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Brasileirão começa com cenário permanente de gigantes endividados

Dívida milionária não impediu o Corinthians de fazer um grande investimento em Memphis Depay
Dívida milionária não impediu o Corinthians de fazer um grande investimento em Memphis DepayRodrigo Coca - Corinthians

Uma situação imoral tornou-se comum no futebol brasileiro, depois de anos de reincidência e pouca atitude de autoridades e responsáveis para que uma solução definitiva aparecesse.

Dever dinheiro a técnicos, jogadores, clubes, empresários e até fornecedores é uma realidade de muitos clubes brasileiros - dos grandes aos pequenos -, situação que não impede contratações milionárias, mesmo com dívidas dos mais diferentes patamares.

Em 2025, o cenário seguirá de débitos por parte dos principais candidatos ao título, que não pensam duas vezes antes de meter a mão no bolso para, ao lado dos parceiros, fazerem contratações milionárias para jogar lá no alto a esperança dos seus adeptos, pensando em conquistar o título de um dos torneios mais competitivos do planeta. 

Quem vê os devido pagamentos combinados ficarem pelo caminho revolta-se, ao mesmo tempo em que precisa de lidar com dívidas constantes e a cara de pau de quem, na teoria, tem todas as condições para evitar calotes que são empurrados até onde for possível. 

"Sem dúvida, a falta de carácter de muitos personagens do futebol brasileiro é o que mais me incomoda. Muitos dizem uma coisa na sua frente, viram as costas e mudam de opinião. A inadimplência é um grande problema, principalmente quando se tem uma grande estrutura por trás.  Clubes grandes devem-me dinheiro há 6 ou 7 anos, empurrando valores de salários e transferências, que viram ações judiciais. Recentemente, ajuizei uma ação contra o Botafogo por causa de uma dívida de R$ 10 mil. Isso incomoda-me, mostra uma grande falta de respeito. Essas questões contratuais expõem o pior lado da sociedade brasileira, de querer ser malandro para enganar o outro. Não sei como convivem com isso. A ingratidão também é um ponto muito negativo", afirma o agente Marcelo Robalinho, em entrevista exclusiva ao Flashscore. 

Para se ter uma noção de como tal cenário vem de longa data, Robalinho lembrou a situação envolvendo o ex-médio Jadson, que foi seu agenciado por um longo período.

"Quando eu era agente do Jadson, o Corinthians pediu mais tempo para pagar a rescisão. O prazo foi dado e nenhuma parcela foi paga até acionarmos a justiça. O clube está preocupado no que vai fazê-lo ganhar o próximo jogo. Um diretor de clube já me sugeriu entrar com ação porque ela seria a única forma de receber os valores pendentes", conta. 

Sujo fala do mal lavado

No início de fevereiro, o Internacional manifestou-se sobre o não acerto do médio Thiago Maia com o Santos, lamentando a postura de outras partes envolvidas no acordo, que também precisava do Flamengo para que a transferência fosse confirmada. O Inter garantiu que cumpriu todas as suas obrigações, ao contrário de outros lados do negócio.

Horas depois, o Flamengo manifestou-se para expôr a dívida do Colorado com o Rubro-Negro, débito este que seria pago pelo Santos aos cariocas. O Fla, no entanto, não aceitou as garantias do Peixe, com o negócio a cair. 

Este é apenas um exemplo de uma cena corriqueira do futebol brasileiro, com raríssimas exceções de instituições que cumprem a sua palavra após acordos serem fechados.

Pequenos sofrem ainda mais

Os clubes menores veem tal realidade afetá-los de uma maneira mais incómoda, uma vez que não possuem o tamanho, o peso da camisola, o investimento, os valores por direitos de transmissão e a força de patrocínios dos gigantes concorrentes. 

No início de março, foi a vez do presidente do Cuiabá, Cristiano Dresch, revoltar-se com valores não destinados ao Dourado, como 3 milhões de euros do Corinthians em negócio envolvendo o médio Raniele, 1,77 milhões do Santos pelo defesa Joaquim e outros 650 mil euros do Atlético-MG pelo avançado Deyverson, somando um total de quase 5,5 milhões de euros.

"Espero que a Comissão Nacional de Resolução de Disputas (CNRD) tome uma atitude que favoreça quem precisa do dinheiro e não quem usa de financiamento em cima de dívida para seguir aumentando este grande buraco. Não dá para aceitar pagamentos sem juros, permitindo que estes clubes sigam gastando sem limite. Não podemos ser financiadores de calote", protestou o mandatário, que viu a sua equipa cair para a Série B em 2024, em entrevista à Rádio Bandeirantes. 

O Flashscore fez um contato com a CBF para ter uma posição da CNRD sobre o assunto, aguardando uma posição da entidade que rege o futebol brasileiro. 

Alternativa em cenário sem solução

Dresch usou a imprensa como uma forma desesperada de ver, pelo menos parte da dívida, ser liquidada.

"Não é legal expor mas, se não tivermos coragem, a situação não vai melhorar. Quando é um assunto relacionado à FIFA, você fica devendo e, em pouco tempo, é aplicado um transfer ban, você fica impedido de registar atletas. Não existe esta história de plano de pagamento, ou você paga ou não paga. A CNRD está a ser benevolente com quem deve, permitem um tratamento diferenciado para quem não deveria ter. Tudo isso influencia no fomento do futebol brasileiro. O Cuiabá compra jogadores de pequenos clubes, a cadeia precisa funcionar. Nós não vendemos jogadores para Chelsea, o Corinthians sim. Eles precisam nos pagar para que possamos contratar jogadores de clubes menores. A vida dos espertos é curta", protesta. 

A meio do ano passado, foi divulgado o Relatório Convocados, elaborado pela Consultoria Convocados, em parceria com a Galapagos Capital e a Outfield. O documento foi divulgado pela Revista Exame e mostrou a situação dos principais clubes do país há menos de um ano. 

O cenário atual é certamente parecido, com alguns anos a serem necessários para que os maiores gigantes do futebol brasileiro possam ter o nome limpo, situação que tem tudo para perdurar por um longo período.

Veja as maiores dívidas do Brasil

Corinthians: €306,01 milhões

Botafogo: €210,20 milhões

Atlético-MG: €161,25 milhões

São Paulo: €138,30 milhões

Cruzeiro: €131,03 milhões

Fluminense: €118,92 milhões

RB Bragantino: €112,45 milhões

Vasco: €112,45 milhões

Internacional: €105,02 milhões

Santos: €88,54 milhões

Palmeiras: €75,29 milhões

Grêmio: €71,25 milhões

Flamengo: €63,17 milhões

Bahia: €59,13 milhões

Fortaleza: €10,83 milhões