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Análise: Do fogo de Bérgamo à solidez da Roma, como mudou o futebol de Gasperini

A nova casa de Gian Piero Gasperini é o Olímpico de Roma
A nova casa de Gian Piero Gasperini é o Olímpico de RomaPAOLO BRUNO / GETTY IMAGES EUROPE / GETTY IMAGES VIA AFP

A Atalanta 2024/25 marcou o dobro dos golos mas sofreu mais, a Roma 2025/26 é mais cautelosa e compacta. Uma comparação entre o fim e o início do ciclo que mostra a metamorfose tática do treinador e o impacto dos seus avançados.

Depois da emocionante aventura em Bérgamo, Gian Piero Gasperini levou o seu método e ideias para a capital. Os números, no entanto, falam de uma abordagem que não coincide exatamente e, portanto, de uma Roma diferente, mais sólida e menos explosiva do que a sua Atalanta.

A Roma 2025/26, após 10 jogos na Serie A, soma 21 pontos, com 10 golos marcados e cinco sofridos, uma média de um golo marcado e meio golo sofrido por jogo, o que vale o segundo lugar na tabela classificativa, empatada com o Inter e o AC Milan. A Atalanta 2024/25, no mesmo papel de outsider de luxo, tinha terminado em terceiro lugar com 74 pontos, 78 golos marcados (mais de dois por jogo) e 37 sofridos (praticamente um por jogo). Números que atestam um futebol mais ofensivo e menos resguardado do que o mais pragmático que se vê agora no Olimpico.

As semelhanças: equilíbrio e identidade tática

As duas equipas partilham alguns traços estruturais que atestam a continuidade da filosofia de Gasperini. Tanto a Roma como a Atalanta marcaram de forma equilibrada entre as duas partes - 50% dos golos na primeira parte e depois 50% na segunda para os giallorossi, 48,7% e 51,3% para os bergamasks - confirmando uma gestão constante do ritmo de jogo.

A situação da Roma no campeonato
A situação da Roma no campeonatoFlashscore

A distribuição territorial dos golos também apresenta semelhanças: a maioria deles surge dentro da grande área (90% Roma, 78,2% Atalanta) e a principal fonte de golos continua a ser a bola corrida (70% Roma, 76,9% Atalanta), com uma incidência semelhante nas bolas paradas.

Interessante também é uma curiosidade tática: tanto a Atalanta de ontem (8,1% de golos sofridos), como a Roma de hoje (20%) não gostam das faltas laterais defensivas, um pormenor marginal mas recorrente no sistema defensivo homem a homem que Gasperini prefere.

As diferenças: solidez vs gestão do risco

A principal fratura entre as duas experiências reside no equilíbrio entre risco e controlo. Como dissemos, a Roma de Gasperini marcou metade dos golos e sofreu metade dos golos da sua última Atalanta: menos produção ofensiva, mas também uma estrutura defensiva mais impermeável.

Os métodos de vulnerabilidade, no entanto, são diferentes: a Roma sofre 40% dos golos de fora da área (contra apenas 10,8% da Atalanta), mas muito menos dentro da área. É o sinal de uma equipa que defende mais baixo, com blocos compactos, renunciando por vezes à constante pressão alta típica do Dea.

O momento de fragilidade também mudou: enquanto a Atalanta sofreu especialmente no primeiro quarto da segunda parte (46'-60'), com 37,8% dos golos sofridos, a Roma tende a vacilar no início dos jogos, com 40% dos golos sofridos nos primeiros 15 minutos de jogo.

Fim de um ciclo, início de outro

A comparação entre as duas equipas deve, no entanto, ser lida também numa perspetiva temporal: estamos a falar da última Atalanta de Gasperini e da sua primeira Roma. Estamos, portanto, a comparar um ciclo maduro com outro que acaba de começar. Neste sentido, as figuras da Atalanta podem representar uma possível projeção do que a Roma poderá vir a ser dentro de algum tempo, quando os mecanismos e automatismos tiverem sido assimilados.

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O que já está evidente é a solidez: se os giallorossi mantiverem essa compactação e os grandes favoritos - Nápoles e Inter sobretudo - sofrerem quedas de tensão, a Roma poderá refazer o mesmo caminho da La Dea, transformando-se de revelação em real candidata ao Scudetto. Especialmente se os reforços que Gasp já pediu no verão chegarem em janeiro.

Dovbyk e Retegui: dois pontas de lança, duas filosofias

Passemos agora do geral para o particular, detendo-nos na comparação entre os números dos dois pontas de lança, que esclarece até que ponto a abordagem tática afecta a eficácia ofensiva. Mateo Retegui, na última época com a Atalanta, foi o fulcro do ataque com 25 golos em 38 jogos. Com ele em campo, a equipa venceu 61% das vezes, marcando 2,1 golos em média e somando 2 pontos por jogo.

Na Roma, Artem Dovbyk marcou até agora 2 golos em 10 jogos, mas a sua presença coincidiu com 7 vitórias em 9 jogos (77,8%), com uma média de 2,3 pontos: menos incisivo na frente da baliza, mas central no equilíbrio e na construção da manobra.

Dovbyk participou mais na ação, enquanto Retegui finalizou mais? Sim, mas não só. Na verdade, estas são duas interpretações do ponta de lança de Gasperini que refletem mais a evolução do treinador do que uma escolha dos jogadores em questão. Se em Bérgamo o número 9 era o ponta de lança de um sistema que produzia em massa, na Roma tornou-se o primeiro defesa e o pivot sobre o qual gira a fase ofensiva mais controlada.

Os dois centroavantes em comparação
Os dois centroavantes em comparaçãoFlashscore

Conclusão: uma metamorfose tática

A metamorfose que emerge dos números é clara. Gasperini não se negou, mas adaptou o seu futebol ao ambiente, ao momento e, claro, ao material técnico. A Roma é - pelo menos até agora - uma versão mais reflexiva da sua Atalanta: menos golos, mais equilíbrio, uma fase defensiva mais bem calibrada e um ponta de lança chamado a ser mais uma cola do que um finalizador.

Resta saber se esta fórmula, que hoje garante solidez, será capaz de reencontrar o ímpeto ofensivo que fez de La Dea uma máquina de golos temida em toda a Europa. Menos fogo, mais cálculo: em suma, a Roma de Gasperini parece ter sido construída para não sofrer golos, mesmo à custa de marcar menos.

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