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Análise Gana: Black Stars em busca da redenção

Análise Gana: Black Stars em busca da redenção
Análise Gana: Black Stars em busca da redençãoProfimedia

São quase 6.000 os quilómetros que separam Doha, no Catar, de Acra, a capital do Gana, país que estará novamente representado numa fase final de um Campeonato do Mundo de futebol. Numa prova que reunirá cinco seleções do continente africano, a ganesa apresenta-se como uma das mais proeminentes desse pequeno grupo, fruto de conquistas passadas e de registos mantidos em edições anteriores da mais importante competição de seleções. No país árabe, estarão parte dos mais de 31 milhões de habitantes ganeses, que se farão certamente acompanhar do espírito rebelde de um povo que desde 2014 sonha com o regresso das Black Stars aos grandes palcos do futebol.

Com quatro presenças em mundiais, a estreia remonta a 2006, na Alemanha, com uma – até aí talvez improvável – passagem aos oitavos-de-final da prova, ronda em que caiu aos pés do Brasil. Quatro anos depois, o Gana rumou à África do Sul e melhorou o registo anterior com o acesso aos quartos de final, nos quais que se deu um dos momentos mais marcantes do passado recente dos Mundiais. Aos 120 minutos e com 1-1 frente ao Uruguais, Luís Suarez defendeu – literalmente – um remate contrário, lance que lhe valeu a expulsão e que deu a Asamoah Gyan uma oportunidade única de colocar o Gana nas meias-finais. Contudo, o avançado atirou à trave, o jogo seguiu para o desempate por grandes penalidades e foi o Uruguai quem se superiorizou, colocando um ponto final na histórica participação ganesa.

A epopeia continuou em 2014, no Brasil, naquela que foi a terceira presença consecutiva da seleção em Campeonatos do Mundo, mas, simultaneamente, a pior. Durante a competição a polémica estalou, os jogadores acusaram a federação de incumprimento no pagamento dos valores devidos aos jogadores, que ameaçavam não entrar em campo contra Portugal, e o Gana terminou a primeira fase no quarto lugar, com apenas um ponto, num grupo em que a seleção lusa também ficou pelo caminho.

O resultado parecia antever uma quebra nas ambições ganesas, reforçada pelos desgostos sofridos na final da Taça das Nações Africanas (CAN) perdida no ano seguinte. O Gana procurava reinventar-se, mas o terceiro lugar na fase de apuramento para o Mundial-2018 deixou o conjunto africano de fora da Rússia. O cenário piorou na CAN 2021, com o último lugar da fase de grupos, fracasso que custou ao sérvio Milovan Rajevac o lugar de selecionador.

Otto Addo é um dos quatro selecionadores
Otto Addo é um dos quatro selecionadoresAFP

Para o seu lugar... chegaram quatro. Otto Addo, Chris Hughton, George Boateng e Mas-Ud Didi Dramani foram anunciados como “os homens para o trabalho” rumo ao Mundial-2022, tornando a tarefa habitualmente atribuída a uma pessoa numa espécie de missão grupal. Certo é que o objetivo foi-se encaminhando, assente numa qualificação que caiu para os ganeses pelo detalhe e que culminou com um empate (1-1) em Abeokuta, na Nigéria, depois do nulo em Cape Coast no primeiro jogo do play-off.

Oito anos depois, com altos e baixos, as Black Stars, atuais 61.º colocadas do ranking FIFA, estão de volta ao maior palco de seleções do futebol mundial. O Catar é “já ali” e no horizonte estará, garantidamente, a tentativa de aproveitar possíveis falhas de Portugal e Uruguai, os crónicos candidatos aos dois primeiros lugares do grupo H.

Pontos fortes

A qualidade e liderança de Daniel Amartey, defesa do Leicester, de Inglaterra, são suficientes para que se evidencie como o patrão da linha defensiva, dando base a uma estrutura assente num 4-5-1, com o “reforço” Iñaki Williams na frente, ou numa eventual dinâmica com dois avançados, especialmente nos momentos em André e Jordan Ayew possam coincidir em campo.

Iñaki, estrela maior do Athletic Bilbao, parecia reticente em representar o Gana, país de origem dos pais, mas anunciou em julho a decisão de vestir as cores das Black Stars, constituindo uma opção de peso para o ataque. A ele juntam-se os irmãos Ayew, figuras de relevo da formação ganesa, não tivessem, em conjunto, 192 internacionalizações e 42 golos marcados. 

Jordan Ayew, na fachada de um edifício no Catar, é uma das referências ganesas
Jordan Ayew, na fachada de um edifício no Catar, é uma das referências ganesasFlashscore

No meio-campo, Thomas Partey será o baluarte, atribuindo poderio físico, experiência e leitura ao jogo ganês, que poderá contar, ainda, com a juventude e irreverência de Issahaku Fatawu, extremo do Sporting que conta 13 internacionalizações e um golo, e é visto como uma das grandes promessas de futuro da academia leonina, tendo merecido um lugar entre os eleitos dos selecionadores. 

Pontos fracos

O passado recente do Gana tem tido altos e baixos e o ponto fraco poderá estar na incapacidade demonstrada pela equipa em fechar os jogos que disputa.

Nos duelos para a qualificação para o Mundial, só uma das quatro vitórias terminou com uma vantagem de dois golos (3-1 contra o Zimbabué), e as restantes foram pela margem mínima (1-0 contra Etiópia, Zimbabué e África do Sul). Para além destes, os ganeses empataram na Etiópia, depois de terem estado a vencer até cerca de 20 minutos do fim, e perderam, por 1-0, na África do Sul, nos 10 minutos finais.

A reestruturação da seleção, que vem apresentando diferentes soluções para o onze inicial, poderá estar na base de alguma insegurança que torna as prestações da equipa algo imprevisíveis.

XI Ideal

Lawrence Ati ZigiTariq Lamptey, Daniel Amartey, Alexander Djiku, Abdul-Rahman BabaThomas Partey, Mohammed Kudus, Andre Ayew, Jordan Ayew, SulemanaIñaki Williams.

Enquanto se espera pelo arranque do Mundial-2022, tudo não passará de uma previsão. Contudo, pela experiência internacional, aliada à comprovada qualidade técnica e tática, este pode ser um onze capaz de dar dores de cabeça aos adversários do Gana.

Seleção ganesa já arrancou o estágio em Abu Dhabi
Seleção ganesa já arrancou o estágio em Abu DhabiGFA Communications

Wollacott, que guardou a baliza durante quase toda a qualificação para a prova, lesionou-se à última da hora e perdeu o “comboio” para o Catar, e a opção pode recair sobre Lawrence Ati Zigi, guarda-redes que atua no St. Gallen, da Suíça. 

À sua frente, um quarteto defensivo experiente, com Thomas Partey e Mohammed Kudus como esteios no coração da equipa e Andre Ayew ligeiramente adiantado, procurando ligar o meio-campo ao ataque e criar condições para que Jordan Ayew e Sulemana visem a baliza ou descubram o sempre imprevisível Iñaki, cuja ligação ao golo é sobejamente conhecida.

Dúvidas

Nesta fase, e mesmo depois de divulgados os convocados, são algumas as dúvidas que se mantêm, estando a principal relacionada com a estrutura e capacidade defensiva da equipa. Na maior prova de seleções a nível mundial, todos os detalhes contam e todas as falhas e lacunas são cobradas, o que torna fundamental que a organização defensiva seja uma prioridade para os selecionadores ganeses, que a poderão complementar com a comprovada qualidade das soluções atacantes de que dispõem. 

Previsão

O amigável contra a Suíça, agendado para dia 17 de novembro, trará certamente uma ideia mais clara sobre a dinâmica e o momento das Black Stars, que terão de mostrar uma competência superior para poderem ambicionar algo mais no Mundial-2022.

Com Portugal e Uruguai como teóricos favoritos aos dois primeiros lugares, o Gana terá de contrariar o (curto) histórico de confrontos contra ambas as seleções, depois das derrotas contra a celeste olímpica, na África do Sul em 2010, e contra a turma lusa, no Brasil em 2014. Contra a Coreia do Sul, por outro lado, o registo pende para os ganeses, que contam três vitórias e duas derrotas nos cinco jogos amigáveis realizados, o último dos quais em 2014.

O Gana é uma das seleções cujas hipóteses não devem ser descuradas, pela qualidade e potencial físico que lhe são característicos. Um bom arranque diante de Portugal, seguido de um possível triunfo frente à Coreia do Sul, no segundo jogo, dariam boas possibilidades de apuramento para os oitavos-de-final do Mundial-2022, e isso será algo que os ganeses procurarão na prova.