Marcelo Cipriano é uma figura querida no Tirsense, onde fez parte de uma das melhores equipas da história do clube, ao fazer 19 golos em 1994/95, que ajudaram ao oitavo lugar na primeira divisão. Seguiu-se uma curta passagem pelo Benfica, onde deixou marca, com 13 tentos de águia ao peito.
Em Portugal desde os 12 anos, começou no Beira-Mar, ganhou uma ligação especial à Académica e foi ainda ídolo com as camisolas de Sheffield United e Birmingham City. Em conversa com o Flashscore abordou a carreira, o duelo da meia-final da Taça de Portugal e a ligação ao futebol.
- Tirsense e Benfica vão defrontar-se na meia-final da Taça de Portugal. Vai ser um jogo muito marcante para ti, porque são duas equipas que te marcaram muito…
- Sem dúvida. No caso do Benfica foi o apogeu da minha carreira, o momento mais alto, e aconteceu graças às duas épocas que fiz no Tirsense. São dois clubes que me dizem muito, além da Académica, onde comecei e terminei a minha carreira.
- O Tirsense é marcante sobretudo na primeira época em que conquistam o título da Segunda Divisão de Honra e tu marcas 10 golos e depois fazes uma época fantástica na primeira, com um oitavo lugar. Marcas 19 golos e ter permite saltar para o Benfica. O que te marcou mais?
- Foram dois anos fabulosos na minha vida, não só a nível profissional, como a nível pessoal. No primeiro ano formámos um grupo muito forte, de grandes homens, orientado por um grande treinador. Éramos uma família forte, estivemos 21 jogos seguidos sem perder, a quatro ou cinco jornadas já tínhamos subido. Foi a base da época seguinte. Na primeira divisão manteve-se o grupo que tinha sido campeão, com mais três ou quatro jogadores que vieram dar classe como o Giovanella, Hugo Porfírio, o guarda-redes Goran Cumic. Tínhamos jogadores de muita qualidade. Fizemos uma época fantástica, passámos quase metade do campeonato nos primeiros quatro, cinco lugares. Fu fazendo golos, com boas exibições, mas fruto do trabalho da equipa”
- O Tirsense está a fazer uma campanha histórica na Taça de Portugal. Como vês o percurso que dificilmente preconizávamos que ia levar às meias-finais
- É histórico. É claro eles tiveram sorte no sorteio, apanharam equipas do mesmo campeonato e isso proporcionou a meia-final, mas não tira o mérito de todo o grupo e do clube. Vão viver dois dias fantásticos, memoráveis e eu vou estar presente para poder desfrutar.
- Vais estar dividido?
- Acho que o Tirsense já fez o seu caminho, sendo dois jogos é uma missão quase impossível. O Benfica com alguma facilidade chegará à final. Mas não tira o mérito ao Tirsense e a magia deste caminho, deste percurso e de jogar dois jogos contra um grande clube europeu.
- O Benfica é o atual segundo classificado da Liga. Como vês o momento atual?
- O Benfica melhorou, sem dúvida, com a entrada do Bruno Lage. Houve ali momentos em que as coisas não saíram tão bem, mas fizeram um percurso muito positivo na Liga dos Campeões, está na luta pelo campeonato, que vai ser até à última jornada, e tem grande hipóteses de ganhar a Taça de Portugal. Está a ser positivo.
- O futebol português mudou muito desde a tua altura como jogador. O que destacas, sobretudo em termos de ponta-de-lança.
- O futebol está a mudar, cada geração é diferente, mudou tudo muito. Agora não é igual há 25 anos. É muito mais intenso, menos espaço, é preciso pensar mais rápido. Nos anos 1990 corria-se mais e havia uma exigência física maior. Agora são superatletas, há os cuidados que ajudam muito na performance e isso faz com que se tenha tornado num desporto diferente. Relativamente aos pontas-de-lança, eu notei nos anos que joguei em Inglaterra, a diferença no trabalho específico para esta posição. Lá exigiam que o ponta-de-lança rematasse à baliza, havia treino específico. Era tudo mais exigente do que em Portugal. Isso fez com que o futebol inglês tivesse mais golos, pontas-de-lança com grandes capacidades. Neste momento, não têm aparecido grandes pontas-de-lanças portugueses, falamos do Ronaldo que é uma máquina de fazer golos, mas não é um nove puro. Um Rui Águas, o próprio Domingos Paciências, jogadores assim não têm aparecido. Achei que o Gonçalo Ramos ia atingir um nível excelência mundial, mas fruto de lesões tem tido dificuldades.
- Passaste por Inglaterra, onde marcaste grandes golos. O que te lembras mais?
- O futebol onde mais me senti realizado foi o inglês. Foram cinco anos e meio de grande prazer. Desfrutei muito do que era ser profissional, jogava sempre com estádios cheios, estive em finais de taças (com o Birmingham contra o Liverpool e perdemos nos penáltis), momentos inesquecíveis. O que mais reparei, em termos de diferença, é no respeito pelo profissional. Jogar bem ou mal há sempre respeito no final do jogo. Não me lembro de uma manifestação negativa comigo. É verdade que marquei muitos golos, fui ídolo no Birmingham e Sheffield, mas essa maneira de tratar o profissional com carinho foi o que mais marcou.
- Tirsense e Benfica são os dois grandes amores, mas há uma que te marcou com certeza, o clube onde terminaste a carreira: A Académica.
- Fiz a formação no Beira-Mar, quando vi do Brasil com 12 anos. Na altura da universidade fui estudar para Coimbra e conciliei a engenharia civil com futebol. Estive três anos na Académica e houve uma altura que decidi apostar mais no futebol, sem descurar o curso, fazendo algumas cadeiras. Sempre mantive essa ligação forte â Académica e com intenções de acabar o curso no final da carreira. Acabei a carreira na Académica e o curso um ano depois. Sinto-me muito orgulhoso por esse trajeto, tanto a nível profissional, mas em termos académicos.

- Não seguiste engenharia, não deste continuidade como treinador, mas sim como empresário. É um dos sócios da MC Striker. Tens muitos jogadores jovens na tua carteira.
Sou agente há 20 anos, e quando tive a ideia de fundar a MC Striker foi para me realizar como pessoa, colocar o meu cunho pessoal em jogadores jovens. Apanhar jogadores com 14,15 anos e conseguir levar às primeiras equipas… sempre foi a nossa ideia. Conseguimos isso com o Fábio Vieira e o João Mário. Neste momento temos o Rodrigo Gomes no Wolverhampton, temos uma parceria com a Pro Eleven com o David Carmo, e temos outros jogadores a surgir como é o caso do Miguel Alves, o Miguel Luís. É algo que me realiza também, o facto de poder ajudar, jogadores que conhecemos com 14, 15, 16 anos e ajudar a chegar a um patamar elevado nas carreiras.
- Como gestor de carreira, que conselho darias aos jovens?
É preciso ter muita paixão. É a melhor profissão que há no mundo, mas não é a mais fácil, exige muito sacrifício, momentos muito complicados, mas é incrível. É por isso que sendo engenheiro civil, acabando o curso, decidi continuar ligado ao futebol. Quem jogou futebol a um bom nível sabe que é difícil largar essa paixão que temos. O que aconselho é dedicar ao máximo, desfrutar quando está nos treinos, é preciso essa paixão de querer treinar ou melhorar, mas temos o caso do Ronaldo, com o profissionalismo mais elevado de sempre, a ambição mais elevada de sempre, não tenho dúvida nenhuma. Os atletas portugueses têm de o ter como modelo número um nas carreiras.