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Nélson Pereira: "Guarda-redes que só treina, não dá guarda-redes"

Nélson Pereira ao serviço do Sporting
Nélson Pereira ao serviço do SportingSporting CP
A carência de guarda-redes portugueses titulares na Liga é uma consequência do rendimento imediato que os clubes procuram, mas também da falta de oportunidades nas camadas de formação, avalia o antigo guardião internacional luso Nélson Pereira.

No contexto atual, sobressaem apenas dois guarda-redes lusos entre os 18 que atuam como titulares no escalão principal, nomeadamente Diogo Costa (FC Porto) e Ricardo Velho (Farense), algo que torna Portugal no país que menos aposta em ‘keepers’ nacionais entre os 20 principais campeonatos da UEFA.

É uma realidade que nós detetámos quando eu estava ligado à coordenação da formação de guarda-redes do Sporting. Além de sermos um país pequeno, que não tem assim tantos guarda-redes em qualidade e quantidade, quando os temos não apostamos neles”, começou por dizer Nélson Pereira à agência Lusa.

O antigo guarda-redes, de 49 anos, campeão nacional pelo Sporting em 1999/00 e 2001/02, salientou que “os clubes querem rendimento imediato e não dão tempo aos guarda-redes para ter o seu processo de crescimento, porque nesse processo há erros”.

Achei que a criação das equipas B e de sub-23 viria a ajudar bastante nessa situação, mas já vemos muitos estrangeiros a jogar nessas equipas. Quando a castração é feita ainda mais cedo, mais difícil fica ter guarda-redes portugueses que apresentem logo bom rendimento para a primeira ou segunda divisão. Corremos o risco de não termos guarda-redes de qualidade para a nossa seleção nacional”, advertiu.

Nélson Pereira apontou igualmente a altura dos portugueses como uma desvantagem, o que, “para jogar em clubes de topo faz alguma diferença”, reforçando que “a campeonite, por vezes, torna-se mais importante do que a formação do próprio atleta”, ainda mais tratando-se de uma “posição tão específica”.

Um guarda-redes que não jogue, não tem hipótese nenhuma. Guarda-redes que só treina, não dá guarda-redes. A falta de oportunidade começa muito cedo”, referiu, dando como exemplo Diogo Pinto e Diego Callai, ambos do Sporting, e Samuel Soares, do Benfica: “Se não jogam na equipa A, têm de jogar na equipa B ou sub-23, para terem ritmo de jogo. Todos os guarda-redes que são detetados pelos clubes como tendo mais potencial têm de jogar”.

Internacional numa ocasião e eleito para representar Portugal no Mundial-2002, na Coreia do Sul e Japão, Nélson Pereira recordou que Rui Patrício e Diogo Costa, os donos da baliza da seleção nacional nos últimos anos, eram “guarda-redes jovens, que foram cometendo erros, mas os treinadores continuaram a apostar neles”.

Temos de tomar estes exemplos e segui-los, sabendo que haverá acidentes de percurso. É preciso ter essa coragem, senão, qualquer dia, não temos guarda-redes para a seleção nacional”, assinalou, frisando que “os miúdos ainda se reveem” em “referências” como Vítor Baía, Rui Patrício ou Diogo Costa: “No dia em que acabarem essas referências, também acabará o interesse dos miúdos pela baliza”.

Rui Patrício no Sporting
Rui Patrício no SportingSporting CP

Se os portugueses estão em minoria na Liga - mas também poucos há que sejam titulares em equipas estrangeiras -, são os brasileiros que dominam as balizas em Portugal, com oito como primeiras opções.

O Brasil, há uns anos, passou por este fenómeno de não ter um guarda-redes com qualidade consentânea com o valor da sua seleção. Perceberam, por altura da geração do Taffarel, que as coisas não estavam fáceis, e começaram a trabalhar muito na formação dos guarda-redes, a colocá-los na Europa, onde o treino também é diferente e os ajuda a tornarem-se guarda-redes de um nível elevado. Nesta altura, mesmo no Brasileirão, têm guarda-redes muito interessantes”, analisou Nélson Pereira à Lusa.

Após terminar a carreira no Belenenses, em 2009/10, Nélson integrou a estrutura técnica do Sporting durante quase uma década, inclusive na primeira equipa, sendo que houve um guarda-redes com o qual trabalhou que ainda não atingiu o nível que esperaria: Luís Maximiano, atualmente no Almería, do segundo escalão espanhol.

Há um que ainda pode vir a atingir o nível esperado, que é o Max (Luís Maximiano). Teve a infelicidade de, no seu primeiro jogo na Lazio (na época passada), ser expulso aos oito minutos. Isso teve um impacto tremendo na carreira dele, porque ele tem muita qualidade e vai ter quase de reiniciar todo um processo que, até chegar à Lazio, estava a correr dentro do expetável para ele poder afirmar-se na Liga italiana. Infelizmente, um pequeno detalhe, às vezes, faz toda a diferença e essa expulsão fez toda a diferença”, concluiu.

Os números de Maximiano
Os números de MaximianoFlashscore