Tudo começou em Cocoa Beach, na Flórida (Estados Unidos), quando o maior surfista de todos os tempos pegou pela primeira vez na prancha, com cinco anos, e desaguou agora em Margaret River, na Austrália, a última prova em que competiu enquanto membro do circuito principal da Liga Mundial de Surf (WSL) e que terminou este domingo.
Desde que entrou para a elite, no longínquo ano de 1991, Slater venceu inigualáveis 56 eventos, incluindo a etapa portuguesa, na Praia de Supertubos, em Peniche, em 2010, sagrando-se hendecacampeão e com cinco títulos consecutivos entre 1994 e 1998.
É ainda o mais jovem (20 anos) e o mais velho (39 anos) a conquistar o título mundial, algo que conseguiu em 1992, de 1994 a 1998, 2005, 2006, 2008, 2010 e 2011.
Prestes a ser pai pela segunda vez, o King Kelly foi vítima do corte do meio da época da WSL (tal como o português Frederico Morais), sendo despromovido (32.ª posição) para o circuito secundário pelo segundo ano consecutivo, e, depois de falhar o objetivo assumido de disputar os Jogos Olímpicos de Paris 2024, tal como acontecera com Tóquio 2020 (estreia da modalidade nos Jogos), o adeus parece inevitável.
Parece porque foi a palavra usada por Slater no final da sua última bateria, no Oeste australiano, que teve tons de despedida, mas não definitiva, porque, depois de chorar e de falar num fim de ciclo, mostrou-se disponível para voltar a vestir a licra de competição como convidado para alguns eventos da WSL.
"Parece que é o fim. Se não te adaptas, não consegues sobreviver. Eu não estava motivado para dar 100% como todos estão agora", lançou o mestre dos mind games (jogos mentais) à WSL, acrescentando que viveu uma "vida incrível e rica em memórias".
Mas, questionado sobre se aceitaria voltar a desafiar os melhores do mundo, Kelly foi rápido e afirmativo, nomeando logo as três ondas que mais gosta, todas grandes e tubulares, pois claro: Pipeline (Havai), Teahupo'o (Taiti) e Cloudbreak (Fiji).
Por isso, é muito provável que volte à ação e até mais cedo do que o previsto, já que a etapa do Taiti (que venceu cinco vezes) é em maio e a de Fiji (que venceu em quatro ocasiões) é em agosto.
Quanto à onda rainha do surf mundial, Pipeline, só o rei poderia tê-la vencido oito vezes e ainda querer mais, com a curiosidade de ter obtido o seu último triunfo lá há apenas dois anos (2022), já cinquentão, precisamente 30 anos depois da sua primeira vitória no mesmo pico, o seu favorito.
Certo é que Robert Kelly Slater é global, tendo conquistado etapas nos quatro cantos do mundo: Austrália (12 vezes), Estados Unidos (11), Havai (oito), França (seis), Taiti (cinco), Fiji (quatro), África do Sul (quatro), Brasil (três), Japão (três), Porto Rico, Portugal, Espanha, Ilhas Reunião e Indonésia.
Uma carreira riquíssima em conquistas, também fora de água, já que chegou a ser ator de Hollywood, participando na icónica série televisiva Baywatch, onde conheceu Pamela Anderson, com quem teve um mediático romance.
Também teve momentos baixos, como todos os mortais, que até o levaram a fazer uma pausa na competição, entre 1998 e 2001. Como sempre, Kelly deu a volta por cima e, no momento da despedida, olhando para trás, admitiu que tudo valeu a pena.
"São tantas emoções, durante tanto tempo. Nem tudo foi cor de rosa, mas foram os melhores momentos da minha vida", resumiu o homem que não se limitou a dominar a arte do surf no mar e não descansou enquanto não criou uma piscina de ondas perfeitas, o Surf Ranch.
Para Kelly, um dos melhores desportistas de sempre, que desafiou a idade e as melhores ondas do mundo, e atravessou praticamente todas as gerações do surf profissional, não há, nem pode haver, uma reforma oficial. Slater é eterno.