"Desfrutei de dois anos e meio magníficos em Birmingham"
- Sem grandes voltas, qual é a razão pela qual deixou o Aston Villa?
Houve consenso entre todas as partes de que, depois de dois anos muito bem-sucedidos, tanto desportiva como economicamente, o passo seguinte que o clube tinha de dar era consolidar-se já na elite. E todos pensámos que, depois de um desgaste importante, possivelmente seriam necessárias caras novas e que eu poderia procurar novos desafios. E, a partir do consenso, da educação, do respeito, acordámos que era o melhor para todos.
- Como viveu pessoalmente em Birmingham? Porque é certamente muito diferente viver lá do que em Sevilha, na Andaluzia.
Sim, evidentemente há algumas diferenças, fundamentalmente climáticas, mas foi uma cidade que me acolheu muito bem e onde desfrutei de dois anos e meio magníficos. Imagino que também tenha a ver com o facto de terem sido anos muito bons a nível desportivo, pelo que o ânimo e tudo é mais positivo. Eu vivia no centro da cidade, em St. Paul's Square, muito perto do centro e relativamente perto de Bodymore, da cidade desportiva. Senti falta, evidentemente, de Espanha, de Sevilha, sobretudo de San Fernando. Mas vivi muito bem. Foi uma cidade que me acolheu muito bem e da qual guardo uma boa recordação.
- Sendo uma pessoa muito conhecida, sentiu a diferença entre viver em Birmingham e viver em Espanha? Digo isto pela privacidade.
Sim, claro, viver em Birmingham, no que diz respeito à privacidade que se perde quando se é uma pessoa pública, é um sítio perfeito, porque, como costumo dizer, em Birmingham pude sair à rua praticamente sem ser reconhecido. À medida que o tempo foi passando, já me reconheciam um pouco mais.
- De certeza que o convidaram para umas pints, aí, nos bares.
Sim, há diferença, evidentemente, entre uma vida e outra. Mas já disse, sou uma pessoa bastante cosmopolita, adapto-me bem a tudo e não sofri essa mudança para além de momentos pontuais, de tentar perceber que a 20 de agosto podem estar 10 graus e não 45. Mas adaptei-me bem, sem qualquer problema.
Um Villa onde o chefe é Unai Emery
- No Aston Villa trabalhou com Unai Emery pela segunda vez, porque antes coincidiu com ele no Sevilha. Como compara essas duas etapas com ele?
Bem, a nível de relação pessoal, praticamente igual. Somos duas pessoas muito exigentes, muito nervosas, muito intensas. A nível profissional, a relação, evidentemente, era um pouco diferente, porque no Sevilha, hierarquicamente, eu estava acima dele. Em Birmingham, ele era o chefe dessa área desportiva. E a nível de maturidade do Unai, por exemplo, encontrei o Unai muito mais maduro a nível tático e técnico. Acho que, como todos, o Unai evoluiu e é um treinador mais completo.
- E viu a diferença de trabalhar na Premier em relação a Espanha, na LaLiga como diretor desportivo, por exemplo, na estrutura de um clube?
Veja, é diferente, uma diferença abismal no modelo do Aston Villa, em que a figura do treinador está no topo da pirâmide, é a pessoa que tem o comando do clube a nível desportivo. Depois, claro, está o proprietário. Isso em Espanha não costuma existir. A figura do diretor desportivo em Inglaterra está muito mais em segundo plano, o que também permite trabalhar com mais tranquilidade. Não se tem uma exposição tão grande como tive no Sevilha ou como tinha na Roma. A relação com os meios de comunicação também é mais distante. Quase não dei entrevistas lá, não há o dia a dia de te chamarem. Tudo é um pouco mais em segundo plano, um pouco mais tranquilo, o que permite ter mais tempo, menos pressão. E, depois, bem, a Premier é um modelo que todos, também a LaLiga, deviam seguir. Aí está o seu sucesso. Portanto, foi uma experiência a nível profissional diferente, mas muito, muito interessante.
- Suponho que foi contactado por mais meios de comunicação de Espanha do que de Inglaterra.
Sim, há mais relação. Mas já disse, soube conviver com isso sem qualquer tipo de problema.
"Houve interesse do Arsenal em Watkins"
- Este verão, não sei se nos pode dizer, falou-se muito de Ollie Watkins e do interesse do Arsenal e do Manchester United. Há alguma coisa ou eram só rumores?
Houve interesse real do Arsenal em Watkins no mercado de janeiro. Neste mercado de verão não houve qualquer oferta formal. Veja, em quase três meses de verão, porque cada vez os mercados começam mais cedo, há rumores, mas não só por Ollie. Também por Morgan Rogers, por Matty Cash, por Konsa, por McGinn, por todos, porque num mercado tão vasto, num plantel com jogadores tão bons e que ainda por cima vêm de duas épocas magníficas, há rumores, mas oferta formal não houve.
- Mencionou Morgan Rogers, um rapaz que foi contratado por pouco dinheiro e agora o seu valor é muito maior. O que viu neste jovem?
Bem, foi um conjunto de coisas. Acho que é uma contratação comum entre a direção desportiva e a equipa técnica. Já tínhamos bons relatórios sobre o Morgan. Coincidimos que jogámos contra eles na Taça de Inglaterra, e o Unai viu-o, tanto antes como durante o jogo. E, bem, achámos que era um perfil, além de ser alguém local, além de ser jovem, um perfil típico do futebolista que triunfa em Inglaterra, que tem condições físicas muito, muito boas, mas também técnicas. Então, víamos um potencial que, sendo sincero, não era tanto como depois veio a ser. Sim, pensávamos que ia ser um jogador, mas a verdade é que a todos nos surpreendeu e, felizmente, de forma positiva.
- E o primeiro treino que viu... wow! Pensou "se calhar enganámo-nos"?
Não, sou muito paciente. Tenho a experiência de ter sido futebolista e sei que há momentos em que é preciso ter calma, porque a adaptação pode ser mais rápida ou menos rápida. Conhecer como o treinador quer que treine ou que trabalhe, o que quer que ponha em campo... Aí é preciso ter paciência, sobretudo se é um jogador em quem estás convencido porque o viste em ação.
Como convencer Rashford e Asensio
- Marcus Rashford, que acompanhou na sua etapa no Aston Villa e conseguiu contratar, e que agora está no Barcelona. Quais foram os pontos-chave para o convencer?
Aí a chave foi o Unai. O Unai, quando teve uma conversa com o Marcus, já lhe disse: "Olha, Marcus, estou seguro de ti. Vamos dar-te a oportunidade de jogar na Premier". Conseguiu transmitir-lhe tudo aquilo que o Marcus precisava de ouvir. E o melhor, que depois se cumpriu, isso é importante. Marcus é um jogador com um nível técnico e físico invejável, de topo.
- Marco Asensio foi a outra grande contratação de inverno. Também gostaria de saber como o convenceu e qual foi a chave do seu sucesso no Villa. Coloca-o em algum topo de contratações que tenha feito?
Bem, o Marco era um caso semelhante ao do Rashford. Também era um jogador que o Unai sempre quis ter, que de facto antes de eu chegar, estiveram muito perto, antes de ele ir para o Paris Saint-Germain. É um perfil de jogador que o Unai gosta muito, esse número 10 que pode jogar entre linhas, que une a equipa, que tem passe interior, que tem golo. E bem, entre todos acho que o convencemos. Para mim é um jogador de um nível muito alto. Não sei em que topo o colocaria, mas sim é dos jogadores com mais qualidade que tive a sorte de ter.
- Monchi, todos sabemos que na Premier há mais dinheiro do que na LaLiga. Como pode comparar esses dois torneios em termos de diferenças de estratégias de captação, de scouting?
Bem, hoje em dia, acho que o futebol inglês evoluiu de forma positiva. Algo que sempre teve é o poder económico, porque a Premier é um campeonato muito seguido em todo o mundo, o que gera muito dinheiro através de diferentes vias: patrocinadores, publicidade, marketing, direitos televisivos. A isso acho que os clubes ingleses estão a acrescentar a estrutura desportiva. Acho que antigamente era algo de que padeciam e mudou hoje com a chegada de novos investidores, sobretudo estrangeiros, americanos, asiáticos, ou no nosso caso, até africanos. A isso juntou-se a criação de infraestruturas a nível de direção desportiva, de tratamento de dados, que permitem que equipas como o Brighton, o Bournemouth, o Brentford, sejam capazes de fazer aquisições de um nível muito alto.
- Sim, isso é muito difícil de fazer em Espanha.
- Não, em Espanha também há boas estruturas, mas falta talvez esse capital ou essa capacidade de investimento.
A sua etapa em Roma: "Faltou um pouco de paciência"
- O que faltou na Roma para transformar este clube no seu projeto para o tornar maior?
Faltou, possivelmente, da minha parte, conhecer melhor a idiossincrasia da Roma, embora às vezes, quando falamos da Roma e de Monchi, vejamos sempre esses dois anos como algo negativo. No primeiro ano (a equipa) ficou em 3.º lugar e jogou as meias-finais da Liga dos Campeões. No segundo ano, quando saí, ficámos em 5.º, pelo que também não correu mal. Em dois mercados tivemos de vender todos os jogadores importantes por necessidade económica. Mas sim, possivelmente, faltou-me conhecer um pouco melhor a idiossincrasia. E acho que à Roma faltou um pouco de paciência, que é algo que habitualmente costuma acontecer em Roma. Só me lembro de coisas boas de Roma, porque foram dois anos magníficos. Foi a minha primeira saída fora de Sevilha e desfrutei muito, sobretudo no primeiro ano. Foi um ano magnífico. Insisto, depois de ter de vender Salah, Rüdiger, Paredes, ou seja, ter de fazer vendas muito importantes, terminar em 3.º lugar e ser semifinalista da Liga dos Campeões, acho que foi um sucesso magnífico.
- E da venda de Salah, que perspetiva tem agora, foi boa ou má?
Era necessária. Quando cheguei lá, o Salah estava praticamente vendido por 33 milhões de euros mais três milhões de bónus. No final foi vendido por 55, mas era algo que já havia um compromisso com o jogador. Ele queria sair e a única coisa que pudemos fazer foi tentar melhorar o preço. É preciso perceber esse momento, a venda de Salah é antes de Dembelé, antes de toda a explosão do mercado futebolístico com vendas loucas. E, bem, insisto, já tinha praticamente um acordo Roma-Liverpool. O que fizemos foi pressionar para conseguir o máximo possível, porque o jogador já tinha claro que queria sair.
- Quebrou o recorde para contratar Patrick Schick. O que viu em Patrick?
Bem, o que ainda faz: jogar bem e marcar golos. É isso que fazem os avançados, não é? É verdade que ali, talvez fosse demasiado jovem, com uma pressão importante, porque foi um jogador com um custo importante. Mas continuo a dizer, acho que o Patrick é um jogador extraordinário e sempre que o Leverkusen joga e marca, vejo o Schick. Assim, já não sei quantos golos. Ou seja, é um jogador que está casado com o golo.
- Acompanha os jogadores que contratou, que têm uma relação?
Sim, gosto sempre de ver o que cada um faz, porque são jogadores a quem acabamos por ganhar carinho.
- Justin Kluivert. Não acha que chegou demasiado cedo à Roma?
Possivelmente é um caso semelhante ao do Patrick ou do Cengiz. Ünder também chegou muito jovem e depois o tempo demonstrou... veja agora no Bournemouth o que está a fazer na Premier, leva uma época magnífica. Jogador com muita qualidade, mas talvez o peso da Roma... Por isso dizia anteriormente que agora conheço melhor a idiossincrasia. Talvez o perfil de contratação pudesse ter sido diferente.
- Mas viu esses pormenores, o que tem agora?
O Justin, um jogador com um remate, com um jogo entre linhas magnífico. No um contra um, é um jogador que está lá, a destacar-se na Premier, num Bournemouth que está a fazer uma época magnífica, que fez épocas magníficas e agora está a ser um jogador importante.
"Daniel Alves foi a contratação perfeita"
- Quem foi o negociador mais duro em toda a sua carreira?
Muitos. Digo sempre que Daniel Levy, possivelmente um dos mais complicados para negociar. O Tottenham sempre foi um clube difícil, mas, em geral, encontra-se gente muito capaz, com muitos argumentos, e são complicados.
- Quais são as três melhores contratações que já fez? Arrisca-se ou não?
A contratação perfeita é a de Daniel Alves. Por tudo o que significou descobrir um jogador praticamente do nada, adaptá-lo, render no teu clube, conquistar títulos e depois vendê-lo por uma mais-valia magnífica. Portanto, acho que o Daniel. Depois, há muitos. Morgan Rogers, para citar um dos últimos, mas também podemos falar de Fabián, de Kanouté, de Gameiro, de Bacca, de Diego Carlos. Ou seja, há muitos onde se pode olhar.
- Há alguma estrela que quase contratou, mas a operação caiu?
Sim, já contei acho que mais do que uma vez o famoso não negócio de Robin van Persie, que era um jogador que tínhamos fechado. Eu estava em Roterdão, de facto, para fechar tudo e nesse impasse, uma potência europeia como o Arsenal meteu-se pelo meio e deixou-nos com a água na boca. E bem, infelizmente, naquele momento não era muito conhecido e o desgosto foi grande, mas não muito. Quando se vê a carreira do Robin, o desgosto é maior. Mas bem, costuma acontecer, não é? Também costumo dizer que uma das contratações que me fez ver que o Sevilha estava a evoluir para grande foi a de Christian Poulsen, porque era um jogador que já estava assinado pelo Milan, e no último momento tirámo-lo nós. E aí dás-te conta de que, olha, algo estamos a fazer bem quando somos capazes de tirar um jogador ao Milan.