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"Valadares já mostrou que é capaz de competir contra qualquer equipa"
- A Cris concedeu-nos uma entrevista em novembro de 2023, quando estava a iniciar o seu percurso no Valadares Gaia. O que mudou desde essa altura?
- É uma pergunta difícil. Acho que sou a mesma Cris, com a mesma ambição, mas mais experiente e com novos desafios. Este ano continuamos a ter uma equipa muito competitiva, onde todas podem fazer a diferença.
O grande desafio é precisamente esse: a qualidade da nossa equipa é muito equilibrada. Penso que essa é a maior diferença em relação ao ano passado — agora temos um plantel mais homogéneo. Ou seja, em termos de competitividade individual, este ano está ainda mais exigente. Ainda assim, independentemente de qual seja o papel, sou uma Cris que tenta fazer a diferença e contribuir para a equipa.

- No último jogo (frente ao SC Braga) sai do banco para decidir o importante jogo contra o SC Braga, um resultado que vem dar força ao vosso bom momento, não é verdade?
- Sim, veio dar força. Sabíamos que seria um jogo muito intenso, especialmente nos duelos, com uma forte componente física, principalmente na primeira parte. Na segunda, esperávamos ter mais espaço devido às transições, e o jogo acabaria por se orientar mais para esse aspeto. Quem entrasse, poderia fazer a diferença tanto para o SC Braga como para o Valadares.
- E como é que se sentiu do ponto de vista mais pessoal?
- Com as substituições, tanto a da (Carolina) Santiago como a minha, conseguimos dar um refresco ao ataque e ao meio-campo. No meu caso, senti-me confortável com o espaço entre as linhas e a Santiago trouxe profundidade e agressividade nas transições, deixando o SC Braga ainda mais desconfortável do que já estava até então.
Quando saí do banco, estava 0-0 e sabia que o jogo poderia cair para qualquer lado. Então, decidi dar o meu melhor, porque sentia que estava num bom momento de forma, e que tinha treinado bem. Curiosamente, várias colegas da equipa tinham dito: 'Cris, hoje vais marcar, hoje vais fazer a diferença!' Eu realmente acreditava nisso e estava bastante confiante de que poderia mudar o jogo. Entrei calma, tranquila, e com a certeza de que precisava de fazer o golo. E foi isso que aconteceu.
- Esta vitória muda a vossa perspetiva para a luta pelo 3.º lugar ou até pelo 2.º?
- O objetivo, inicialmente, era garantir a manutenção, e quando conseguimos, pensamos: "Ok, missão cumprida". A partir daí, o foco passou a ser dar o nosso melhor, pois ainda havia mais jogos pela frente. O SC Braga, o Sporting e o Benfica são partidas que toda a gente quer jogar. E o Valadares já mostrou que é capaz de olhar os outros olhos nos olhos e competir de igual para igual com qualquer equipa.
- Até onde podem ir?
- A pergunta que fazemos é: 'o que mais podemos fazer para tornar esta época ainda mais feliz?' Claro que sonhamos com o melhor possível, mas, por acaso, ainda não falámos muito sobre isso. Aqui dentro, precisamos manter a tranquilidade e não nos deixar influenciar por coisas que ainda não aconteceram. O foco é jogo a jogo. Sabemos que temos o Sporting e o Benfica pela frente, mas antes disso, temos o Rio Ave na Taça de Portugal, um jogo muito difícil. Apesar de estar na segunda liga, as equipas da Taça de Portugal têm uma dinâmica diferente, e tudo pode acontecer. Portanto, temos plena consciência dos desafios que ainda nos aguardam. Vamos jogar fora contra o Sporting, que também será um jogo complicado. Mas, no fim, são três pontos em disputa, e vamos querer disputá-los com tudo, seja contra quem for.
- Pergunta muito direta: É possível o Valadares Gaia terminar no pódio?
- Eu acredito que vamos fazer tudo o que estiver ao nosso alcance para alcançar o melhor possível. Se esse for o melhor possível, então...

"As pessoas sentem realmente o clube e apoiam o feminino"
- Com nove vitórias nos últimos 10 jogos e com apenas um ponto a menos do que em toda a época passada, como analisaria esta temporada do Valadares Gaia? O que permitiu que a equipa fizesse melhor?
- Antes de tudo, tenho de dizer que estou feliz por estar aqui. Fazer comparações é sempre complicado, mas acho que estamos na posição em que estamos porque o Valadares conseguiu ser consistente e houve muitas equipas que não conseguiram alcançar essa consistência que nós estamos a ter. Por isso, talvez dê a impressão de que estamos melhores este ano, até pelos pontos que temos. Mas, se formos analisar, por exemplo, o ano passado, na segunda jornada, ganhámos ao Sporting, e nesta primeira volta perdemos em casa. Ou seja, não é, para mim, algo comparável, porque o campeonato é diferente e as equipas estão numa forma diferente.
- O Valadares é um histórico no feminino. O que pode dizer-nos sobre o projeto?
- O Valadares oferece algo que, em termos económicos, pode não ser o melhor em comparação com os grandes clubes, mas em termos de envolvimento e apoio é único. As pessoas do Valadares sentem realmente o clube e apoiam o futebol feminino, e isso é algo que me agrada muito. Em termos de condições, o Valadares melhorou significativamente do ano passado para este ano. Temos agora melhores condições de trabalho, e a aposta na equipa técnica tem sido uma das mudanças.
Embora o Valadares ainda enfrente algumas dificuldades, tem conseguido acompanhar, de forma admirável, o crescimento do futebol feminino. É um clube histórico, mas sabemos que, infelizmente, muitos clubes históricos estão a desaparecer. O Valadares tem conseguido manter-se, e isso é muito positivo. Relativamente à época passada, posso dizer que o clube tem feito um esforço enorme para melhorar as condições de trabalho das jogadoras, e estamos cientes desse esforço. Isso é algo que nos motiva e que faz toda a diferença.
- Consegue nomear algumas diferenças?
- Neste momento, temos GPS. Embora não estejamos a treinar em casa, no complexo desportivo do Valadares, estamos a treinar no campo da Lavandeira, que, por si só, já representa uma melhoria nas condições. O campo da Lavandeira é um sintético de última geração, o que faz toda a diferença em termos de qualidade.
Em relação à equipa técnica, temos mais dois elementos a trabalhar connosco este ano. Não quero de maneira nenhuma comparar a equipa técnica deste ano com a do ano passado, mas o investimento em recursos como os GPS é algo que realmente nos ajuda.

"Benfica e Sporting? Acredito que é possível vencer"
- Na primeira volta, a primeira derrota foi contra o Marítimo, mas na segunda volta conseguiram vencer. Depois, perderam contra o SC Braga, mas agora venceram. Perderam também contra o Benfica e o Sporting... Acha que é possível vencer agora essas duas equipas?
- Acredito que é possível, mas não foi apenas porque ganhámos ao SC Braga, foi porque já acreditava que era possível. Claro que sabemos que, neste momento, são as duas melhores equipas em Portugal. Contudo, o Valadares está num bom momento e gostaríamos que esse momento se prolongasse pelo maior tempo possível.
- Há uma diferença vísivel em termos de investimento para esses dois clubes. Mas isso não é sinónimo de que Benfica e Sporting ganhem todos os jogos, naturalmente. O que eu queria saber é como é que vocês tentam contornar essas diferenças?
- Acho que o segredo é não pensar demasiado nisso, honestamente. Não importa se é A, B ou C. Acreditamos que é possível e que podemos lutar até ao fim. Além disso, temos um plantel jovem, o que também é muito importante. Existem jogadoras que querem chegar mais longe, como eu. Há jogadoras que sonham em alcançar outros patamares e até chegar à seleção nacional. Portanto, temos uma oportunidade de mostrar que conseguimos fazer coisas boas, que estamos a evoluir e a trabalhar para um dia alcançar esses patamares. Eu vou dar tudo, porque se ela está ali, eu também posso estar. Este é o nosso pensamento.

- O vosso plantel tem apenas uma jogadora (Jennie Lakip) acima dos 30 anos. É essa tal 'fome' associada à juventude que é o tal segredo de que fala?
- Sim, totalmente. Temos condições e estamos a provar, ano após ano, que isso é possível. Claro que, numa carreira, há fases de tudo. Há momentos em que jogamos mais, outros em que jogamos menos. Mas isso é futebol. Eu posso estar bem, mas se a jogadora na minha posição também estiver, tenho de aguardar a minha vez e, quando surgir a oportunidade, demonstrar que estou preparada.
Acho que o segredo também está nisso. Sentimos que estamos num bom contexto, porque os grandes olham para o Valadares e percebem: 'Ok, há qualidade, são jogadoras jovens...'. E nós sabemos disso. Sou uma das mais velhas, e tenho 24 anos. Há muita qualidade no Valadares. São jogadoras que estão prontinhas para dar o salto para outros patamares. Como o Mister Zé Nando diz muitas vezes: 'Vamos dar o nosso melhor para nos valorizarmos a todos.'.
- Em entrevista recente ao Flashscore, a Mackenzy Cherry dizia que o Valadares tinha um dos melhores grupos que tinha apanhado. Comprova isso?
- Acho que temos um grupo de trabalho muito focado no treino. Além disso, somos muito humanas, o que ajuda imenso. Em termos de grupo, considero-nos bastante equilibradas. Existem grupos com personalidades mais fortes ou até mais difíceis, mas conseguimos manter o equilíbrio, porque, no fundo, somos todas pessoas... Damos muita confiança umas às outras, o que é muito positivo. Por exemplo, estou numa fase em que não tenho jogado tanto quanto no início da época, mas isso não me incomoda porque tenho um grupo que me dá confiança todos os dias.
- O mister Zé Nando também se adaptou bem ao contexto do feminino...
- Acho que ele tem demonstrado que se enquadra perfeitamente. Os resultados falam por si, as estatísticas falam por si.

"As jogadoras começam a acreditar que é possível ter uma carreira em Portugal"
- O que espera que esta reta final de época, juntamente com o que fez na temporada passada, lhe traga em termos de perspetivas futuras? E como se sente, aos 24 anos, em relação ao seu futuro?
- O que está na minha cabeça é que quero dar o meu melhor até ao final da época, marcar o máximo de golos possível e ajudar a equipa da melhor forma, porque sei que isso é muito importante. Ajudar a equipa a atingir os seus objetivos coletivos também vai ajudar-me a nível individual. Apesar de estarmos bem onde estamos, sonhamos sempre com outras coisas. Tenho 24 anos, já estou a afirmar-me há alguns anos, e o pensamento vai neste sentido: melhores contratos, melhores salários, melhores condições de trabalho e, quem sabe, a seleção nacional.
- A Cris falou na possibilidade de ir para fora, mas gostava de saber qual a sua visão sobre a Liga portuguesa. Qual o futuro?
- O caminho faz-se caminhando. Acho que estamos num percurso em crescimento. Claro que há coisas que estão a melhorar e outras que nem tanto, mas as coisas não acontecem da noite para o dia. Há um caminho a seguir, muitas coisas para desconstruir e outras para construir. Mas, no geral, a minha perspetiva é muito otimista. A Liga está muito competitiva, com muitos clubes a crescer, com boas estruturas, e vários deles também presentes na primeira liga masculina, o que fortalece o futebol feminino.
A minha visão é bastante positiva: a Liga está a evoluir, com melhores contratos, melhores salários e melhores condições para as jogadoras. As jogadoras começam a acreditar que é possível ter uma carreira em Portugal, afirmar-se cá e, depois, dar o salto para outros patamares. Portanto, acredito que o futuro da Liga é promissor.
- Jogar no estrangeiro sempre foi um objetivo para si, ou esse interesse surgiu mais recentemente?
- Sim, sempre foi um objetivo. Com o crescimento da Liga, talvez essa ideia demore um pouco mais a surgir… Ou seja, já não sentimos tanta necessidade de procurar logo ir para o estrangeiro. Hoje em dia, temos esperança no que está a acontecer no nosso país e no futebol feminino cá, e queremos dar o nosso contributo para que a Liga cresça. A Liga cresce com boas jogadoras, jogadoras de qualidade. Mas claro que a ideia de jogar no estrangeiro está sempre presente. Portugal está a crescer, mas depois de nos afirmarmos aqui, inevitavelmente pensamos noutras ligas.
- Sente que já fez o suficiente para merecer uma oportunidade numa equipa superior em Portugal e também na Seleção?
- Continuo a sentir que sim, mas o que poderá ter faltado? Talvez estatísticas, não sei...
- Acredita que, se tivesses tido a oportunidade, estaria à altura de...?
- Sinto que hoje estou melhor preparada do que estava há um ano. Tenho mais maturidade e uma outra forma de olhar para o jogo, com novas valências. Por exemplo, ao jogar contra equipas grandes, como o SC Braga, sou capaz de entrar e definir o jogo. Acho que isso é um reflexo de crescimento individual e de maturidade.

"Sou uma jogadora do coletivo, ambiciosa e com uma mentalidade competitiva forte"
- Olhando para a sua carreira até agora, sente que o futebol foi a melhor coisa que lhe aconteceu?
- Sim, valeu totalmente a pena, independentemente do que aconteça daqui para a frente. Esta é a minha zona de conforto, é como jogar entre linhas. O futebol deu-me muito, e eu sou uma pessoa mais feliz por ter a oportunidade, neste momento, de ser profissional.
- Além das suas reconhecidas qualidades como futebolista, o clube que contratar a Cris pode contar com o quê?
- Acho que, enquanto pessoa, sou uma jogadora do coletivo, muito ambiciosa e com uma mentalidade competitiva forte. Contribuo para um espírito de grupo positivo.

- Como gostaria de ser recordada quando decidir um dia terminar a sua carreira?
- Gostaria que as pessoas olhassem e pensassem: 'A Cris era uma pessoa com boa energia, durinha, com uma mentalidade competitiva, mas também uma pessoa boa, com um bom coração.' Era isso que eu gostaria.
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