No entanto, o acordo deu poucos detalhes sobre como décadas de hostilidade possam vir a ser ultrapassadas de forma a que adeptos israelitas e palestinianos possam partilhar o mesmo avião para o primeiro Mundial disputado numa nação árabe.
"O anúncio histórico de hoje proporciona uma plataforma para melhorar relações em todo o Médio Oriente. Com este acordo, israelitas e palestinianos vão poder voar juntos e disfrutar de futebol juntos", afiançou Gianni Infantino, presidente da FIFA.
No comunicado emitido pela FIFA pode ler-se que os voos estariam sujeitos aos "requerimentos de segurança e capacidade logística de Israel" e comentários feitos por Israel e pelo Catar, que não têm relações diplomáticas, colocaram a descoberto as suas divisões.
O primeiro-ministro cessante israelita, Yair Lapid, acolheu o acordo sem mencionar o acesso dos palestinianos ao torneio que começa no dia 20 de novembro.
Um funcionário do governo catari disse à AFP: "O Catar transmitiu aos israelitas que qualquer escalada em Jerusalém, Gaza ou Cisjordânia durante este período vai colocar em causa o cancelamento do acordo, incluindo os voos diretos".
Fontes diplomáticas indicaram que mais de 10.000 adeptos palestinianos e israelitas conseguiram bilhetes para o torneio de 29 dias de duração. Por causa de ser anfitrião do Mundial, o Catar não pode recusar adeptos de qualquer nação.
Essas fontes diplomáticas disseram ainda que foram precisos meses de "duras negociações" para a FIFA desbloquear o acordo que permite ligações diretas a partir do principal aeroporto israelita, Ben Gurion, para o evento.
Acesso restrito
Israel restringe severamente o acesso a essa aeroporto a residentes de territórios palestinianos. Os palestinianos da Cisjordânia normalmente viajam através da Jordânia e é virtualmente impossível que os habitantes de Gaza entrem no Ben Gurion.
O documento da FIFA diz que os voos vão ser operados "por uma companhia aérea com direitos de aterragem no Catar pela duração do Mundial, sujeitos aos requerimentos de segurança e capacidades logísticas de Israel.
Todos os adeptos nesses voos são obrigados a terem bilhetes para um jogo e um passe especial de adeptos do Catar, o cartão Hayya, pode ler-se na nota, prometendo mais detalhes "a seu tempo".
As condições delíneadas pela FIFA excluem qualquer companhia aérea israelita para fazer esses voos. Fontes próximas das negociações disseram que a Real Companhia Aérea da Jordânia e a operadora europeia TUI estavam a ser consideradas.
Os serviços consulares para os israelitas vão ser tratados por uma "empresa de viagens internacionais privada sediada em Doha", segundo a FIFA.
"Os palestinianos terão acesso aos serviços consulares na embaixada da Palestina, em Doha".
Lapid congratulou o acordo, sem mencionar os palestinianos.
"Depois de muito trabalho ao longo de vários meses, conseguimos providenciar que os cidadãos israelitas viajem para o Mundial do Catar em voos diretos, e a abertura de um escritório israelita no Catar para providenciar serviços aos adeptos", afirmou.
Os vizinhos do Catar no Golfo Pérsico, os Emirados Árabes Unidos e o Bahrain, estabeleceram relações diplomáticas com Israel em 2020. A Arábia Saudita - que não reconhece Israel - abriu o seu espaço aéreo a voos israelitas em julho.
O Catar estabeleceu relações comerciais com Israel em 1996, o primeiro Estado do Golfo a fazê-lo. Mas em 2000, o escritório comercial de Israel foi fechado pelas autoridades e as relações entre os dois países foram permanentemente cortadas em 2009, devido a uma operação militar israelita em Gaza.
Doha apoia o Hamas, o grupo islamita palestiniano que controla a Faixa de Gaza e tem travado guerras com Israel desde 2008. O Estado hebreu, que mantém um embargo em Gaza, comprometeu-se com Doha a conceder autorizações para a distribuição de ajuda catari ao enclave costeiro palestiniano, mas os detalhes sobre esses contactos raramente são publicamente confirmados.
Ainda este ano, a morte de uma jornalista palestino-americana do canal Al Jazeera, sediado no Catar, colocou mais tensão nas relações.
O Exército israelita concedeu as suas tropas provavelmente mataram Shireen Abu Akleh, mas disse que o soldado a tinha confundido com uma militante.
Já o Catar insistiu que a sua posição sobre Israel mantém-se inalterada.
"Isto faz parte do compromisso do Catar com os requerimentos da FIFA e não deve ser politizado", pode ler-se num comunicado oficial do governo.
"Sempre dissemos que qualquer pessoa com bilhete para um jogo do Mundial seria autorizada a entrar no Catar. Por causa deste acordo, os palestinianos poderão agora disfrutar do primeiro Campeonato do Mundo no mundo árabe e muçulmano".
"A nossa posição sobre a normalização (de relações) não mudou. A posição do Catar mantém-se firmemente ligada à resolução do conflito palestiniano, incluindo uma solução de dois Estados, em conformidade com as resoluções relevantes do Conselho de Segurança (da ONU) e da Iniciativa Árabe de Paz", contou o funcionário à AFP.