É um campeonato que acaba por ficar marcado na história do futebol português, à boleia do principal acontecimento da história do país no século XX.
Quando a bola começou a rolar, a 8 de setembro de 1973, Portugal estava no 40.º ano do Estado Novo iniciado em 1933 e que teve em António de Oliveira Salazar a principal figura do regime (cujo precursor foi a Ditadura Nacional em 1928). A 19 de maio de 1974, quando o Sporting foi coroado campeão nacional, o país estava a construir-se enquanto democracia num período quente que iria culminar na constituição de 1976.
50 anos volvidos, sempre em liberdade, a Liga apresenta uma face muito diferente. A prova foi alargada para 18 clubes, enquanto na altura era disputada por apenas 16, sendo que desses apenas seis sobrevivem no principal escalão: Sporting, Benfica, FC Porto, Vitória SC, Farense e Boavista.
A geografia do futebol era também bastante diferente. Se atualmente vemos uma predominância da região Norte (com especial destaque para a concentração no distrito de Braga), em 1973/74 a balança estava mais equilibrada. O distrito de Lisboa apresentava quatro emblemas (Belenenses e Oriental juntavam-se a águias e leões), Setúbal tinha outros quatro (CUF, Vitória FC, Montijo e Barreirense), seguiam-se o Porto (FC Porto, Boavista e Leixões) e Faro (Farense e Olhanense), como os mais representados, sendo que também Aveiro (Beira-Mar), Braga (Vitória SC) e Coimbra (Académica) tinham presença.
Primeiros jogos em liberdade
O 25 de abril de 1974 foi a uma quinta-feira. Em semana de competições europeias (o Sporting foi eliminado na Alemanha pelo Magdeburgo da Taça das Taças. na quarta-feira), o futebol regressou apenas no fim de semana, com a disputa da Taça de Portugal.
Sábado marcou o arranque dos oitavos de final, com o Atlético CP a receber o Farense na Tapadinha e o Boavista a defrontar o Famalicão. No Bessa, de resto, sentiam-se os efeitos de mudança. Com as forças militares todas mobilizadas, a segurança dos jogos estava comprometida, mas a Junta de Salvação Nacional enviou um destacamento para permitir a realização da partida (que teve menos público que o habitual).
O Boavista goleou por 5-1, com destaque para Acácio Casimiro. O médio bisou e foi o primeiro a fazê-lo em liberdade. Se foi o primeiro a marcar no pós-25 de abril não existem certezas, uma vez que Atlético CP e Farense também estavam a jogar ao mesmo tempo e empataram a uma bola.
Recorde de golos e stop ao tetra
Esta época fica também marcada por um recorde que ainda se mantém até à atualidade. Hector Yazalde marcou 46 golos em 29 jornadas e sagrou-se melhor marcador, com larga margem para Duda (24 tentos pelo Vitória FC) e Eusébio (16 golos pelo Benfica).
Por aí também se explica a conquista do campeonato pelo Sporting, orientado por Mário Lino. Os leões são os primeiros campeões em liberdade. Conquistaram o título com 49 pontos, mais dois que o Benfica, depois de uma goleada ao Olhanense (5-0). Foi o 14.º título dos leões, que colocaram um ponto final num tetra encarnado pela segunda vez consecutiva (tinham feito o mesmo em 1970).
Pavão
Esta edição do campeonato ficou, também, marcada por um evento trágico. A 16 de dezembro de 1973, Pavão caiu inanimado no relvado das Antas diante do Vitória FC, quando estavam decorridos 13 minutos.
À noite confirmou-se a pior notícia: Fernando Pascoal Neves, um médio transmontano que brilhava com a camisola do FC Porto, faleceu com 27 anos. As exéquias realizaram-se a 18 de dezembro, com Eusébio da Silva Ferreira a comparecer para protagonizar uma das imagens mais marcantes da altura, enquanto fitava o caixão.
Lei da opção
O 25 de abril de 1974 acabou por acelerar uma das grandes mudanças no futebol português do século XX. Até então, os atletas encontravam-se com a liberdade profissional constrangida pela Lei da Opção: Após o término dos contratos, os clubes podiam manter os jogadores com uma oferta de 60 por cento do salário proposto por outro clube.
Constituído em 1972, o Sindicato dos Jogadores Profissionais de Futebol acelerou a luta para acabar com esta situação e que abriu todo um mundo aos atletas no que toca a transferências.