CAN-2025: Seleção do Sudão quer dar ao seu povo um alívio da guerra

A seleção do Sudão na primeira jornada.
A seleção do Sudão na primeira jornada.ČTK/MANTEY STEPHANE

Do medo dos combates à pressão do jogo, Mohamed Al Nour, o guarda-redes da seleção sudanesa, deixou para trás o “terror” da guerra no Sudão com a missão de reconfortar um povo ferido durante a Taça das Nações Africanas (CAN) em Marrocos.

Quando o conflito sangrento entre o exército regular e os paramilitares das Forças de Apoio Rápido (FSR) irrompeu em abril de 2023, num contexto de luta pelo poder, o guarda-redes viu-se obrigado a pôr o futebol em pausa.

“Vivemos o terror”, confessa com discrição à AFP o futebolista de 25 anos, que joga no Al Merreikh, um dos dois maiores clubes do Sudão. O seu irmão, afirma, esteve detido durante quase nove meses pelas FSR.

A guerra provocou dezenas de milhares de mortos, deslocou cerca de 12 milhões de pessoas e gerou, segundo a ONU, a pior crise humanitária do mundo, enquanto ambos os lados são acusados de graves atrocidades.

Mohamed Al Nour espera que a sua equipa, que se qualificou para os oitavos de final, vá “o mais longe possível” na CAN para “dar alegria ao povo” sudanês, marcado pelo colapso do sistema de saúde, pela destruição das infraestruturas e pela fome em algumas regiões do país.

Derrotado na estreia pela Argélia (3-0), o Sudão surpreendeu ao vencer a Guiné Equatorial (1-0), em Casablanca.

Esta é a segunda vitória do Sudão em 18 jogos e seis fases finais da Taça das Nações Africanas, competição que o país conquistou em 1970, noutra era. Os sudaneses terminam a fase de grupos na quarta-feira frente ao Burquina Faso.

“Rezar pela paz”

Desde o início da guerra, o campeonato nacional está suspenso, obrigando o clube de Mohamed Al Nour e o seu grande rival Al-Hilal a exilarem-se, primeiro na Mauritânia e depois no Ruanda.

Em 2025, as duas equipas disputaram, no entanto, um mini-torneio local para manterem a elegibilidade nas competições continentais, segundo a Federação Sudanesa, que anunciou o regresso do campeonato em janeiro nas zonas consideradas seguras do país.

Tentámos aproveitar cada jogo para nos prepararmos e criar uma verdadeira união dentro do grupo, para formar um coletivo”, explica o médio Ammar Taifour, jogador do Al Merreikh quando a guerra começou. Até ao momento, os esforços internacionais para instaurar uma trégua no conflito não tiveram sucesso.

Após a vitória frente à Guiné Equatorial em Marrocos, “foi realmente fantástico ver a reação” dos sudaneses, quer tenham assistido ao jogo no estádio, quer tenham enviado mensagens do estrangeiro, congratula-se o jogador americano-sudanês de 28 anos, esperando que os resultados dos Crocodilos do Nilo, um dos seus apelidos, possam “afastá-los da guerra” por um momento.

Para ele, o dia 15 de abril de 2023 ficará para sempre na memória: “Estávamos num estágio com o Al Merreikh em Cartum. Lembro-me da surpresa, do choque provocado pelos primeiros tiros (...). Foi muito surpreendente. Ninguém estava à espera”.

Depois, nos dias seguintes, os cortes de eletricidade, os disparos constantes (...). Não sabíamos o que se passava, era uma grande confusão”, acrescenta o futebolista que agora joga no Club Sportif Sfaxien, na Tunísia.

Mais de dois anos depois, a guerra, marcada por execuções, saques e violações, continua. Após a tomada de El-Facher em outubro, último bastião do exército na vasta província do Darfur, no oeste do país, as FSR concentraram as operações na região vizinha do Cordofão.

Rezo apenas pela paz e para que todos os que estão nesta situação fiquem em segurança e consigam ultrapassá-la”, suspira Ammar Taifour.