Aos 45 anos, José Monsanto trabalha na administração do Mercado da Ajuda, como funcionário da Junta desta freguesia de Lisboa, e viveu em Bell Buckle “um momento muito especial”, não poupando nas palavras para descrever a experiência.
“Foi uma das melhores semanas da minha vida. O resultado não é bem o desejado, mas em termos de enriquecimento pessoal, de vivência, foi realmente sensacional”, atira, em entrevista à Lusa.
Dedicou-se às ultramaratonas em 2021, mas já antes havia sonhado com elas, e desde então tem feito caminho nas backyard ultra, um tipo de corrida, inventada pelo norte-americano Lazarus Lake, em que cada corredor tem uma hora para percorrer 6.706 metros, e assim sucessivamente, de hora em hora, até só sobrar um atleta.
Apesar de ter 43 loops, ou voltas, como recorde, uma lesão, após quedas, deixou-o abaixo desse resultado, nas 28, durante o Campeonato do Mundo, um resultado que fica aquém, admitiu o próprio, mas que adveio de “muitas raízes e pedras escondidas” no percurso, além do desgaste e do acumular do esforço.
Competir lá, diz José Monsanto, “foi muito especial, mesmo muito especial”. “A Barkley, como a Backyard, têm cada vez mais adeptos em todo o mundo”, lembra.
Estar no restrito lote de menos de 200 atletas em prova, provenientes de 39 países, deixou-o com um sentimento de “honra”, por ser o primeiro português no Mundial, mas o que fica, conta, é mais do que a façanha desportiva.
“São as amizades feitas, as simpatias de tantos grandes campeões, gente muito trabalhadora e muito humilde. A entreajuda, partilha de comida, de gelo, toda essa ajuda que existiu entre equipas para tentar manter os atletas o máximo possível em prova. Independentemente de se ganhar ou não”, afirma.
Sem saber qual a próxima aventura, numa backyard ultra ou outro tipo de corrida, lembra como recebeu a mensagem de alguém que lhe pedia para ajudar o namorado em prova, o que fez enquanto pôde, mas também a entreajuda durante o período de pausa, depois de acabar um ‘loop’ e começar outro.
Fundamental, refere, é o apoio do braço direito, no caso Alexandre Andrade, que trata de tudo para que o atleta possa recuperar e competir nas melhores condições durante as muitas horas em prova – o vencedor masculino, o australiano Phil Gore, acabou com 114 voltas, o que significa quase cinco dias de competição.
José Monsanto começou a correr “há uns nove anos”, porque se sentia “a definhar, em má forma, cansado só de subir uma rua”.
“Experimentei dar algumas corridas e gostei muito da forma como me sentia. Fui progredindo, dos cinco quilómetros para os 10, para os 21. Conheci o Alexandre Andrade, que já estava nas ultramaratonas, e achei fascinante”, recorda.
Nesse percurso, em 2019 assistiu à Big’s Backyard Ultra, em Bell Buckle, quando esta ainda não tinha “esta dimensão mundial”, e ficou “estupefacto de como as pessoas se conseguiam mexer” após tamanho esforço, hora após hora.
Ficou o bichinho. “Pensei que um dia teria de experimentar. (...) Quando surgiu a primeira em Portugal, inscrevi-me”, atira.
O primeiro português num Mundial da especialidade diz que o grande ensinamento da backyard ultra, como de outros desafios extremos deste tipo, é que se aprende “que nenhum desafio é grande demais”.
“Com dedicação e vontade conseguimos muitas vezes ir mais longe do que imaginamos. A vida é simples, boa, para se aproveitar. Não vale a pena stressar com coisas menores”, aconselha.
