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França-Marrocos, o desporto entre duas margens: Marcel Cerdan, o mito do "bombardeiro marroquino"

Marcel Cerdan morreu num acidente aéreo nos Açores
Marcel Cerdan morreu num acidente aéreo nos AçoresProfimedia
Lenda absoluta do desporto francês, Marcel Cerdan nasceu na Argélia mas foi em Marrocos, mais precisamente em Casablanca, que cresceu e tornou-se num pugilista por direito próprio. Campeão mundial de pesos médios, amante de Edith Piaf, que morreu num acidente aéreo ao largo dos Açores em 1949, "o bombardeiro marroquino" deixou uma marca indelével, ainda hoje viva.

Cerdan. Só o pronunciar deste nome traz de volta ao imaginário de todos o período de pós-guerra, quando os grandes eventos desportivos eram ouvidos no rádio, desenvolendo ainda mais a imaginação, amplificando as façanhas dos ídolos. E Marcel Cerdan estava no epicentro de tudo o que a França procurava representar.

Cerdan é, em França, um herói nacional. Tornou-se num mito absoluto. Reuniu, naquele país, as três dimensões essenciais para pertencer a essa categoria. Em primeior lugar, a sua vitória sobre Tony Zale, no Campeonato Mundial de Pesos Médios de 1948, que lhe deu a fama nacional. Depois, apesar de ser casado e pai de família, Cerdan era amante de Edith Piaf, num romance escandaloso que o levaria a um fim trágico.

Do salão de baile do café ao topo do Mundo

Nascido na Argélia, em Sidi Bel-Abbès, filho de um operário espanhol que se tornou dono de um café em Marrocos, Cerdan começou no fundo do poço. Desde os oito anos que Cerdan estava no programa das noites de boxe que o seu pai organizava no salão de baile do café, em Casablanca. Deixou a escola, porque o aborrecia, aos 11 anos, e foi-se multiplicando em biscates, desde os correios a trabalhador na Renault, canalizador, eletricista até se fixar entre os profissionais do boxe, aos 16 anos, pressionado pelo pai.

Poucos dias depois de atingir a maioridade, nessa altura fixada nos 21 anos, Cerdan ganhou o direito de atravessar o Mediterrâneo e provar o seu valor na modalidade, em Paris.

Nem mesmo a guerra impediu-o de encontrar-se com o destino. Campeão de França, campeão da Europa, Cerdan foi um pugilista ilustre, numa altura em que o pugilismo era um dos desportos mais populares, a Arte Nobre, quer no Magrebe, quer em Paris, onde cada distrito, cada comunidade, tinha o seu campeão oficial.

A sua vitória no Estádio Roosevelt, em Jersey City, a 21 de setembro de 1948, à custa de Tony Zale, fez de Cerdan parte da história do boxe, tornando-se o primeiro não americano a ganhar o cinturão mundial de pesos médios. O "Bombardeiro Marroquino" tornava-se um ídolo. E o seu caso amoroso com Edith Piaf iria elevá-lo à categoria de ícone.

Fatalidade com Portugal na estória

Ferido no início da luta e espancado por Jake LaMotta, então desconhecido e empurrado pela Cosa Nostra em Detroit, a 16 de junho de 1949, Cerdan teve direito a uma vingança em setembro. Mas "Raging Bull" é ferido (ou finge ser ferido) e adia o combate para 2 de dezembro. 

"Apanha o avião, ir de barco é demais", implora Edith Piaf, depois do combate no Madison Square Garden ter sido oficialmente assinado por Cerdan, a 25 de outubro. O bar está cheio mas o gerente garante mais três bilhetes. Benefícios da fama. No dia 27, o Air France Constellation deixou o aeroporto de Olly. Devido ao mau tempo no Atlântico Norte, os pilotos decidem atravessar os Açores para uma escala. Às 2:55, o voo 009 sai do radar: despenhou-se na ilha de São Miguel. Zero sobreviventes. Exceto, claro, o mito Cerdan, que ainda hoje permanece, como o pugilista francês mais popular da história.

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