"Acredito nas minhas capacidades (...) que me levarão ao topo", disse a confiante atleta de 23 anos, antes de iniciar o aquecimento na Cidade dos Desportos, em Tripoli.
O seu pai, Salem al-Sayeh, de 60 anos, que é também o seu treinador, sentou-se em blocos de cimento à beira de uma pista em ruínas, supervisionando o treino. A atleta, cujas numerosas medalhas em torneios locais e regionais lhe valeram a alcunha de "a caçadora de ouro" na Líbia, tem desta vez um objetivo muito ambicioso: os Jogos Olímpicos de Paris.
Uma tal participação seria, por si só, um feito para Retaj al-Sayeh, que se prepara num país devastado pela violência fratricida desde a queda da ditadura de Muammar Kadhafi, em 2011, e onde o desporto feminino sofre de falta de recursos e desperta pouco interesse, quando não é mal visto, numa sociedade conservadora e patriarcal.
"Coloquei-me desafios (...) apesar das adversidades e dificuldades na Líbia, especialmente a falta de recursos", diz Retaj al-Sayeh.
Primeira medalha
Quer esteja vento, chuva ou um calor sufocante, ela está lá. Longe dos novíssimos pavilhões e campos da Cidade de Desportos de Tripoli, Retaj al-Sayeh treina numa zona abandonada e cheia de destroços, sob o olhar orgulhoso e benevolente do pai, o seu treinador.
Depois do aquecimento, concentrou-se, descolou e deu várias voltas antes de lançar o disco, que aterrou a algumas dezenas de metros de distância, sob os aplausos do pai.

Retaj al-Sayeh vai participar numa competição nos Emirados Árabes Unidos em fevereiro, seguida dos Campeonatos Africanos de Atletismo nos Camarões em junho, onde espera melhorar consideravelmente o seu recorde pessoal de 57 metros para atingir pelo menos 64,5 metros, o mínimo exigido para participar nos Jogos Olímpicos.
Já em criança, Retaj al-Sayeh tinha talento para esta disciplina, que exige força, técnica e resistência, e que não é muito popular entre as raparigas da sua idade.
"Na escola primária, (...) ganhei a minha primeira medalha de ouro numa competição escolar", contou à AFP, vestida com um fato de treino preto e sapatos brancos enquanto segurava um disco.
Para o pai, antigo jogador de voleibol e capitão da equipa nacional da Líbia em 1982, a carreira desportiva da filha parecia estar definida desde muito cedo. E com apenas 12 anos, ganhou uma medalha de bronze num torneio internacional de atletismo no Catar, em 2012.
"Meios limitados"
"O meu pai sempre acreditou nas minhas capacidades e sempre me apoiou, tanto moral como financeiramente. Se eu sofria um revés, ele encorajava-me a levantar e a começar de novo", confessa a atleta, grata ao seu primeiro fã.
"Sempre me deu o seu tempo, o seu apoio financeiro e a sua energia, mesmo quando eu quase desisti. Dizia-me sempre que eu era uma campeã olímpica em ascensão e que nada devia enfraquecer a minha determinação", acrescenta.
Apesar da falta de recursos, o pai tenciona perseverar ao lado da filha, convencido de que ela tem potencial para ter sucesso ao mais alto nível.
" A minha família e eu vamos continuar a apoiar a Retaj apesar dos recursos limitados disponíveis, porque ela tem um enorme potencial para deixar a sua marca na cena internacional", garante.
Após uma cirurgia às costas, Retaj al-Sayeh acaba de regressar à sua melhor condição física e sente-se perto de atingir o seu objetivo, após anos de incerteza.
"Em 2016, passei por um período difícil que quase me levou a decidir reformar-me. Nessa altura, por causa da guerra, não consegui obter um visto para participar no Campeonato do Mundo de Juniores na Polónia. Fiquei muito triste porque estava convencida de que podia ganhar o ouro. Estava no topo", explica.
Mas o incentivo das pessoas que lhe eram próximas e de muitos atletas fê-la mudar de ideias. No ano seguinte, ganhou a medalha de prata no Campeonato Africano de Juniores, na Argélia.
"Um tributo a todos aqueles que confiaram em mim e acreditaram em mim. Graças a Deus, o meu sonho olímpico vai realizar-se", disse enquanto abraçava o pai.
