Reportagem Flashscore: Onde Viktor Einar se tornou Gyökeres

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Reportagem Flashscore: Onde Viktor Einar se tornou Gyökeres

Viktor Gyökeres e a famosa celebração
Viktor Gyökeres e a famosa celebraçãoProfimedia
Com 25 anos, Viktor Einar Gyökeres está a viver o ponto alto da carreira. Com 36 golos e 13 assistências em 39 jogos pelo Sporting, o avançado tornou-se um fenómeno em Portugal e não só. Por isso o Flashscore esteve na Suécia, em Estocolmo, onde tudo começou.

São 18:00 e à medida que vamos caminhando por um bairro de prédios, semelhantes em cor e estrutura, a noite começa a cobrir a terra e a condensação do ar começa a ficar visível do muito frio que se faz sentir. Estamos na capital da Suécia, Estocolmo, longe do centro onde fica o Palácio Real ou a famosa Drottniggatan (pontos essenciais para quem planeia uma viagem a esta metrópole com mais de 900 mil habitantes), mas num sítio que começa a ganhar cada vez mais fama.

Cercado por prédios de três lados e com uma pequena mata noutro, o Aspuddens Idrottsplats tem recebido uma atenção fora do comum no último ano. Foi aqui que, com seis anos, Viktor Einar Gyökeres começou a dar os primeiros pontapés na bola e arrancou uma carreira que está agora a atingir o estrelato. 

Aspuddens Idrottsplats
Aspuddens IdrottsplatsBruno Henriques/Flashscore

Mais um jornalista” brinca Björn Thuresson, uma figura alta, com uma barba branca que sobressai por entre quem ali anda. O presidente do Aspudden-Tellus, recebe-nos com um aperto de mão afável, enquanto se desdobra para falar connosco e com outros colegas da imprensa sueca que também acorreram ao pequeno estádio onde treinam em conjunto equipas de crianças e raparigas adolescentes, lado a lado, com camisolas azuis ou amarelas. São alguns dos 1300 atletas que estão inscritos no clube.

Björn Thuresson, presidente do Aspudden-Tellus
Björn Thuresson, presidente do Aspudden-TellusAspudden-Tellus/Facebook

Receita: Jogar Futebol

Certamente serão poucos os adeptos que ouviram falar no Aspudden-Tellus. Um pequeno clube a Sul de Estocolmo, é completamente amador (ninguém recebe entre jogadores e treinadores) e tem uma equipa feminina que disputa a segunda divisão, enquanto os homens estão no terceiro escalão. “Não é importante subir de divisão, queremos ter os nossos jogadores locais e se somos bons para estar na segunda, vamos disputar a segunda, se é na terceira divisão que devemos estar, vamos contentes”, atirou Björn.

Muito longe daquilo que podemos imaginar como uma academia de elite de futebol (como Sporting, FC Porto ou Benfica têm) ou das instalações de alguns dos emblemas de topo de Estocolmo como os primodivisionários AIK, Djurgardens ou Hammarby, o Aspudden conseguiu manter Viktor Gyökeres até aos 16 anos nas suas fileiras, altura em que partiu para Brommapojkarna, talvez o quarto emblema da capital sueca em termos de estatuto. 

Viktor Gyökeres no Aspudden-Tellus
Viktor Gyökeres no Aspudden-TellusAspudden-Tellus/Facebook

Pouco usual num mundo onde ouvimos falar de Zaire-Emery a liderar o meio-campo do PSG com 18 anos, em que os jovens jogadores são cada vez mais lançados cedo e atingem um estatuto e estrela. Aliás, olhando para o futebol sueco, este ano viu sair no inverno um adolescente (Jonah Kusi Asare, por 4,5 milhões de euros para o Bayern Munique) sem sequer ter feito a estreia na Allsvenskan.

Por isso, qual foi a receita para manter Gyökeres durante tanto tempo no pequeno Aspudden?

É pouco comum o Viktor (é com esta familiaridade que é tratado durante toda a conversa) ficar tanto tempo no primeiro clube. Da forma que eu vejo existiram dois fatores: Ele gostava mesmo de jogar com os amigos, com quem estava aqui desde os cinco anos. E viva aqui perto, o pai era um dos treinadores. Isto era de fácil acesso, podia vir aqui e jogar. Ele estava sempre aqui com os amigos, mesmo que não existisse treino, e isso era ótimo para ele. O nosso modelo é dar oportunidade de jogarem futebol. Temos preços baixos, não somos uma academia, nem um clube de elite. Damos acesso a quem quer jogar futebol e o máximo possível. Por isso ele pôde jogar mais futebol aqui. Se tivesse ido para uma academia, podia ter ficado no banco ou enfrentar outro tipo de situações. Aqui ele sabia que jogava sempre, era um dos melhores e era titular. Isso ajudou a ficar aqui mais tempo”, explicou Björn Thuresson.

É também este ambiente familiar que se torna uma dificuldade para uma FIFA cada vez mais focada num futebol profissional e modelado enquanto negócio. Como clube formador de Gyökeres, o Aspudden-Tellus tem direito a 1% dos 5% do mecanismo de solidariedade (verba destinada aos clubes da formação) afetos à transferência de 20 milhões de euros do Coventry para o Sporting. São cerca de 250 mil euros que vão ser utilizados para melhorar as infraestruturas do clube, mas que tardam em chegar.

O dinheiro vai ser utilizado para melhorar as instalações e para proporcionar mais futebol a estes jovens, mas é um processo complicado. Todas as semanas recebo um pedido da FIFA para entrar num site e detalhar coisas como faturação, bilhética – não cobramos dinheiro a ninguém para assistir aos nossos jogos –, direitos televisivos (ri-se), a estrutura do clube – o nosso organigrama é a Direção e… os sócios. Não é um modelo adaptado a um clube com as nossas características”, desabafou. 

A evolução

Nos 11 anos que passou a jogar neste relvado sintético, onde dos lados ainda se consegue discernir alguns montes de neve, conservados pelo frio que se faz sentir na capital sueca (já esteve pior, garantem) Gyökeres já mostrava as qualidades que fazem dele agora o principal nome de um Sporting que se afirma como, talvez, o principal candidato ao título nacional.

Desde o início que ele era muito dedicado e focado, muito sério. Não queria saber de muitas coisas e isso trazia algumas consequências. Detestava perder e não dizia coisas simpáticas aos colegas quando eles não estavam bem. Acho que isso se notou mais quando chegou ao Brommapojkarna, ondes alguns lhe pediram para ter calma, mas ele dá 100% em cada treino. Faz parte da personalidade dele, é provavelmente a razão para ter sucesso”, explicou-nos o presidente que vai falando enquanto observa o treino, reconhecendo já a capacidade física do agora avançado leonino: “Sempre foi um jogador poderoso, muito agressivo. Quando o físico dele acompanhou, aos 15 anos… Se aparecia alguém à frente dele era melhor sair do caminho. Os golos que ele marcava aqui, sempre em direção à baliza, são os mesmo que vemos agora”.

Os jovens no treino, como Gyökeres quando chegou ao clube
Os jovens no treino, como Gyökeres quando chegou ao clubeBruno Henriques/Flashscore

No entanto, existe uma coisa que mudou. Como todos os bons avançados, Viktor Gyökeres tem aquela característica que todos precisam, mas que gera sempre críticas: só ter olhos para a baliza. Contudo, a época no Sporting tem demonstrado que o goleador também não se importa de deixar os golos para os outros. Melhor marcador da Liga, Gyökeres só é superado em assistências (tem nove) por Pedro Gonçalves (10) e Rafa (11).

Durante muito tempo ele tinha dificuldades a passar, só tinha olhos para a baliza, era um avançado puro. É muito bom ver que ele agora no Sporting faz assistências, porque é uma coisa que ele não fazia quando jovem. Mas lá está, quando se é jovem tem um perfil, mas depois cresces e ganhas mais qualidades. Fico muito contente por saber que ele está a crescer”, atirou.

A máscara

É a questão do milhão de euros. O  estilo de jogo de Viktor Gyökeres é cada vez mais reconhecido e assim que dizemos o nome dele lembramo-nos de corridas pelo meio-campo ofensivo com a bola controlada e um defesa desesperado por travar aquilo que parece uma locomotiva que só tem uma estação no horizonte: a baliza. Contudo, o que acontece depois do golo continua a deixar muitas interrogações. 

A corrida para os adeptos e as duas mãos a tapar a cara, deixando apenas os olhos visíveis. Uma imagem de marca que já se vê um pouco por todo o lado em Portugal, quer sejam crianças a jogar no recreio ou outros jogadores que acharam piada. Mas também aqui na Suécia a moda já pegou e quando falamos com os mais novos sobre Viktor Gyökeres, não tem dúvidas e lá surge o gesto. Até nas linhas laterais, os pais imitam o gesto quando se ouve falar do avançado leonino.

As crianças emulam a celebração de Gyökeres
As crianças emulam a celebração de GyökeresBruno Henriques/Flashscore

Contudo, qual é o verdadeiro significado?

Toda gente pergunta. Ele sempre foi muito esquivo. Ninguém sabe. Não disse a ninguém. Aparentemente alguns dos amigos mais chegados não sabem, ele não disse nada. Eu não tenho ideia. Aqui alguns miúdos fazem. Porque se tornou algo reconhecível”, asseverou Björn Thuresson, que atesta também o crescimento da fama do jogador na Suécia: "Não há muita gente que acompanhe o Championship (segundo escalão de Inglaterra, onde estava o Coventry), mas o Viktor já se tornava conhecido porque participou numa digressão de inverno com a seleção da Suécia. Agora que ganhou o lugar mais regular na equipa nacional já mais gente o conhece e se apercebe do sucesso dele. Alguns ainda podem dizer que é só em Portugal, mas é um campeonato com bons jogadores, melhor do que o nosso por exemplo”.

"Com seis ou sete anos já dava para perceber que era focado que queria ganhar. Estamos orgulhosos dele e as crianças olham para o Viktor e querem imitar", asseverou-nos Göran, o primeiro treinador de Gyökeres, que se encontra a observar os jovens no relvado.

Deixamos o estádio com o treino a decorrer enquanto um grupo de escuteiros se reúne para mais uma atividade, numa sede que se encontra dentro do perímetro do campo. Dificilmente é o ambiente de elite em que cresceram a maior parte dos jogadores profissionais, habituados a academias isoladas onde fazem a vida com apenas um foco: serem profissionais. Mas foi esta a receita simples que ajudou a Viktor Einar a tornar-se em Gyökeres, o nome que está marcar o futebol português em 2023/24.

Reportagem de Bruno Henriques
Reportagem de Bruno HenriquesFlashscore