Reportagem Flashscore: Gonçalo Feio, o português por trás do maior escândalo do futebol polaco

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Reportagem Flashscore: Gonçalo Feio, o português por trás do maior escândalo do futebol polaco

A imagem de Gonçalo Feio criada pelos adeptos do Motor Lublin
A imagem de Gonçalo Feio criada pelos adeptos do Motor Lublin Motor Lublin
Gonçalo Feio, treinador português de apenas 33 anos, em estreia como treinador principal esta temporada, foi manchete de jornais na Polónia durante toda esta semana. Motivo? Mandou o presidente do seu clube, o Motor Lublin, para o hospital. Resultado? Tornou-se um herói de milhares de adeptos do clube, com todos os jogadores e o acionista maioritário do clube a seu lado. O Flashscore traz-lhe a reportagem exclusiva por trás de toda esta história.

Chama-se Gonçalo Feio, tem 33 anos, é português mas a carreira de treinador tem sido quase feita toda na Polónia, com uma pequena passagem pelo Xanthi, da Grécia, pelo meio. Começou no Legia, como observador, depois no Wisla Cracóvia, como adjunto, passou para o RKS Rakow, nas mesmas funções, até esta temporada ter assumido, pela primeira vez, o comando de uma equipa principal, o Motor Lublin, da 2.ª Liga do futebol polaco.

Esta semana, o Comité Disciplinar da Associação Polaca de Futebol (Komisja Dyscyplinarna PZPN) anunciou a abertura de um processo disciplinar contra Gonçalo Feio. Tanto ele como outras testemunhas foram chamadas a prestar depoimento a 16 de março, uma vez que os relatos escritos diferem drasticamente em relação aos acontecimentos. Gonçalo Feio pode acabar com uma multa, pode ser suspenso ou pode mesmo ver-lhe ser retirado o curso UEFA Pro, a única forma que o habilita a poder ser treinador de uma equipa principal.

Da conferência à agressão no gabinete

E o que se passou, afinal, com Gonçalo Feio? O Flashscore conta-lhe tudo nesta reportagem exclusiva.

Foi no passado domingo que o treinador português do Motor Lublin agrediu o presidente do clube, Pawel Tomcyk. O dirigente terminou essa noite coberto de sangue, num hospital, depois de ter sido atingido por uma bandeja de documentos. Levou pontos na sobrancelha e vai avançar com um processo-crime contra Gonçalo Feio.

Quando todos esperavam que o treinador português fosse, obviamente, demitido por justa causa, o Motor Lublin marcou uma conferência de imprensa, com a presença do acionista maioritário, Zbigniew Jakubas, para anunciar... o contrário: Pawel Tomcyk, presidente do clube, foi suspenso por três meses e a assessora de imprensa, Paulina Maciążek, foi demitida de funções.

Gonçalo Feio teve um relacionamento difícil com ambos desde que chegou, tanto por divergências pessoais como de visão para o clube. As tensões dispararam em fevereiro e culminaram nos acontecimentos do passado domingo, dia 5. Os relatos apontam para uma altercação de Gonçalo Feio com a assessora, no final do jogo com o GKS Jastrzębie, quando os dois se dirigiam para a conferência pós-jogo. Maciążek disse, nessa altura, estar abalada e incapaz de dirigir a conferência, algo que Gonçalo Feio considerou pouco profissional, em voz alta, perante todos os jornalistas presentes.

No final dessa conferência Gonçalo Feio foi então confrontado pelo presidente, Pawel Tomcyk, acusando o treinador de querer envergonhar a assessora e de maus tratos infligidos a Paulina Maciążek. Foram os jornalistas a separar treinador e presidente. Porém, Gonçalo Feio seguiu Tomcyzk até ao seu gabinete, a discussão subiu de tom e a agressão aconteceu.

A ligação de Zbigniew Jakubas a Gonçalo Feio

Quando Zbigniew Jakubas anunciou, em conferência de imprensa, a sua decisão de manter Gonçalo Feio no comando técnico do Motor Lublin, afastando presidente e assessora de imprensa, as ondas de choque em toda a comunicação social polaca começaram. O treinador português, porém, está longe de ser a ovelha negra que muitos jornais polacos quiseram expor.

Conhecido por ser uma pessoa conflituosa, a verdade é que a divergência entre Gonçalo Feio e o presidente começou pela diferença de visão para o clube. E tudo porque Tomcyzk não conseguiu angariar patrocinadores, nem sequer um gabinete de marketing para os alcançar, a melhoria de instalações prometida não avançou e as relações problemáticas com a gestão das instalações - os estádios e os campos de treino são municipais, não são propriedade do clube - foram algumas das questões que levantaram tensões.

"Quando contratei Gonçalo Feio, disse para comigo: à terceira é de vez (o português foi o terceiro treinador contratado sob a égide de Jakubas como acionista maioritário). Se eu falhar com ele, vou deixar o clube. Por isso, enquanto ele estiver aqui, eu estarei aqui. Quando ele sair, também não me voltam a ver. Por isso façam figas, porque estamos todos juntos nisto", afirmou Zbigniew Jakubas na conferência de imprensa.

Vítima do seu próprio sucesso?

Gonçalo Feio é conhecido pelo temperamento, sim, as fontes com quem o Flashscore falou, e que não quiserem ser nomeadas, falam numa pessoa de difícil relacionamento, mas a verdade é que o treinador português ganhou reconhecimento através do trabalho efetuado. 

Desde que chegou ao Motor Lublin, Gonçalo Feio dedicou-se por inteiro ao clube, vivendo 24 horas para o projeto, partilhando cada minuto do seu dia a dia com a equipa. Quando o técnico assumiu a equipa, o Motor estava em último lugar. Com uma média de dois pontos por jogo, a equipa está no no oitavo lugar (em 18), e chegou aos quartos de final da Taça da Polónia, deixando pelo caminho dois favoritos e igualando o maior feito e sempre do clube, visto que a primeira e última vez que estiveram nessa fase foi em 1982. Caiu apenas diante do Raków Częstochowa (0-3), atualmente considerada a equipa mais forte do país.

O Motor Lublin continua a ser um dos últimos grandes clubes, das grandes cidades da Polónia, à espera de ser arrastado para o profissionalismo total. Lublin é uma cidade com 300 mil habitantes, que ganhou nos últimos anos um estádio moderno com capacidade para 15 mil pessoas, e que possui uma base de associados forte e tradicional. Foi isso que motivou o investimento de Jakubas, em 2020. O objetivo passa por chegar ao principal escalão, tornar-se suficientemente competitivo para evitar a descida de divisão e o acionista, bilionário natural da cidade de Lublin, acredita que será com Gonçalo Feio que atingirá essa meta.

A nova Arena Lublin, com capacidade para 15 mil pessoas
A nova Arena Lublin, com capacidade para 15 mil pessoasMotor Lublin

Subida a pulso, elevado a herói

Gonçalo Feio, com 33 anos, está na Polónia há mais de uma década. Começou pela base, como observador-vídeo do Legia, passou depois a adjunto do Wisła Kraków e Raków Częstochowa, passando assim pelos três maiores clubes do país. O seu profissionalismo, dedicação e devoção abriram-lhe então as portas para o cargo de treinador principal, muito embora o seu temperamento lhe tenha fechado outras.

Porém, para os adeptos e para quem realmente manda no Motor Lublin, Gonçalo Feio é intocável. Pelo menos por agora. Antes da conferência de imprensa de Jakubas, quando tudo apontava para o despedimento imediato do português, várias centenas de adeptos do clube marcaram presença em frente à Arena Lublin, numa manifestação de apoio ao treinador. E agora a tarja da claque passou a ter o rosto de Gonçalo Feio a acompanhar.

Mesmo que o seu comportamento recente tenha criado dúvidas, o trabalho de Gonçalo Feio convenceu os adeptos e todos acreditam que o treinador agiu para defender os interesses da equipa, tal como quando exigiu o investimento em infraestruturas, rejeitando comprometer as condições de trabalho do plantel.

E, depois dos adeptos, também o staff do clube passou a estar ao lado do treinador. Em vários perfis nas redes sociais, de administrativos a jogadores, a frase repete-se: "Treinador, estamos todos consigo."

Gonçalo Feio venceu a batalha e venceu a guerra. E já ficou na história do futebol polaco.