Vitória de Guimarães (2005/06), Paços de Ferreira (2013/14) ou Arouca (2015/16) são exemplos que ajudam a perdurar um dos grandes mitos do futebol português: as competições europeias são um problema para as equipas fora daqueles que habitualmente pontuam os quatro primeiros lugares da Liga (Benfica, FC Porto, Sporting e SC Braga).
Com Portugal a dispor atualmente de seis lugares de qualificação para os torneios continentais (três na Liga dos Campeões, um para a Liga Europa e dois para a Liga Conferência) existem duas equipas por temporada que gozam da oportunidade de experienciar o futebol europeu. Mas será isso uma bênção sob disfarce?
Os problemas são fáceis de identificar. A necessidade de incrementar qualidade num plantel que acaba por perder as principais figuras (valorizadas após uma boa época), muitas vezes com um novo treinador, e com o arranque oficial da época antecipado (as pré-eliminatórias europeias arrancam antes do início do campeonato, por norma) são obstáculos extra no planeamento de clubes em que muitas vezes é preciso ser inventivo com as contas.
Fazer melhor é difícil
Nas últimas 10 temporadas completas (ou seja, desde 2011/12), 10 equipas conseguiram o apuramento para as provas europeias. Dessas só Académica e Estoril conseguiram melhorar de uma temporada para a outra.
Os estudantes são um caso particular. Em 2011/12 terminaram no 13.º lugar, mas garantiram a fase de grupos da Liga Europa por via da conquista da Taça de Portugal. Na época seguinte terminaram na 11.ª posição.

A equipa da Linha gozou um período de sucesso com Marco Silva e entre 2012 e 2014 conseguiu dois apuramentos seguidos, melhorando a classificação (quinto em 2012/13 e quarto em 2013/14).

A queda
No lado oposto temos os dois casos acima mencionados. Após uma época fantástica com Paulo Fonseca, em que garantiu o acesso às pré-eliminatórias da Liga dos Campeões, o Paços de Ferreira caiu do terceiro lugar (2012/13) para o 15.º (2013/14) e a despromoção ao segundo escalão. Pelo meio, uma passagem europeia sem brilho (eliminado com duas derrotas na Champions pelo Zenit, e sem triunfos num grupo Fiorentina, Dnipro e Pandurii).
Seguiu-se o Arouca. Lito Vidigal colocou a equipa da Serra da Freita no quinto lugar (2015/16), sendo que na época seguinte passou para o 17.º posto. Pelo meio acabou eliminado no play-off da Liga Europa, às mãos do Olympiacos.
O caso mais recente é o do Rio Ave. Quinto classificado em 2019/20, a equipa de Vila do Conde ficou às portas de um épico apuramento para a fase de grupos da Liga Europa (2020/21) ao perder nos penáltis com o gigante AC Milan. Meses depois foi despromovido, goleado no play-off pelo Arouca.

Um raro bis
Outra nota que existe a destacar é o facto de serem poucas as equipas que repetiram presenças europeias consecutivas. Durante o período observado, Paços de Ferreira, Marítimo, Estoril, Rio Ave e Vitória de Guimarães conseguiram pelo menos dois apuramentos. Contudo, apenas a equipa da Linha (2012/13 e 2013/14) e os vimaranenses (2021/22 e 2022/23) é que o fizeram de forma consecutiva.
Nacional e Rio Ave ficaram a um ponto de o repetir.
O impacto inicial
A congestão do calendário inicial acaba por também se revelar como uma dificuldade extra. As primeiras jornadas do campeonato ficam no meio das pré-eliminatórias e isso costuma provocar uma gestão complicada para clubes que não estão, por norma, habituados a fazer dois jogos na mesma semana.
Prova disso são equipas como o Paços de Ferreira (2013/14) que perdeu as quatro primeiras jornadas e só venceu à sexta. O Belenenses (2015/16) só conseguiu somar os três pontos pela primeira vez na quinta ronda, mas a maior dificuldade vai para o Arouca (2016/17) que só à nona jornada somou a primeira vitória.

As exceções são o Estoril, que na segunda época de Marco Silva (2013/14) conseguiu vencer as duas primeiras jornadas, e o Vitória de Guimarães que repetiu o feito na época passada (2022/23).
Conclusões
Olhando para os factos, parece que é um daqueles lugares-comuns que se confirma. A grande maioria das equipas fora dos primeiros quatro classificados parece sentir dificuldades numa época em que tem de conjugar o calendário doméstico com as provas europeias.
Mais do que um cliché confirmado, um sinal de alerta do futebol português, que entra em 2023/24 ultrapassado no ranking da UEFA pelos Países Baixos e com menos um lugar na Liga dos Campeões.
