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Opinião: Regresso de jogadores ao Brasil é comodismo ou necessidade?

Adson já está de volta ao Brasil
Adson já está de volta ao Brasil Profimedia
A possível contratação do avançado Adson, do Nantes, pelo Vasco, deixou-me ficar ainda mais impressionado como alguns (ou muitos) jogadores brasileiros não mostram muita força de vontade para superar os desafios no futebol estrangeiro.

Adson foi adquirido pelo Nantes em agosto (!), proveniente do Corinthians. Cinco meses depois, ele está de volta ao futebol brasileiro.

Dou este exemplo apenas para ilustrar a situação que tanto me incomoda, sem saber os detalhes dos motivos que fizeram o jogador regressar ao seu país de origem.

É mais comum do que deveria jogadores voltarem a jogar no Brasil depois de experiência mal sucedida fora do país.

Na despedida, o discurso é parecido: independência financeira, ganhar experiência num campeonato internacional, ter a chance de jogar uma Champions ou Liga Europa. Poucos meses bastam para tudo isso cair por terra. 

Creio eu que as dificuldades encontradas são maiores do que as esperadas, principalmente quando a transferência acontece com jogadores mais jovens. Isso é normal.

Robert Renan foi negociado com o Zenit no meio do ano e já voltou ao Brasil
Robert Renan foi negociado com o Zenit no meio do ano e já voltou ao BrasilZenit

Mas era sabido, principalmente pelo jogador, que algumas diferenças apareceriam: língua, cultura, frio, comida, ambiente no balneário, esquema tático, treinador que não dá as esperadas oportunidades e por aí vai...

Esperava-se o quê longe do Brasil? Calor na maior parte do ano? Brincadeira e pagode à solta no balneário e brasileiros de sobra para falar a sua língua? Cuzcuz, tapioca e acarajé?

Pedro jogou em Itália na temporada 2019/20, mas voltou ao Brasil
Pedro jogou em Itália na temporada 2019/20, mas voltou ao BrasilProfimedia

A minha crítica não se dá pelo regresso e sim pelo pouco tempo de tentativa para fazer as coisas darem certo na nova casa. A decisão passa muito pela formação e mentalidade do jogador. 

Alguns já vão para a Europa bem preparados, determinados a ficar por algum tempo antes de pensar num possível regresso, fazendo questão de, até mesmo, aprender o inglês para facilitar a sua adaptação fora do país.

Moisés voltou ao Fortaleza meses após se transferir para o futebol mexicano
Moisés voltou ao Fortaleza meses após se transferir para o futebol mexicanoProfimedia

Regresso é caminho mais fácil

As barreiras são várias e parece-me cómodo acionar o clube ou empresário e manifestar desejo de voltar ao futebol brasileiro, sem mostrar um pouco de força de vontade para superar todos os desafios.

Poucas oportunidades do treinador e as esperadas dificuldades de adaptação fazem logo o jogador pensar em voltar ao Brasil. Na primeira proposta que aparece, já se pensa no regresso. 

Se eu fosse agente do jogador, tentaria convencê-lo sobre a importância de seguir em determinado país e cavar seu espaço num novo cenário, como conseguiu fazer no Brasil. Mas sabemos como muitos agentes estão mais interessados nos lucros do que na formação profissional dos seus atletas.

Yago Pikachu fez apenas 12 jogos no Shimizu S-Pulse antes de voltar ao Fortaleza
Yago Pikachu fez apenas 12 jogos no Shimizu S-Pulse antes de voltar ao FortalezaProfimedia

O crescimento

É justamente nas dificuldades que se cresce, tendo a chance de, no futuro (a médio e longo prazo, por favor), olhar pra trás e ver tudo que foi superado e conquistado.

Sei bem que cada caso é um caso e peculiaridades existem: problemas pessoais, familiares a necessitarem da presença constante em virtude de alguma necessidade, etc. Mas estes são casos específicos e, de uma maneira geral, não é o que acontece.

Terans desperta interesse do Flu após ir para o México no 2° semestre de 2023
Terans desperta interesse do Flu após ir para o México no 2° semestre de 2023Profimedia

O que motiva o regresso de boa parte dos jogadores é o desejo de voltar ao ambiente que ele tanto conhece. A sensação de estar em casa é única, respeito isso.

Mas é frequente vermos jogadores a colocarem o rabo entre as pernas e voltarem ao Brasil na segunda dificuldade que aparece, sem ter a noção de tudo que está a deixar pelo caminho. Isso sem contar com o possível prejuízo financeiro ao clube que o contratou. Mas isso não é problema deles...

Jeffinho não teve muito tempo de adaptação a França e já voltou ao Botafogo
Jeffinho não teve muito tempo de adaptação a França e já voltou ao BotafogoLyon

Oportunidade perdida

Apenas para citar algumas das possíveis conquistas na Europa, por exemplo, tem-se a chance de aprender uma outra língua, de morar num país de primeiro mundo e conhecer diversos valores de vida que não temos no Brasil.

Fica pelo caminho a oportunidade de aprimorar sua visão de futebol numa escola diferente, de tornar-se um jogador melhor ao assimilar novas aprendizagens na parte tática, talvez podendo atuar numa nova posição, de dividir o campo (ao lado ou contra) com jogadores renomados que nunca passarão perto do Brasil, de jogar uma competição como a Champions e por aí vai...

Fácil não é e ninguém disse que seria. E isso era de conhecimento do jogador e da sua família desde o início das negociações.

Pedro Raul já é especulado no Brasil após apenas 15 jogos no Toluca, do México
Pedro Raul já é especulado no Brasil após apenas 15 jogos no Toluca, do MéxicoVasco

Fecha a conta e passa a régua

Ninguém o obrigou a assinar um contrato de quatro ou cinco anos para pedir o boné em poucos meses, podendo criar uma dose de deceção em quem se alegrou com a oportunidade que surgiu e foi deixada de lado depois de tão pouco tempo.

Yony González durou nove jogos na MLS em 2020
Yony González durou nove jogos na MLS em 2020Fluminense

Essa volta pode, inclusive, prejudicar o seu futuro, na hora de um possível regresso à Europa. A análise do histórico recente pode pesar contra e o novo desejo de jogar no Velho Mundo ficar pelo caminho. 

O futebol brasileiro seguiria à sua disposição por muitos anos. Dizer que não custava nada seguir na Europa é exagero, mas vejo estes regressos como uma opção fácil e rápida de mudar um cenário num período de adaptação que mal começou.

Daniel Ottoni é editor senior do Flashscore Brasil
Daniel Ottoni é editor senior do Flashscore BrasilFlashscore