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Opinião: O ténis feminino é um viveiro de estrelas e de entretenimento

A vitória de uma estrela
A vitória de uma estrelaJULIEN DE ROSA / AFP
Depois de uma magnífica final de singulares femininos em Roland Garros, chegou o momento de deixar de desacreditar o ténis feminino. As comparações duvidosas com os homens, as críticas sobre a falta de estrelas e de espetáculo: há muito tempo que tudo isto foi posto de parte.

Por falar nisso, Coco Gauff derruba Aryna Sabalenka e triunfa em Roland Garros.

Provavelmente, todos nós fizemos a mesma cara que Alizé Cornet, quando ouviu Patrick Mouratoglou proferir uma frase simples que lhe deu a volta à cabeça: "Penso que estamos num período em que não há grandes estrelas no ténis feminino (...) ser uma estrela não é apenas ser uma excelente jogadora de ténis". Portanto, não, não é só isso. Mas não deixa de ser um ponto de partida inevitável.

A ironia é incrível. Mouratoglou, uma figura do ténis atual, ganhou notoriedade ao assumir... Serena Williams, ajudando a reavivar a sua carreira e a torná-la a recordista de Grand Slams. E este é o mesmo homem que contribui para a desvalorização do ténis feminino, da mesma forma que a direção de Roland Garros se recusa obstinadamente a programar jogos femininos em sessões nocturnas, apesar dos pedidos da Amazon, que queria aproveitar a onda criada por Loïs Boisson. Ou como a France Télévisions, que só transmite jogos femininos (excluindo as francesas) quando não há jogos masculinos.

Se olharmos objetivamente para o que se passou desde o início da época em termos de entretenimento, o balanço fala por si: Uma final extraordinária no Open da Austrália, a mesma coisa em Roland Garros, a consagração de Madison Keys em Melbourne, o nascimento de uma futura estrela na forma de Mirra Andreeva, de 18 anos e duas vezes vencedora do WTA 1000, o regresso de Paula Badosa e Naomi Osaka (que, aliás, fez o melhor jogo do Open de França na primeira ronda), a revelação de Boisson em Porte d'Auteuil, e a lista continua. De facto, foi apenas a segunda vez neste século que os dois primeiros classificados se encontraram na final em Paris. Enquanto isso, no lado masculino, uma final sem graça em Melbourne, um número 1 do mundo suspenso por doping, Carlos Alcaraz intocável no saibro, Jannik Sinner intocável no hard court e finais decepcionantes em todos os principais torneios da temporada.

A questão é: o que é que queremos? Queremos suspense? Os últimos cinco torneios de singulares femininos do Grand Slam tiveram 5 vencedoras distintos. Para encontrar a mesma coisa no lado masculino, é preciso recuar até... 2003, ou seja, antes dos três grandes : o ténis feminino está a ser castigado e desacreditado por não ter tido três campeãs capazes de esmagar todas as outras. Os 14 títulos de Rafael Nadal no Open de França são um dos recordes mais incríveis do ténis. Mas nunca ouvimos ninguém queixar-se da falta de suspense: toda a gente preferiu celebrar a glória de um tal campeão.

Ninguém quer admirar as mulheres no ténis, a não ser que ganhem 23 títulos do Grand Slam, como Serena Williams. Steffi Graf é agora referida como a mulher de Andre Agassi, apesar de o seu recorde ser infinitamente superior ao do marido. Quando Emma Raducanu consegue a façanha milenar de sair das eliminatórias para ganhar um Grand Slam, é porque as favoritas ficaram pelo caminho. E, de qualquer forma, "se são tão fortes, porque é que não jogam cinco sets para ganhar um Grand Slam"?

Hoje, uma estrela triunfou em Roland Garros, dominando outra estrela na final. Mas Mouratoglou foi mais longe depois do jogo, dizendo que a americana "tem a capacidade de se tornar uma estrela". A estrela é Coco Gauff, não o crítico num sofá de couro a promover o seu livro, que só conseguiu escrever porque uma das maiores tenistas da história o colocou na ribalta. Vale a pena lembrar...