O apoio aos Leões do Atlas foi-se tornando mais frequente à medida em que a seleção de Marrocos ia surpreendendo com os resultados conquistados na prova realizada no Catar, na qual se tornou na primeira equipa árabe ou africana a atingir as meias-finais.
Um feito que trouxe pessoas às ruas e ajudou a aumentar a popularidade do país no mundo árabe, tendo por base os festejos em que adeptos agitavam bandeiras da Palestina após os triunfos de Marrocos, imagens vistas por milhões de pessoas em todo o globo e que constituiram um golpe diplomático do país perante a Argélia, durante décadas considerada a principal apoiante da causa palestiniana no norte de África.
Há apenas dois anos, Rabat suscitou críticas em todo o mundo árabe pelo restabelecimento dos laços com Israel. Mas o especialista em relações internacionais Tajeddine Houssaini disse que o acordo, parte de uma série de acordos de normalização mediados pelos Estados Unidos, "não significa que Marrocos tenha virado as costas à causa palestiniana".
"A seleção nacional e os adeptos confirmaram isso no Catar", observou, sublinhando que os palestinianos criaram inclusivamente cânticos de apoio à equipa marroquina.
Diplomacia do futebol
Os ganhos diplomáticos de Marrocos vão muito além da causa palestiniana e do mundo árabe.
"A extraordinária participação de Marrocos no Campeonato do Mundo de futebol, é claro, brindou a imagem do país, que tem vindo a utilizar o poder suave há anos para deixar a sua marca no palco internacional", disse o especialista em política desportiva Moncef El Yazghi.
O país já tinha um historial de utilização da "diplomacia do futebol" para reforçar os seus laços com os países africanos, assinando pelo menos 30 acordos de cooperação com outras federações, acrescentou.
A série de vitórias dos marroquinos uniu adeptos entusiasmados da África do Sul à Tunísia, onde os apoiantes ignoraram uma discussão diplomática latente com Rabat sobre o território disputado do Sahara Ocidental.
Mesmo na rival Argélia, onde a questão é ainda mais disputada, o público levou os Leões do Atlas a sério, ainda que os meios de comunicação oficiais tenham mantido reserva quanto às conquistas da equipa.
O inesperado sucesso da seleção "captou a atenção das pessoas", apontou o historiador francês Pierre Vermeren.
"Isto deu a Marrocos uma grande vitória simbólica sobre a Argélia - mas também uma vingança simbólica, desportiva e política contra os seus vizinhos", disse, lembrando vitórias sobre Portugal e Espanha.
Marrocos tem sonhado durante décadas em jogar com as grandes equipas "e agora tornou-se uma realidade", acrescentou.
Proveitos diplomáticos e também económicos?
Marrocos espera também converter a recente campanha em ganhos económicos, especialmente para o turismo. O setor é um dos principais empregadores do país, mas foi atingido pela pandemia de COVID-19 e pela recessão económica global exacerbada pela invasão russa à Ucrânia.
Para já, o país ainda não conseguiu igualar os 13 milhões de visitantes que recebeu em 2019, mas Lahcen Zelmat, diretor da federação nacional da indústria hoteleira (FNIH), confia que Marrocos tem agora uma "excelente oportunidade".
Os sucessos da equipa "deram-nos grande visibilidade", destacou, notando que o país era "familiar para os europeus ocidentais mas não necessariamente entre os turistas asiáticos ou latino-americanos".
"Hoje é conhecido em todo o mundo, mas vamos ter de trabalhar arduamente para tirar o máximo partido desta publicidade inesperada".
Enquanto as vitórias do futebol distraíram temporariamente muitos marroquinos dos seus males económicos, a festa para os Leões do Atlas - que regressaram a casa na terça-feira - terminará em breve.
Resta saber se a aventura do país no Campeonato do Mundo terá um efeito duradouro na economia do país.
Nos últimos dias, a imagem de Marrocos foi de certa forma manchada à medida que a polícia belga investiga alegações de que o país e o Catar compraram influência no Parlamento Europeu.
O anfitrião da mais recente edição do Mundial de futebol negou qualquer acto ilícito, enquanto Marrocos não ofereceu qualquer resposta oficial.