O alívio veio quando os exames apontaram que não era nada grave, com o tempo de recuperação sendo suficiente para se apresentar em boas condições à seleção brasileira.
Depois do Brasil ter números 9 - na camisola - de classe mundial como Ronaldo, Romário e Adriano, Richarlison tem a missão de desempenhar essa função na equipa de Tite, deixando de lado qualquer pressão para preencher a lacuna deixada por nomes que fizeram a sua história com a camisola da seleção brasileira. Caracterizado como um bom mineiro, mesmo sendo capixaba, Richarlison conquistou ao poucos o seu espaço e longe de ter o mesmo estatuto de outros nomes da seleção, como Neymar.

O pombo, alcunha atribuída devido às suas comemorações, chega ao Catar no momento de maior maturidade da sua carreira. Mas o seu talento já era conhecido nas camadas jovens, quando ainda defendia o América Mineiro. A sua trajetória foi meteórica, despertando o interesse de clubes de um nível maior e assim sucessivamente. A sequência de clubes que defendeu assim o mostra.
Crescimento progressivo
Do América Mineiro, em 2015, quando anotou nove golos em 12 jogos, foi para o Fluminense, um dos maiores clubes do Brasil. De lá, bastaram dois anos antes de rumar ao Watford, de Inglaterra, em 2017. Um passo gigante, mesmo defendendo uma equipa de menor expressão. De qualquer forma, estaria na Premier League, com a chance de ter muitos minutos em campo e mostrar o seu valor, agora em território internacional. E não é que o jovem, com apenas 20 anos, deu conta do recado?
Um ano foi suficiente para ter a sua primeira oportunidade dentro da seleção principal. As atuações cada vez mais consistentes nos clubes influenciaram a escolha. Em 2022, afirmou-se como titular com 10 golos em 12 jogos, justamente em ano de Mundial, números que não deixaram dúvida na cabeça de Tite sobre quem deveria ser o seu 9.
Em 2018 veio uma transferência histórica para o Everton, clube num patamar acima do anterior, onde teria um desafio maior. Foram 45 milhões de libras desembolsadas pelo clube, a maior quantia já investida em toda a sua trajetória por um jogador. Richarlison parecia não sentir a pressão de jogar em equipas de maior expressão. Ao todo, foram quatro temporadas no Everton, onde teve tempo suficiente para mostrar a sua condição de lograr voos mais altos.

O seu desempenho na equipa de Liverpool voltou a ser satisfatório (10 golos e cinco assistências em 30 jogos na temporada 21/22 da Premier League), fazendo com que um dos gigantes da Premier League o comprasse. O Tottenham sabia bem das contribuições que o brasileiro poderia dar em campo e assim foi, com uma transferência de 60 milhões de euros. Na Liga dos Campeões, são dois golos em quatro jogos, estando ainda em branco no campeonato. Ainda.
No emblema inglês, Richarlison procura afirmar-se como um dos maiores avançados do mundo, com o Mundial a servir de trampolim para essa consolidação. Alguém duvida da sua capacidade?

Diferenciado
Richarlison é diferente, não só com a bola no pé ou com suas finalizações precisas, que muitas vezes acontecem com um único ou poucos toques na bola. A sua postura de defender classes e direitos tira-o do lugar comum. Raros são os jogadores do futebol brasileiro que "compram brigas" e saem em defesas de causas sociais como ele.
Por estas e por outras, Richarlison criou uma empatia importante entre os adeptos brasileiros, que o escolhem como um dos favoritos pelo seu envolvimento na luta dos mais necessitados e menos favorecidos.
Entre as causas em que escolheu manifestar-se enquanto podia acomodar-se e fingir que nada acontecera estão as queimadas incessantes na região amazónica, a crise de luz no Amapá, o movimento Black Lives Matter e a violação da influenciadora Mari Ferrer, para além de divulgar no Twitter o trabalho de pessoas que passavam dificuldades durante a pandemia.

Em 2020, Richarlison foi o vencedor do prêmio Community Champion, promovido pela Associação de Jogadores Profissionais da Inglaterra, devido às suas ações de caridade fora das quatro linhas. Atualmente, 10% do seu salário é destinado para o instituto de tratamento do cancro na cidade paulista de Barretos. Quantos jogadores fazem isso? Se formos contar, não cabem nos dedos de uma mão.
Isto tudo devido à sua origem humilde, no interior de Espírito Santo, que o fez ver que a sua posição pode fazer a diferença para ajudar centenas de pessoas que estão a quilómetros de distância da sua realidade e privilégio.