Entrevista Flashscore a Bernardeschi: "A Juventus é um bode expiatório do sistema"

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Entrevista Flashscore a Bernardeschi: "A Juventus é um bode expiatório do sistema"
Bernardeschi em ação pela Juventus contra a antiga equipa
Bernardeschi em ação pela Juventus contra a antiga equipaProfimedia
Federico Bernardeschi, ex-jogador da Juventus e da Fiorentina, campeão europeu com Itália e agora a estrela dos Toronto na MLS, falou exclusivamente ao Flashscore, recordando a sua controversa mudança da Fiorentina para a Juventus, que enfureceu os adeptos toscanos, o triunfo histórico com o país e muito mais.

O sol da Califórnia nada tem a ver com as temperaturas geladas que geralmente afetam Toronto nesta época do ano. Um clima de Primavera que tem vindo a acompanhar os dias de Bernardeschi há algumas semanas. Não são umas férias que o antigo jogador da Juve e Fiorentina está a aproveitar em Palm Spring, uma cidade a 170 quilómetros de Los Angeles e a um passo de um dos mais belos parques da Califórnia, Joshua Tree Park. O médio está a desfrutar do tempo na costa oeste dos Estados Unidos para se preparar para a nova temporada do MLS com o seu clube.

Federico Bernardeschi
Federico BernardeschiFederico Bernardeschi/Instagram

Depois de ter chegado ao Canadá com a temporada quase no fim - ainda a tempo de fazer 13 jogos, oito golos e três assistências - o campeão do Euro-2020 espera agora melhorar para levar Toronto novamente ao título - algo que o compatriota Sebastian Giovinco já alcançou  com os canadianos em 2017 - e regressar à seleção transalpina após o sucesso europeu.

Acompanhe aqui as incidências do encontro

Não apenas isso, como ainda alimenta a esperança de figurar no maior palco de todos- o Campeonato do Mundo.

"Absolutamente", diz Berna enquanto passeia pelos corredores do hotel californiano que acolhe a sua equipa, "ainda espero jogar no Campeonato do Mundo".

Entretanto, há uma nova época para preparar numa cidade onde já conquistou os adeptos, tornando-se a figura de cartaz do clube. Graças também às celebrações no final dos jogos, com gritos que se tornaram virais: "Vamos lá FC, muito bem feito. É espetacular".

"Tinha acabado de chegar a Toronto, por isso não sabia muito inglês. Depois, quando comecei a ver que a minha celebração se estava a tornar viral, decidi brincar um pouco, também para ser um pouco auto-depreciativo".

E Bernardeschi, que parece se ter encontrado na América do Norte, está a desfrutar da sua nova vida, longe do estilo de vida do futebol europeu e italiano.

É uma forma completamente diferente de experienciar o futebol e o desporto nos Estados Unidos e no Canadá, da forma como é vivido na Europa. Uma abordagem que o conquistou logo desde o início: "O que me impressionou desde o início foi a alegria de experienciar o desporto. Aqui, o desporto é vivido de forma totalmente diferente, como uma grande festa".

"As pessoas vão ao estádio para se divertirem, animarem a sua equipa e regozijarem-se ou sofrerem juntas. Depois, tudo fica por aí".

Federico Bernardeschi com as cores do Toronto FC
Federico Bernardeschi com as cores do Toronto FCProfimedia

Uma mentalidade totalmente diferente em comparação com Itália: "Aqui vai um exemplo. Vais ao cinema, vês um filme, se gostas ou não só o dizes no final. De certeza que não falas disso a semana toda... E é isto que deveríamos aprender, na minha opinião".

Esta cultura é um tipo de abordagem, ou melhor, de educação para o desporto, completamente diferente da forma como é vivida em Itália. No seu país de origem, é uma obsessão, que, segundo o médio, poder não ser muito saudável.

"A obsessão é uma espécie de sentimento doentio que é pouco saudável. Se, por outro lado, a paixão for incondicional, é uma sensação muito boa", acrescentou.

Excessos e obsessões muitas vezes condicionam e perturbam a vida diária dos futebolistas, à medida que estes se tornam alvos das exasperações dos adeptos. O próprio Bernardeschi sabe algo sobre isto, já que para os adeptos da Fiorentina caiu na categoria de traidores, aqueles que decidiram trocar a Viola pela Juventus. O médio ofensivo de Carrara, que passou 13 anos no clube toscano entre as camadas jovens e a equipa principal, foi um ídolo dos Fiesole.

Federico Bernardeschi com a camisola da Fiorentina
Federico Bernardeschi com a camisola da FiorentinaProfimedia

Em 2017, a transferência para os Bianconeri causou muita discussão, e para a forçar, o próprio jogador apresentou um certificado médico para não comparecer no campo de treino.

Os adeptos reagiram mal e atacaram-no publicamente, conforme explicou: "Também recebi várias tarjas", recorda o antigo número 10 da Fiorentina.

"No início foi um pouco difícil, mas depois, no final, nada de especial. Os adeptos julgam a escolha de um jogador, mas na realidade muito poucas vezes sabem como as coisas acontecem internamente".

Havia algo em particular no seu caso que não veio à luz do dia e que os adeptos não sabem? 

"Muita coisa. Talvez um dia eu lhes conte", diz Bernardeschi misteriosamente. Uma passagem que irritou os fiéis da Fiorentina, mas que, no entanto, foi vivida com serenidade pela pessoa em questão:

"Vivi-a muito serenamente. Aqueles que me conhecem, sabem realmente como a vivi. Posso dizer que tenho uma personalidade discreta que nunca me permitiu meter-me em problemas por causa dessas coisas".

Serenamente e com o espírito competitivo certo, experienciou também desafios como ex-jogador da Juventus. O primeiro, no Estádio Franchi, diante dos antigos adeptos que tiveram de sofrer um dos seus "desrespeitos": um golo através de pontapé livre na vitória por 2-0 dos Bianconeri.

"O primeiro como antigo jogador foi vivido com muita emoção. E foi bonito vivê-lo, foi um daqueles jogos que nos fazem sentir vivos, cheios de adrenalina".

Depois do golo celebrou diante dos mesmos adeptos que o tinham idolatrado alguns meses antes. Para alguns foi uma reacção como se quisesse tirar uma pedra do seu sapato.

"Acho que não havia nenhuma pedra em particular para tirar. Eu gosto sempre de dizer a verdade. Um dia falarei das coisas internas e fá-lo-ei porque, na minha opinião, há pouco para ver. Dentro do futebol há mil coisas que não se conseguem ver do exterior e mil coisas que se devem ver porque só assim se tem uma imagem mais clara da situação".

Tu falas, mas não dizes. Referes-te, talvez, à gestão por parte dos clubes que muitas vezes colocam os seus jogadores em apuros precisamente para ganhar alguma vantagem? 

"Absolutamente, mas há milhões de outras coisas", conclui, decidindo deixar o assunto fechado.

O jogo de domingo entre a Juventus e a Fiorentina será um jogo especial para outros dois ex-jogadores da Viola, Federico Chiesa e Dusan Vlahovic.

Ambos não têm conseguido encontrar uma forma consistente durante a primeira parte da Serie A devido a lesões e Bernardeschi vai ter a olhar posto sobre os dois jogadores enquanto vê o jogo agarrado ao preto e branco da Vecchia Signora.

"Estou definitivamente mais alinhado com a Juve", admite, acrescentando que espera uma partida interessante. "Será uma boa partida, Juve-Fiorentina é sempre uma boa partida. Penso que a Juventus tem mais hipóteses de ganhar, talvez graças à qualidade de alguns jogadores".

Os Bianconeri, renovados pela vitória contra a Salernitana, estão lentamente a voltar ao bom caminho. Após um início complicado, a equipa de Massimiliano Allegri tinha acelerado o ritmo antes de ser alvo de uma pesada penalização - uma dedução de 15 pontos devido a questões fora de campo, relacionadas com falsos ganhos de capital.

"Considerando o momento difícil que a Juve está a atravessar neste momento, penso que é normal que os meus antigos companheiros de equipa tenham sofrido um pouco de retaliação ou uma reação negativa. Eles são seres humanos, não robôs. Quer se queira ou não, estas coisas afetam-nos", acrescentou.

O castigo mudou os objecivos dos Bianconeri, agora em busca de pontos para salvar a época.

Bernardeschi deu a sua opinião sobre a justiça da sentença, pois ao seu estilo, não se esconde com escolhas de palavras: "É difícil ver apenas uma equipa atingida. Há algo que não está certo".

O que é que ele quer dizer? "Penso que não se deve ver apenas a ponta do iceberg. Também tem de se ver tudo o resto".

Podes explicar melhor? Achas que a Juve é uma espécie de bode expiatório para o sistema? "Bem, sim, porque a Juve é irritante. Porque a Juve ganha e sempre ganhou".

Federico Bernardeschi ao serviço da Juventus
Federico Bernardeschi ao serviço da JuventusBernardeschi/Instagram

E entre os problemas da Juventus está um que pode, por sua vez, afetar o próprio Bernardeschi que, juntamente com os antigos companheiros da altura, corre o risco de uma desqualificação de, pelo menos, um mês.

A história é familiar, com salários diferidos durante o período da pandemia na época de 2019-2020.

De acordo com os magistrados, o clube teria tentado fazer um corte salarial de quatro meses que nunca aconteceu. De facto, a equipa principal concordou, alegadamente, em cortar apenas o salário de um mês, tal como confirmado pelo antigo jogador da Juventus:

"Nós, jogadores, tivemos muito pouco a ver com isso. Se recebessemos uma desqualificação, aceitariamos, mas na minha opinião seria um buraco na água".

O jogador de Toronto entra nas especificidades do acordo com o clube nessa altura: "Sabíamos 0,1%. Cortamos um salário e fizemos o que nos foi pedido pelo clube. Não sabíamos mais nada. Fomos simplesmente ao encontro das dificuldades do momento que toda a Itália estava a viver. Pusemos a mão no coração e dissemos "podemos fazer isto" e fizemo-lo".

"Seguimos as instruções que nos foram dadas pela empresa. Fizemos um grande gesto da nossa parte para ajudar. Havia pessoas que estavam em perigo de perder os empregos. Isto foi-nos proposto e o éramos livres de aceitar ou não. Todos juntos, como equipa, aceitámos dar um sinal importante. Um gesto que eu faria de novo. Tudo o que veio depois não dizia respeito a nós, jogadores".

Bernardeschi com os antigos companheiros na Juve, incluindo Ronaldo
Bernardeschi com os antigos companheiros na Juve, incluindo RonaldoBernardeschi/Instagram

Bernadeschi pode estar de olho nas duas antigas equipas este fim de semana, mas a sua atenção irá em breve mudar para a campanha de 2023 dos Toronto na MLS. Para a equipa canadiana, ele é um jogador que teve a sua quota-parte de momentos que moldaram uma carreira perfeita para um novo desafio num novo continente. E aos 28 anos, ainda tem alguns passos a dar nesta caminhada.