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Hirving "Chucky" Lozano, o craque que não conseguiu ser ídolo

Hirving Lozano como jogador do PSV
Hirving Lozano como jogador do PSVMARCEL VAN DORST / NurPhoto / NurPhoto via AFP

Houve uma época em que o jogador das categorias de base do Pachuca se tornou o principal jogador do México. Se a seleção mexicana quisesse chegar às portas da elite, como procurava há décadas, Chucky era o homem a ser seguido. Mas, como é da praxe na história do futebol do país, a fome de glória apagou-se e acomodou-se com essa idolatria. Neste domingo, faz a sua estreia na MLS nos Estados Unidos.

Quando a estreia do México contra a Alemanha no Mundial-2018 foi confirmada, as câmaras que transmitiam o sorteio focaram o colombiano Juan Carlos Osorio, que era o treinador da seleção mexicana de futebol. Ao ver a sua reação, o país inteiro ficou desagradado: ele tinha um sorriso no rosto.

Depois do acontecimento, os meios de comunicação mexicanos correram para encontrar Osorio, enquanto as redes sociais debatiam - entre memes - se o sorriso do treinador era uma reação irónica à má sorte de El Tri no sorteio. Mas, longe de se deixar levar pelo sentimento de inferioridade da nação, o técnico disse uma frase que entrou para a história do futebol mexicano: "Estou tranquilo. Tenho um plano".

Na época, Osorio foi criticado por quase toda a imprensa desportiva mexicana. Longe de entenderem que o colombiano estava a pensar no Mundial, não compreendiam a sua forma de ver o futebol e, sobretudo, as constantes mudanças que fazia, não só de jogadores, mas também de posições para alguns jogadores.

Mas, longe de ignorar as críticas, Juan Carlos sabia que, embora fossem muito poucas, as hipóteses de vencer os tetracampeões do mundo estavam nos pés de Hirving Lozano, um talento com características raras no país. Para além da sua velocidade, Chucky tinha o drible e, acima de tudo, a loucura de se atrever a jogar em cenários onde outros poderiam tremer aos seus pés.

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Na época, com o PSV, parecia apenas uma questão de tempo até que Chucky desse o salto para uma grande liga europeia e, com o seu talento, o futebol mexicano poderia consolidar o passo definitivo para se tornar um competidor perene.

E se já eram grandes as expectativas sobre o que o México poderia ser a partir dos seus dribles e velocidade com a bola nos pés, a 17 de junho de 2018, Lozano surgia como o novo candidato à idolatria perpétua, longe dos esporádicos momentos de júbilo que o futebol mexicano colecionou ao longo da sua história.

Porque o plano de Osorio assentava num esquema reativo, com um bloco baixo arrumado, mas sempre pronto a sair em contra-ataque, sempre com o ritmo de Lozano, que jogou toda a partida com as pontas dos pés quentes e cheio de fome de glória. O golo de Chucky na vitória do México sobre a Alemanha desencadeou o esperado tsunami emocional, mas também visualizou um futuro glorioso para o antigo jogador do Pachuca.

A seleção mexicana seria eliminada nos oitavos de final - como sempre - contra um Brasil fisicamente superior, que também era muito preciso na área. Passada a depressão de quatro em quatro anos, enquanto se tentava explicar o eterno bloqueio mental daquela fase, os olhos do futebol do país voltaram-se para Lozano, que estava entre os 100 melhores jogadores do mundo numa lista publicada pelo jornal britânico The Guardian.

O salto esperado e a desilusão

Lozano ficaria mais um ano em Eindhoven para acabar de consolidar uma idolatria graças a um título de campeão conquistado, 40 golos marcados, mas sobretudo pelo empenho e pela coragem com que defendeu a camisola. Chucky tinha isso: ousadia e coragem para jogar; e o México estava entusiasmado com a possibilidade de ele ser a bandeira do progresso esperado.

Para surpresa de todos aqueles que lhe pediam para deixar a zona de conforto da Eredivisie, Lozano não só escolheu uma liga de elite, mas um grande desafio naquela que é, sem dúvida, uma das competições mais difíceis de todas. A chegada de Chucky ao Nápoles, que pagou 40 milhões de euros, foi um bálsamo para a competitividade e para a esperança de que, pela primeira vez, o mexicano estivesse a dar prioridade a um grande desafio em vez do conforto.

A decisão de se juntar aos napolitanos e viver no quente sul da Itália, com um jejum de títulos da Série A de mais de três décadas, foi uma jogada corajosa. Lozano não tardou a integrar-se na dinâmica maradoniana de uma cidade fervorosa pela sua equipa e que ficaria para sempre na sua gloriosa história com aquele campeonato, após 33 anos sem o conquistar.

Mas, com o tempo, as exigências vorazes e inatingíveis começaram a afetar o desempenho de Lozano, que começava a flertar com o conforto da MLS, com apenas 27 anos. Ao mesmo tempo, a seleção nacional deixava de ser dele. Como se fosse uma maldição constante e irremediável, Chucky não conseguiu abrir caminho depois do seu golo no Mundial contra a Alemanha e, pouco a pouco, estagnou com a camisola mexicana.

Depois de quatro anos no Nápoles, nos quais se destacou e num sinal claro das suas intenções, Lozano regressou a Eindhoven, para se refugiar na idolatria que tinha forjado, virando as costas aos grandes desafios da primeira ordem. E, pouco tempo depois, foi anunciado como jogador do novo franchise da MLS de San Diego, encerrando assim, para sempre, a ilusão de o ver tornar-se um jogador capaz de marcar uma era.

O início da despedida

Neste domingo, Lozano fará a sua estreia pelo San Diego F.C. no início da 30ª temporada da MLS. Por um dia, os Padres da Major League Baseball darão destaque ao futebol diante de uma comunidade ansiosa para ver Chucky como seu principal rosto. Em tempos de turbulência política, um mexicano vai paralisar uma cidade americana.

Hirving, aos 29 anos, decidiu começar a sua reforma. A sua carreira deixou para sempre na memória coletiva um golo que desencadeou a vitória mais importante do México no Mundial, naquele dia em que Juan Carlos Osorio tinha um plano para vencer a poderosa Alemanha, consciente de que tinha um tipo diferente de jogador com o qual podia abanar o mundo.