2016. O início do pesadelo. O Atlético despede-se dos campeonatos profissionais ao ser despromovido ao Campeonato de Portugal. No ano seguinte, nova descida, desta feita à distrital da Associação de Futebol de Lisboa. Um autêntico murro no estômago. O futuro é incerto e as pessoas começam lentamente a afastar-se de uma realidade que não querem assumir.

Os cinco anos seguintes são dolorosos. Uma espécie de travessia no deserto na exigente e competitiva distrital lisboeta. Oportunidade para reorganizar, reestruturar e pensar o futuro. Depois de passagens por Alverca, Casa Pia e Sintrense, o treinador Tiago Zorro é desafiado a regressar também ele aos campeonatos distritais para um 'novo' projeto no Atlético, ainda longe de imaginar aquilo que o destino lhe tinha reservado.

Passo a passo, o Atlético sobe da 1.ª divisão da AF Lisboa para o Campeonato de Portugal, em 2021/22, e do CP para a Liga 3, em 2022/23, com a caminhada a desaguar num dos palcos mais míticos do futebol nacional e a medalha de campeão nacional.

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Um 'conto de fadas' inesperado, tendo em conta que o principal objetivo passava por "alcançar a manutenção de forma tranquila", mas totalmente recompensador pelas horas de trabalho investidas e superação constante de "toda a gente" numa época de muitas adversidades.

"Não, obviamente, que não estava à espera de chegar ao Jamor, nem no início deste ano projetámos tudo isto. Foi algo que aconteceu de forma natural. Fomos ganhando confiança com o passar do tempo. Viemos de campos pequeninos, sintéticos, maus pisos mesmo, para acabar a época num estádio como o Estádio Nacional. É sinal de que o sonho está sempre muito perto de se tornar realidade no futebol", confessa Tiago Zorro, em conversa com o Flashscore.

"Vimos coisas incríveis"

Domingo: campeão nacional no Jamor. Segunda-feira: dar aulas na escola onde leciona na zona de Alverca. "Tudo igual". Tiago Zorro transmite muita serenidade nas palavras. Aos 42 anos, o treinador está consciente do sucesso que alcançou, mas não se deslumbra. E esse estado de espírito, extensível a toda a equipa técnica, jogadores e staff, também faz parte do sucesso.

"Sempre disse que o Atlético não era mais forte do que ninguém, nem que havia nenhuma equipa muito mais forte do que nós. Este foi um lema muito nosso e que comprovámos tanto na primeira como na segunda fase, pois ficámos sempre com a ideia de que podíamos competir em qualquer jogo. Na segunda fase não perdemos mesmo nenhum jogo e chegámos ao Jamor", analisa.

E por falar em Jamor... Que significado teve esta conquista para as gentes do Atlético? "Ontem (domingo) vimos coisas incríveis. Muita, muita paixão! As pessoas a agradecerem-nos e a chorarem quando falavam connosco. As pessoas do Atlético são muito bairristas e gostam muito do clube. Algumas estiveram afastados durante alguns anos, mas é normal... Sentimos que as pessoas estão de novo a aparecer. E isso é muito importante."

"Por aquilo que me transmitem, o Atlético não levava tanta gente ao estádio desde a altura da Segunda Liga. As pessoas mexeram-se e apareceram em massa no Jamor. Foi um dia muito bom", remata Tiago Zorro.

É um Atlético (100%) português, com certeza!

Por estes dias, Tiago Zorro é um dos rostos mais visíveis do Atlético CP. Mas não é o único. O treinador distribui louros pela sua equipa técnica, composta por mais quatro elementos, e pelo grupo "fantástico" de jogadores que, juntos, conseguiram formar em Alcântara. Aliás, os olhares mais atentos descortinam rapidamente uma curiosidade no seio do plantel do Atlético: é 100% português. Explicação?

"Não é muito comum, é verdade, mas explica-se de forma simples. Só podíamos olhar para jogadores da zona de Lisboa, porque não tínhamos alojamento para oferecer e, então, proporcionou-se serem todos portugueses."

"Criámos um grupo incrível. Foi assim na distrital e foi assim neste segundo ano. Só assim foi possível ultrapassarmos todas as adversidades que nos apareceram ao longo da época", defende

"As equipas refletem muito o estado de espírito do grupo e eu acho que fomos sempre uma equipa feliz, que conseguiu tirar prazer daquilo que era o jogo. Isso deu-nos vantagem em relação às outras equipas", completa.

"O Lénio veio à experiência"

Lénio Neves é, unanimemente, reconhecido pela crítica como sendo o melhor jogador do Campeonato de Portugal, edição 2022/23. Aos 23 anos, o médio apontou 13 golos, um deles na grande final no Jamor, em 33 jogos, e assume-se como um dos principais ativos no mercado nos escalões secundários em Portugal.

"É uma história curiosa. O Lénio veio treinar à experiência ao Atlético no ano passado. Estava sem clube. Mas não temos só o Lénio, há mais nomes interessantes neste plantel que podem aspirar jogar mais acima", lembra Tiago Zorro.

Em relação ao seu próprio futuro, o treinador garante que ainda "nada está fechado" e que nos próximos dias vai reunir com a direção alcantarense.

"Ainda não consigo dizer muita coisa em relação ao meu futuro. Vamos sentar-nos com o Atlético e ver o que pode surgir."