Entrevista: "Não venho lavar o que quer que seja, venho falar para os benfiquistas. Já que me fecharam a porta, tenho de ter um lugar para falar. Ao fim destes anos todos, nem uma palavra de solidariedade dele (Rui Costa), não falou comigo. O presidente do Benfica tem de estar sujeito à crítica".
Benfica em crise: "Neste momento está em crise desportiva e financeiramente. Está sem gestão desde que Domingos Soares de Oliveira saiu".
Responsável: "Os presidentes têm de assumir a crise, já no meu tempo era assim, mas a pressão para mim não existia".
Crise: "O sinal que foi dado, que é a reestruturação da SAD do Benfica, ainda não o compreendi muito bem, pode aliviar um pouco. Toda a gente já se apercebeu. Toda a gente sabe quem indicou o Rui (Costa), fui eu. Sabia que tinha fragilidades em gestão, por isso é que disse 'poderás ser presidente do Benfica, mas não irás mexer nos quadros'. Ele mexeu e tem as suas consequências. Surpreendeu-me a forma negativa como tem gerido a parte desportiva do Benfica".
Pedido de desculpas: "A partir deste momento, tenho de dizer uma coisa aos benfiquistas 'desculpem-me porque eu errei'. Sou o responsável disso (Rui Costa como presidente), peço desculpa".
Mágoa com Rui Costa: "Eu seria sempre solidário com a pessoa e isso marcou-me profundamente. Quem não valoriza a história do Benfica e fica calado... Era proibido falar do meu nome do Benfica, acho que ainda é, mas não conseguem apagar a minha história. Não vão ter tempo. Não reconhecem o passado, e o meu passado no Benfica é grande, devo ser o presidente que mais mudanças fez no Benfica. Encontrei um Benfica que já não existia".
"Toda a gente já viu que o Rui Costa não é líder"
Motivos da crise: "Toda a gente já viu que o Rui Costa não é líder. A liderança não se aprende. Se quer continuar a liderar o Benfica em termos futuros, nesta fase tem de mudar de posição. Não pode permitir que as pessoas o tratem por Rui, ele é o presidente do Benfica. Nunca permiti que me tratassem por tu, tinha de ser presidente do Benfica. Estar a falar com o diretor desportivo e dizer 'mano, como vão os negócios'... Ele é o presidente da maior instituição do país".
Rui Pedro Braz: "Se eu estivesse no Benfica, não tinha a atitude que tem, nem tinha a liberdade que tem, não se passeava nos aeroportos com os jogadores. Eu coloquei-o lá dentro, passado poucos dias sucedeu o que sucedeu, vendeu um jogador e eu disse 'Rui, se venderes mais um jogador sem a minha autorização tens as contas feitas'".
Férias de Rui Costa: "Ele não aguenta a pressão e acho que fez muito bem em ir de férias. O início da época até agora foi demasiado violento para ele. Sei como é e dificilmente aguenta a pressão. Toda a gente sabe que eu não tinha férias, dava a cara por tudo".
Despedimento de Roger Schmidt: "Eu despedi o Fernando Santos na primeira jornada e sou muito amigo dele. Trabalhei com o Jesus durante seis anos, continuou contra toda a gente. Não havia uma pessoa que dissesse para continuar. O Rui Costa foi o primeiro (a dizer para sair). Um treinador que nos leva a todas as finais, é verdade que as perdemos, é porque existe trabalho. Eu continuei com Jorge Jesus e nas épocas seguintes ganhámos tudo, menos a Liga Europa, que todos sabem como foi. O Rui Vitória, quando chega ao Benfica, já estava escolhido há um ano. Estava no Vitória SC e, quando o Jesus fosse embora, ele era o treinador seguinte. Eu nunca impus um treinador. Se calhar, o Rúben Amorim era hoje nosso treinador. Eu disse (a Pedro Mil Homens) para contactar o Bruno Lage. Ninguém pagava o que pagávamos ao Bruno Lage. Quando chegámos a acordo com a saída do Rui Vitória, passado uma hora liguei ao Bruno Lage e disse que ia treinar o Benfica. Eu estava a falar com o José Mourinho e o Bruno Lage até me disse que o ia buscar ao aeroporto".
Roger Schmidt: "Ganhou o primeiro candidato que ganhámos, lançou o João Neves, o António Silva e dificilmente algum treinador lançaria estes dois jogadores. Foi ele que escolheu. No Benfica há muita gente que tem a cultura dos nomes. Houve um grande trabalho dele com estes dois miúdos. Na segunda época que faz, além de correr tudo mal, excedeu-se numa coisa ao destratar a massa associativa do Benfica e ao ofendê-la. Também me mandaram garrafas de água, mas isso faz parte. Eu ia aconselhar-me com o departamento juridico e tenho a certeza que diziam que faltou ao respeito ao Benfica e podíamos abrir um processo disciplinar. Eu dizia-lhe logo 'mister, fale com o seu advogado, amanhã não treina'. Aquilo foi tão baixo. Nenhum treinador fez isto à massa associativa do Benfica. Um treinador tem de ter respeito pelos adeptos do Benfica. Se calhar nunca teve tanto apoio na vida como teve agora. Era logo naquela altura (despedimento).
"Bruno Lage não aguentou a crítica"
Regresso de Bruno Lage: "Entra num período muito difícil. Se foi a primeira opção, à noite ele era o treinador. Foi como eu fiz com o Rui Vitória. De certeza que não foi a primeira opção. Basta ver as notícias nos jornais. Tudo para ver o que agradava aos adeptos do Benfica. Se o Bruno Lage era a primeira opção, tinha sido apresentado. O Bruno Lage, quando entrou no Benfica, pu-lo com convicção que é um treinador de grande qualidade. Nos primeiros treinos os jogadores do Benfica disseram que era curto e duro. Tem boa linguagem, intensidade nos treinos e ganhou. Na minha ótica, é um grande treinador. Sempre disse que via o Canal Panda. Começámos bem, perdemos com o FC Porto e chegámos ao fim da primeira volta com sete pontos de avanço. Tenho uma grande relação com o Bruno, não inventem fantasmas, despedi-o para defender os interesses do Benfica. Custou-me muito dizer-lhe isto, mas também não lhe faltou nada. O que se passou com o Bruno, ele foi muito idolatrado pela comunicação social, cheguei a Itália e no jornal vinha 'o novo Mourinho'. Quando começaram as críticas, disse ao Tiago (Pinto) que ninguém o defendia. Ele estava sempre perto do Bruno Lage. O Tiago contou-me isto. Em termos emocionais, não aguentou a crítica. Eu compreendo, não estava habituado. Ele cresceu, no Wolverhampton fez um bom trabalho no primeiro ano".
Treinador que Vieira colocaria no Benfica: "Quando o Schmidt veio, dei uma entrevista a dizer que não concordava com um treinador estrangeiro e perguntaram quem seria o meu treinador. Eu disse que seria o Leonardo Jardim, nunca trabalhei e adorava. O presidente do Benfica já tomou a decisão".
"Posso assegurar que o João Neves não queria sair do Benfica"
Saída de João Neves: "Ele encarnava o espírito do Benfica. É um jogador fabuloso, tanto dentro como fora de campo. Nunca tinha visto um jogador tão adorado pelos adeptos do Benfica. O Rúben Dias também era assim. Saiu porque tinha de ser remunerado para um patamar alto, vieram comunicar que o Borussia Dortmund queria comprar o Rúben Dias, comecei o salário em 2, 2,5 e o Rúben Dias ficou feliz no Benfica. Não fomos apurados para a Liga dos Campeões, tivemos de vender. João Neves continuava no Benfica (se fosse presidente). Por esse valor (60 milhões de euros) não saia. Posso assegurar que o João Neves não queria sair do Benfica. Se estivesse a ganhar 2, 2,5 milhões de euros ainda estaria no Benfica. Compreendo que quando não há dinheiro vão os anéis e ficam os dedos. Tenho a certeza absoluta que não há liquidez financeiro. Mais valia ter vendido 3 ou 4 montes que andam por ali".
Bruno Lage pode dar título ao Benfica: "Não conseguimos ser campeões se puxarmos um para cada lado. O Rui Costa tem de estar perto do Bruno Lage. Ele tem de se atravessar. É com Bruno Lage que podemos ganhar. O primeiro título que ganhámos, uma pessoa que era contra a contratação do Bruno Lage chegou, deu-me um abraço e disse-me 'tinhas toda a razão'.".
Sérgio Conceição: "É um grande treinador, reconheço isso. É um treinador ganhador, que eu gosto, qualquer pessoa gosta. Tem aquele temperamento, mas desde que o presidente do Benfica se impusesse ele não tinha esse temperamento".
Mercado do Benfica: "A época desportiva do Benfica foi muito mal planeada. Nem sei o que dizer. Nunca tivemos uma pré-época desta natureza. Sai o brasileiro que era um craque. (Neres) seria um jogador muito importante. João Mário veio para o Benfica pelo Rui Pedro Braz, o Jesus adorava o João Mário, concordou logo, foi muito importante no primeiro título do Benfica, depois as coisas não correram bem. Nunca vou perceber como é que um jogador foi assobiado e lhe diga 'desculpa, os benfiquistas quando perdemos vão loucos para casa'. Acho que era um jogador de qualidade".
"Eduardo Stock da Cunha? Os benfiquistas podem estar descansados"
Contas do Benfica: "Nos últimos três anos, o passivo do Benfica aumentou 100 milhões de euros, os capitais próprios reduziram, penalizou-se a recuperação que estávamos a fazer do Benfica. Financiamento subiu 50%. A única coisa que compensou foi o departamento comercial. A média de comissões é a mais alta que nós pagámos. O Benfica vai à Liga dos Campeões porque teve sorte, não foi por mérito próprio. As pessoas têm de aprender com o que se passou este ano. Esta receita é bastante importante. Já deu um passo importante com a entrada do novo administrador na SAD (Nuno Catarino). É super competente e de inteira confiança. Eduardo Stock da Cunha? Com ele os benfiquistas podem estar descansados. Estava o problema resolvido. O que o Benfica precisa é de ter uma equipa de gestão credível".
Eleições antecipadas: "Acho que é indecente se alguém neste momento andar a propôr eleições. O Rui Costa foi legitimado para ser presidente até 2025. Posso discordar de Rui Costa, mas ele tem toda a legitimidade para ir até 2025. Se calhar tem de ser mais aconselhado, não se aconselhe tanto por Nuno Costa. Comigo estava lá para distribuir bilhetes, tirar apontamentos. Nunca viajou comigo no carro. Estava no lugar deles. Alguma vez alguém podia ter a força que ele tem no Benfica? O presidente do Benfica tem de crescer. Isto não foi para o atacar".
Eventual candidatura à presidência do Benfica
Candidatura à presidência do Benfica: "Não vou avançar. Destruiram muito a minha família e isso para mim é imperdoável. Há homens que não merecem lá estar. Tenho de proteger a minha família. Estragaram a vida ao meu filho e ao meu neto. Nuno Costa devia ter muito respeito por mim, fui eu que lhe dei emprego e ele foi trair-me".
Nova pergunta sobre possível candidatura à presidência do Benfica: "Há mais pessoas para fazer isso. Tenho 20 anos de Benfica. Se não falarem comigo, vão prejudicar o Benfica nos direitos televisivos. Não sabem negociar aquilo".
Pedidos dos adeptos do Benfica para se candidatar: "Já recebi mensagens para voltar. As pessoas devem entender o que eu sofri e saber que estou muito magoado. A justiça tem de funcionar. O presidente (Rui Costa) era o primeiro que tinha dado o passo. Nem pensar (voltar a ser presidente do Benfica). A palavra nunca não se diz. Se houvesse algo, tinha de ser uma coisa muito profunda. Estou disponível para ajudar o Benfica".
"Ganhava eleições contra Rui Costa, de certeza absoluta"
Caso de justiça: "Não foi a justiça que me impediu de continuar do Benfica. Quem pediu a demissão do Benfica fui eu... Quando fui ouvido pelo juiz Carlos Alexandre e Rosário Teixeira pedi a suspensão do mandato. Disse que não me sentia à vontade. O que pode existir é de estar inibido de falar com os membros da SAD... depois saí, sei o que sofri. Depois foi o Domingos que me ligou para saber o que se passava com o empréstimo obrigacionista. Disse que para reconhecerem aquilo eu tinha que pedir a demissão. E eu pedi. Tenho a certeza que vou ser ilibado. Há coisas que não compreendo. Ainda há dias fui ouvido num processo que diziam que era de desvio de dinheiro, faturas falsas... nada, nada. Eu devia era ter ido logo para julgamento para tudo ser resolvido. O Estado andou a gastar dinheiro... nem valia a pena ser investigado".
Assembleia Geral: "Eu suspendia a Assembleia Geral. Imagine que empatamos. Vão partir o Benfica todo, tem de haver eleições".
Voto eletrónico: "O Benfica é do Mundo, não é de Lisboa. Querem que volte a ser de Lisboa, mas não. Todos os sócios têm que ter direito a votar estejam onde estiverem, através do voto eletrónico. Tem que ser exigido. A proposta que existe? É silenciar os benfiquistas. Deve haver um referendo aos benfiquistas sobre o voto eletrónico. Noutras áreas também. Uma das coisas que querem fazer é se chumbarem dois relatórias e contas há eleições antecipadas. Não pode. Qual é a credibilidade que o Benfica tem? A AG devem ser transmitidas em direto para todos os benfiquistas. O Benfica sempre foi um clube democrático. Houve gente que só foi lá para ofender. As AG's tinham que ser dadas em direto. Não estamos 40 anos atrás. Com a tecnologia faz-se tudo. Se continuamos fechados... se tivermos que ir votar ao Estádio da Luz tornamo-nos no clubezinho de Lisboa. Isto é uma grande empresa. Quanto aos órgãos sociais serem remunerados sou contra. Devem ser fiscalizadores, não ter o poder de decidir. Nós andávamos 10 anos à frente. Depois o Benfica abrandou, esta direção não fez o que devia ter feito. Estamos estagnados".
Convites para integrar listas: "Vieram dois presidentes de duas grandes empresas falar comigo. Perguntaram-me se eu ia ser candidato. Eu disse que não e ele disse para o apoiar, que não poderia perder os meus 20 anos de experiência do Benfica".
"O Gyökeres estava identificado"
Eventual regresso à presidência: "O que é que vou dizer à minha mulher? Foram quatro meses terríveis. Morte do namorado da minha filha, doença da minha mulher, minha, passámos tudo. Fomos mal tratados por quem está dentro do Benfica. Ganhei seis eleições no Benfica, demos grande credibilidade ao Benfica. Quem é o presidente do Benfica para dizer 'não falem do nome do Vieira aqui dentro'?".
Caso se candidatasse contra Rui Costa: "Ganhava, não tenho dúvidas nenhumas. Quem tem a obra feita? Quem ganhou os títulos que tenho? Quem recuperou o Benfica da falência? Quem profissionalizou? Por amor de Deus. Ganhava (contra Rui Costa). De certeza absoluta".
Jogadores: "Quando o Jesus voltou ao Benfica, ele queria o Cabreras. Tinha um relatório do Cabreras a dizer que não aconselhavam a comprar. O Jorge foi ver e não houve problema nenhum. Se lhe disser que o Jurásek tem no relatório 'não comprar' e alguém disse que tinha que dar este jogador ao treinador. Quem disse foi o presidente, acompanhado pelo Rui Pedro Braz. O Gyökeres estava identificado e disseram 'nem pensar comprar um jogador da segunda divisão'. Preferiram comprar o Schjelderup e o Tengstedt. Gastaram 30 M€ nisto, mais caro do que o Gyökeres".
Direitos televisivos: "Não querem, não há problema"
Direitos televisivos: "Quem negociou os direitos televisivos? Fui eu. Disse que era 40 milhões, depois foi fácil para os outros. Quem foi o pioneiro a montar o canal? A transmitir a Premier League? O Benfica. Como viram que tínhamos pedalada, chegaram à conclusão que era melhor pagar. Nas negociações que fizeram faltava a palavra, tinha de haver uma diferença entre o Benfica e o FC Porto e Sporting. Se for lá eu, digo que é 'assim, assim e assim'. Não querem, não há problema, vamos começar a transmitir os jogos".
Última resposta: "O mais importante é o que os meus filhos e netos pensam de mim. Não tenho de justificar nada aos benfiquistas. Dei 20 anos de mim. Estava a falar para os benfiquistas. Quero garantir que não vos esqueci, estiveram sempre no meu pensamento nesta entrevista e tudo o que fiz e trabalhei foi em prol do Benfica".