Nem os próprios compatriotas de Diego Maradona e Lionel Messi compreendem totalmente o funcionamento do seu futebol, ponto de encontro de um país polarizado e com graves problemas económicos.
E quem os pode censurar, se de uma semana para a outra os seus clubes podem passar de disputar o torneio semestral (equivalente a uma liga) para a Taça ou a Supertaça, e depois, talvez, para a outra Supertaça... Sim, existem duas Supertaças.
"Ninguém percebe isto, está sempre a mudar. A única lógica é a construção de poder dos dirigentes", afirma à AFP o jornalista Andrés Burgo, autor de vários livros sobre o futebol na Argentina.
A alteração mais recente apanhou de surpresa uma população já habituada às ideias dos seus dirigentes, que justificaram as mudanças com estratégias comerciais e desportivas para aumentar a venda de jogadores.
Na quinta-feira, a AFA declarou o Rosario Central de Ángel Di María campeão de Liga. O clube foi distinguido por ter somado mais pontos na classificação geral, que agrega as pontuações das duas competições semestrais.
A decisão não estava prevista no regulamento e motivou um protesto do Estudiantes, adversário do Canalla no passado domingo nos oitavos de final de um dos muitos torneios, o Clausura. Os jogadores do Pincha, que eliminaram o adversário por 1-0, viraram costas aos rivais no tradicional corredor de homenagem ao campeão.
Labirintos do futebol "Frankenstein"
Depois de receber o troféu na semana passada, o presidente do Central, Gonzalo Belloso, considerou que a proliferação de competições se deve à existência de um futebol "muito solidário", que oferece oportunidades tanto a clubes grandes como pequenos.
Com a criação do reconhecimento ao Campeão de Liga, o futebol argentino irá atribuir pelo menos oito títulos em 2026, ano em que a Albiceleste de Messi defenderá o título no Mundial da América do Norte.
Ao campeão da Liga juntam-se o Apertura, o Clausura, a Taça Argentina, a Supertaça Internacional, a Supertaça Argentina, o Troféu de Campeões e a Supertaça de Campeões.
"Por agora, sim", ironiza Burgo.
A criação da Supertaça foi anunciada no mesmo dia em que o Central conquistou o inesperado título, o primeiro de Di María desde o seu regresso ao país em maio.

Quem a vai disputar? Os vencedores da Taça Argentina, da Supertaça Argentina e da Supertaça Internacional.
Mas quem joga a Taça e as Supertaças?
No caso da Taça, não há segredo, pois segue o formato global: os 30 clubes da primeira divisão, um número bem diferente dos 18 ou 20 das principais ligas do mundo, e equipas de outras divisões.
É com as Supertaças que começam os labirintos do que alguns apelidam de futebol "Frankenstein".
A Supertaça Argentina implica, num jogo único, os campeões da Taça e do Troféu de Campeões, enquanto a Internacional opõe o clube com mais pontos na tabela anual, agora designado Campeão de Liga, ao vencedor do Troféu de Campeões.
Críticas ao nível
Como se conquista o Troféu de Campeões? Vencendo o Apertura ou o Clausura e depois triunfando numa final frente ao vencedor do outro torneio semestral.
O sistema de duas competições semestrais é conhecido na América do Sul, embora o argentino, naturalmente, tenha as suas particularidades, incluindo um sistema de descida baseado na média de pontos.
Os 30 clubes da primeira divisão, número estabelecido em 2014, dividem-se em dois grupos de 15. Após uma fase regular de 16 jogos, os oito melhores classificados de cada zona avançam para os play-offs até à final.
"Isto é uma confusão. Antes havia dois (torneios, Clausura e Apertura), 20 equipas e era simples", diz à AFP Tomás Menconi, adepto do River Plate de 33 anos. "Agora é impossível acompanhar. Os títulos nacionais valem cada vez menos", afirma.
A proliferação de torneios e equipas é vista por muitos como a razão do alegado baixo nível do futebol argentino, cujos clubes não conquistam a Taça dos Libertadores desde 2018.
"O nosso campeonato não é uma liga para poucos: é popular, competitivo e formador", defendeu Claudio Tapia, presidente da AFA desde 2017, na semana passada no X.
O dirigente, no entanto, admitiu em abril possíveis falhas de comunicação ao explicar o objetivo de aumentar o número de equipas nas competições, uma iniciativa já aplicada no Mundial e na Liga dos Campeões da Europa.
