Flashscore, abriu o livro para falar sobre a época e objetivos dos arouquenses e a perda do capitão David Simão até final da temporada, o futuro nos sub-21, o seu trajeto de traquinices em Alcochete - que, curiosamente, começou numa escola do Benfica -, a possibilidade de representar a Guiné-Bissau e sobre os muitos nomes em voga na atualidade desportiva, como Ruben Amorim, João Pereira, Quenda, Essugo e muito mais.

"Saída para o Arouca foi uma decisão muito fácil da minha parte"
- Boa tarde Chico, obrigado pela entrevista. Em primeiro lugar, porque é que decidiste aceitar o convite do Arouca?
Boa tarde. Foi uma decisão muito fácil da minha parte, estava no Sporting há 11 anos, estava na equipa B e sentia que precisava de outros desafios e que precisava de sair da minha zona de conforto. No verão passado, surgiu o convite do Arouca através dos meus empresários, apresentaram-me o projeto e fiquei muito agradado com o trabalho que é feito aqui. Tive um colega que jogou aqui (Rafael Fernandes), foi mais fácil de decidir porque é uma equipa que fez um bom campeonato na época passada, por isso foi muito fácil.
- Nesse sentido, sentias que estavas a ficar estagnado ao fim de três épocas no Sporting B e precisavas de um salto competitivo da Liga 3 para a Liga Portugal?
Sim, sentia que era algo que precisava. Estava na minha zona de conforto e não dava muito valor às coisas que tinha. Tinha de sair para acordar, como dizem os mais velhos daqui, e precisava de novos desafios.
- Como foi essa mudança de sair da capital (Lisboa) para vir para a vila de Arouca? Como está a correr essa adaptação?
Está a correr bem! No início cheguei no verão e isto estava cheio de pessoas (risos), então foi fácil. É um sítio muito calmo, gosto de sítios assim, não gosto muito de sair ou passear. Gosto mais de ficar na minha, a treinar, ir para casa descansar, por isso para mim é um sítio perfeito.
- A cláusula de rescisão no teu contrato (10 milhões de euros) é um sinal do valor que o Arouca dá ao teu potencial?
Sim, creio que sim. O Joel (Pinho, diretor desportivo) e o Flávio (Soares, antigo diretor para o futebol, agora no Gil Vicente) reconheceram logo a minha qualidade, porque tinham visto os meus jogos há muito tempo e sentiram que se viesse para aqui, trabalhasse e desse o máximo, as coisas podiam correr bem. Foi com esse objetivo que vim para aqui, para tentar evoluir o meu jogo, crescer, aprender, num sítio e realidade completamente diferentes da que tinha no Sporting.

- No início desta temporada, a equipa teve um arranque lento, normal tendo em conta as muitas mudanças e um treinador novo (Gonzalo Garcia), mas com a chegada do Vasco Seabra regressaste ao onze titular, a equipa melhorou e está em posição relativamente tranquila. O que mudou com a chegada do novo mister?
Na minha opinião, o que aconteceu foi o mister ter apertado connosco nos treinos. Pediu intensidade, competitividade, em tudo no treino, fosse no exercício de passe, ou ataque contra defesa, jogo entre equipas. Aí, a malta entrou num ritmo forte, uma mentalidade diferente de querer ganhar sempre nos treinos e depois isso transportava-se para os jogos. É tudo diferente, vemos o jogo de outra forma e também fomos ganhando mais confiança com os resultados.
"David Simão é muito importante para nós, dentro e fora do balneário"
- Nesse sentido, com o plantel a ganhar novas dinâmicas e a aperfeiçoar-se, acreditas que o regresso à Europa poderá estar para breve?
É sempre difícil, mas nunca se sabe. Neste momento, estamos a ir jogo a jogo e ver o que pode acontecer. Mas prometemos sempre lutar em todos os jogos para tentar ganhar e, se não for esse o caso, conseguir o melhor resultado possível.
- Esta semana a equipa recebeu um duro golpe com a lesão do capitão David Simão - falha o resto da temporada (leia aqui) -, isso pode ser um tónico para se unirem e lutarem em torno de um objetivo pela personalidade que ele é no balneário?
Claro, claro, não há outro caminho. Temos que fazer estes oito jogos pelo nosso capitão, é uma pessoa muito importante para nós dentro e fora de campo. Também para mim tem sido importante, tem-me dado muito na cabeça para melhorar e fazer as coisas. Vamos sentir muito a falta do David.
- Desde que chegaste, qual ou quais foram os jogadores que mais te impressionaram no plantel?
Há jogadores de muita qualidade. Ainda apanhei o Cristo (entretanto transferido para o Al Sadd), o Jason e o David (Simão) também. Sempre ouvi dizer que o David era muito bom, quando tive a oportunidade de treinar com ele notei logo a diferença. Há muita qualidade e (os nomes acima) são diferenciados.

- Foste totalista nos últimos 15 jogos consecutivos, sentes que esse é um bom cartão de visita para o Rui Jorge te ter em conta para o Europeu sub-21?
Nestes últimos jogos tenho crescido muito e aprendido muito com o mister Vasco. Claro que quero estar no Europeu, todos os jogadores da minha idade gostava de lá estar. Agora isso depende do mister (Rui Jorge), tenho de fazer o máximo até ao final da época para o convencer a estar na lista.
"Euro sub-21? Dei o máximo em tudo, não tenho peso na consciência"
- Sentes-te algo frustrado por esta lesão que te retirou deste último estágio?
Sim, sinto-me um pouco (frustrado) porque sempre que tenho uma oportunidade de estar na seleção gosto de lá estar. Pelo ambiente, pela dimensão do momento que é. Queria estar lá a ajudar o grupo nestes dois jogos (derrotas frente à Roménia, 0-1), e Inglaterra, 4-2).
- Ainda assim, fizeste parte do estágio anterior, achas que fizeste o suficiente para convencer o selecionador?
Senti que dei o meu máximo nos treinos, em tudo o que me foi pedido. Não tenho peso na consciência de que poderia ter feito mais ou ter feito algo melhor, mas o futebol é assim.
- Como antevês este próximo Euro-2025, somos candidatos? O jogo inaugural é logo com a França, que pode deixar já uma das duas equipas apertadas...
Somos candidatos em todas as competições, temos que ter a mentalidade de ganhar. O nosso grupo não é fácil, logo com um primeiro jogo contra a França, mas tudo é possível, temos muita qualidade, um bom grupo, vamos para competir e tentar ganhar.

- Vês a França como candidata também?
Sim, eles têm jogadores que atuam nas principais Ligas europeias, nós também. Vai ser um bom jogo.
- Sei que ainda é cedo na tua carreira para falar sobre isto, mas caso não chegue a convocatória para a seleção principal de Portugal, abres a porta à seleção da Guiné-Bissau?
Claro, as minhas portas estão sempre abertas. Nasci na Guiné-Bissau, tenho lá familiares que tenho a certeza adoravam ver-me a jogar lá na seleção, mas ainda estou numa fase de crescimento, de ganhar o meu lugar aqui em Arouca, por isso acredito que com o tempo logo se vê o que pode acontecer.
- Tem havido uma porta mais aberta para outros jogadores representarem a Guiné-Bissau, ainda recentemente o Beto optou por representar o país. Como vês o crescimento da seleção?
O crescimento está a ser normal, está a progredir. Como disseste, há jogadores a entrar, tenho colegas com quem já joguei que foram convocados agora: o Vando Félix, o Gilberto Batista, o Babacar Fati, com quem joguei no Sporting. O caminho é esse, a Guiné-Bissau tem que dar valor aos jovens jogadores que estão aqui na Europa e acreditar como Angola e Cabo Verde tem feito com bons resultados. Continuando a crescer e a fazer bem as coisas, a seleção tem muito potencial para crescer.
"Academica de Alcochete foi a melhor experiência que podia ter tido"
- Queria voltar agora ao teu passado... A tua formação é feita no Sporting, mas curiosamente até começaste no Clube Futebol Benfica (Fofó), como é que surgiu essa mudança?
No início, estudava na escola em Alfornelos e o Fofó não era muito longe da minha escola, houve um dia que perguntei ao meu pai se podia ir lá fazer uns treinos, porque queria começar a jogar. Fui lá, inscrevi-me, comecei a jogar, passados seis meses fui fazer um teste ao Benfica, depois também fui ao Sporting. No Sporting disseram-me logo que era para ficar e foi assim que surgiu a oportunidade.

- Como foi passar a formação em Alcochete?
Foi uma experiência inesquecível, é uma das melhores academias do mundo. Estar lá a conviver com os meus colegas e amigos que tenho ainda hoje, apanhando também jogadores mais velhos como o Rafael Leão, o Nuno Moreira, o Elves Baldé, foi a melhor experiência que alguma vez podia ter tido.
- Há alguma memória especial que guardes?
Tenho muitas, o que me lembro mais é que havia muitos atletas como o Joelson Fernandes, o Nazinho, o Nuno Mendes, o Mateus Fernandes... Andávamos lá sempre na academia a aprontar coisas que muitas vezes nos levavam a problemas (risos). Lembro-me daquilo como uma família grande, estávamos sempre com bom ambiente, sempre juntos e é disso que mais me lembro. Isso é uma das imagens que mais guardo.
- Acabas por ser um caso de sucesso da academia, porque fizeste lá toda a formação e eventualmente fazes a estreia pela equipa principal. Que tal foi esse momento, em Alvalade, com o Casa Pia?
Foi um dia muito especial para mim. Fui convocado, comecei no banco, estava com muita expectativa, simplesmente a ver aquilo, a olhar para a bancada. Na segunda parte, o mister Ruben (Amorim) mandou-me ir aquecer ao intervalo, entrei para a segunda parte. O que mais me ficou na cabeça é que, por causa do barulho no estádio, quando estás lá dentro parece que não ouves nada, parece que os adeptos estão muito distantes.
- Curiosamente, esta época voltaste a Alvalade para enfrentar o Sporting e quase saíam de lá com os três pontos (2-2). Que tal foi essa mudança e quase conseguir ganhar?
Foi um jogo difícil, sabíamos que íamos sofrer, mas também o que tínhamos de fazer, vínhamos de um bom momento. Estávamos confiantes, foi pena porque como jogador de formação do Sporting vais para lá e queres ganhar! (risos) Saímos de lá com um ponto, podíamos ter perdido, como poderíamos ter ganho.
"Saídas de Quenda e Essugo não surpreendem, era uma questão de tempo"
- Estavas a falar do Ruben Amorim, que tal foi trabalhar com ele, agora que é um dos treinadores mais conhecidos no mundo?
Foi uma boa experiência, desde que o mister chegou ao Sporting chamava-me muitas vezes para treinar na equipa A, deu-me oportunidade de estrear na equipa principal, estou muito grato pelo trabalho que fez na equipa principal e pela oportunidade que deu aos miúdos da formação.
- Alguma coisa que destaques na capacidade que teve em impulsionar os jovens?
É a forma dele estar, os miúdos vão lá treinar e faz-te sentir confortável, ele acredita em ti mesmo que as coisas não te estejam a sair bem. Continua a dar oportunidades, chamáva-nos muitas vezes para ir treinar e isso dava-nos confiança com os mais velhos para quando chegasse o momento... Lembro-me de ele dizer que tínhamos de estar prontos para quando chegasse a nossa oportunidade.
- É impossível fugir à atualidade, soube-se que o João Pereira está de saída do Sporting B para orientar uma equipa principal na Turquia (ler a notícia aqui). Passaste algum tempo com ele, como vês esta mudança e como é ele enquanto treinador?
Do que me lembro do mister João, tive oportunidade de treinar com eles quando voltei de lesão e até jogar. Lembro-me das ideias, gostava muito da forma como ele jogava. Acho que vai ser um bom desafio para ele na Turquia, de certeza que vai fazer coisas bonitas. Tem uma boa ideia de jogo, às vezes é preciso sorte e só lhe desejo a maior sorte do mundo.

- Partilhaste balneário com alguns nomes que estão agora a dar cartas, quer no plantel principal do Sporting, como fora do país. Surpreende-te de alguma forma o sucesso que estão a ter e sobretudo estas últimas transferências do Geovany Quenda e do Essugo?
Não me surpreende nada, o Quenda e o Dário são miúdos fantásticos, principalmente estes dois. Acho que estão a mostrar o valor e o futebol deles, quando estás a jogar muito na primeira liga portuguesa e espanhola, é merecido. Têm feito um trabalho fantástico, mesmo antes na formação fizeram excelentes jogos e era uma questão de tempo.
- Mesmo outros nomes com quem jogaste, como o Renato Veiga, o Mateus Fernandes e o Chermiti acabaram por dar o salto para a Premier League. Isso é algo que te dá alento? Tens o sonho de jogar em Inglaterra?
Os meus colegas a darem o salto é sempre bom de ver, fico muito feliz por eles. Claro que também essa ambição de ir para lá jogar contra eles, todos temos o sonho de jogar na Premier League, isso não foge do meu caminho.
- Há alguma mensagem que queiras deixar ou que não tenhas tido oportunidade de dizer?
Queria pedir aos adeptos do Arouca para nos apoiarem agora nesta reta final do campeonato, precisamos sempre deles em casa ou fora. Contamos com eles para estes últimos jogos.