50 anos do 25 de Abril: Sporting entrou na democracia em sobressalto a partir da RDA

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50 anos do 25 de Abril: Sporting entrou na democracia em sobressalto a partir da RDA
Sporting teve viagem atribulada desde a Alemanha
Sporting teve viagem atribulada desde a AlemanhaSporting
Um atribulado regresso a partir da então Alemanha Oriental (RDA), onde tinha sido afastado na véspera pelo Magdeburgo da meia-final da Taça das Taças de futebol, proporcionou “horas tensas” ao Sporting em pleno 25 de Abril de 1974.

“Foi uma viagem muito complicada. Já vínhamos de uma situação desportiva violenta e, depois disso, tivemos horas terríveis”, descreveu à agência Lusa o ex-defesa e treinador Carlos Pereira, de 75 anos, titular nas duas mãos da eliminatória frente aos alemães.

Um golo de Marinho foi escasso para inverter os tentos de Jürgen Pommerenke e Jürgen Sparwasser e evitar a derrota leonina perante o Magdeburgo (2-1), que, duas semanas antes, tinha visto Carlos Manaca a anular o autogolo de Carlos Pereira em Lisboa (1-1).

“O resultado aqui pecou por escasso, porque tivemos um domínio bastante acentuado. O Dinis falhou um penálti e eu fiz um golo na própria baliza, mas podíamos ter levado uma margem muito confortável para a RDA. Yazalde e Dinis, duas peças importantíssimas no ataque, magoaram-se antes da segunda mão e, mesmo a terminar, o Marinho cruzou na direita. O Fernando Tomé ia encostar para o golo, mas o campo estava cheio de altos e baixos e a bola desviou na lama, bateu-lhe na canela e saiu junto ao poste”, enquadrou.

Se os alemães derrotariam os italianos do AC Milan na final da Taça dos Vencedores das Taças (2-0), o Sporting falhava a reedição do inédito êxito selado 10 anos antes e digeriu esse “grande infortúnio” no regresso, juntando peripécias durante quase 3.000 quilómetros e 50 horas.

Horas depois de a Rádio Renascença emitir a senha musical “Grândola, Vila Morena”, de José Afonso, revelando o início das operações militares para a queda do Estado Novo, a comitiva leonina acordou de madrugada e foi de autocarro até ao posto fronteiriço com Berlim Ocidental, um enclave da República Federal Alemã (RFA) situado em plena RDA.

A equipa de Mário Lino estava no muro de Berlim quando soube do golpe de Estado pelo seu intérprete e, depois, por João Rocha, então presidente do Sporting, mas “não deu a devida importância” aos relatos, até porque “vinha bastante molestada com o resultado”.

Superadas as dificuldades burocráticas para saírem da RDA - onde tinham chegado pela “fronteira mais longínqua”, pernoitando num hotel “sem alimentação e quartos adequados para uma equipa profissional” -, os leões voaram para Frankfurt e foram surpreendidos pelo encerramento do espaço aéreo português, que impediria o regresso direto a Lisboa.

“Voámos inesperadamente para Madrid. Quando chegámos, alguns funcionários da TAP relataram-nos em pormenor o que se passava em Portugal, mas numa dimensão em que haveria canhões, tiros e uma série de peripécias. Ficámos muito assustados, porque não tínhamos telemóveis - que não eram o instrumento mais prático - nem conseguimos falar com as nossas famílias. Entrámos ali num clima de algum terror”, contou Carlos Pereira.

A viagem seria reatada por estrada até à fronteira luso-espanhola do Caia, entre Elvas e Badajoz, onde o Sporting só conseguiu passar mediante ordens superiores no dia 26, na sequência de mais uma noite agitada e de um contacto telefónico fulcral de João Rocha com o general António de Spínola, recém-nomeado líder da Junta de Salvação Nacional.

“Nós estávamos cansados e esfomeados. Como os hotéis e residenciais de Badajoz não davam vazão para tanta gente, alguns dormiram nos poucos quartos disponíveis e outros em escadas. Entretanto, avançámos para a fronteira. Estava uma fila de carros enorme e a imprensa de diversos países para fazer o relato do que se passava em Portugal”, referiu.

Aliviados com a reentrada no país, os futuros campeões nacionais e vencedores da Taça de Portugal em 1973/74 perceberam que os rumores de violência nas ruas escutados na RDA eram excessivos, mas admitiam que “algo tinha mudado” com a queda da ditadura.