Entrevista a Nuno de Almeida, diretor do Rio Ave: "Benfica ofereceu 12 milhões pelo Taremi, o Sporting oito"

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Entrevista a Nuno de Almeida, diretor do Rio Ave: "Benfica ofereceu 12 milhões pelo Taremi, o Sporting oito"
Nuno de Almeida, diretor desportivo do Rio Ave
Nuno de Almeida, diretor desportivo do Rio AveLinkedin
Nuno de Almeida cumpre a terceira temporada como diretor desportivo do Rio Ave. Aos 37 anos, iniciou a sua carreira no futebol profissional como observador do FC Porto e passou ainda pelo Elfsborg, da Suécia, antes de chegar a Vila do Conde. Nuno de Almeida falou ao Tribal Football sobre a nova parceria do Rio Ave com a app de scouting Nordensa, numa conversa onde confirma e explica a entrada de Evangelos Marinakis na SAD vila-condense e onde revela os valores que os três grandes ofereceram por Mehdi Taremi antes do iraniano optar pelo FC Porto.

- O Rio Ave continua a conseguir competir com os grandes clubes portugueses no mercado de jovens talentos?

- Como costumo dizer, o FC Porto, o Benfica, o Sporting e o SC Braga estão a trabalhar para nós. São clubes que gastam muito dinheiro na formação, têm os jogadores de topo da formação nos seus plantéis. Em Portugal não interessa tanto a competição do campeonato de jovens em si. Eles são mais competitivos dentro dos clubes do que nos campeonatos. Um treino de um grande clube é mais competitivo do que a maioria dos jogos antes da fase final. São oito jogos realmente competitivos numa época inteira. Daí que diga que eles estão a preparar os jogadores para nós. Eu fiz um estudo e nos últimos 10 anos, 1043 jogadores passaram por essas equipas e apenas 3% chegaram à formação principal. Estamos a falar de 54 a 60 jogadores num universo de mais de um milhar. É por isso que digo que temos mais de 900 jogadores de topo que estão disponíveis para um clube como o Rio Ave. Nós não procuramos um jogador prodígio, esses apenas em golpes de sorte. Mas temos disponíveis todos os outros, de topo. 

(...)

- Dou um exemplo. Antes de eu chegar ao Rio Ave, trabalhei na formação e trabalhei com o Diogo Jota, que é da mesma cidade que eu. Ele nos sub-13 e sub-14 estava atrasado no seu desenvolvimento mas era um jogador de topo, um goleador, um médio muito ofensivo, resiliente, que tinha fome de competir e de vencer. Quando o Diogo Jota fez 17 aos foi para o Paços de Ferreira. Não passou pelo FC Porto, pelo Benfica ou pelo Sporting, porque esses queriam o jogador à experiência, uma vez que ele era de um clube pequeno, o Gondomar. O irmão dele estava no FC Porto desde os 8 anos, esteve lá até aos sub-19. Agora o irmão está na segunda divisão em Portugal e o Diogo Jota está na Premier League. É por isso que se tem de passar muito tempo a olhar, não para os prodígios, mas para aqueles que jogam bom futebol, que podem atingir o topo, e que estão ali disponíveis. Daí que eu diga que os grandes de Portugal estão a trabalhar para nós. Temos no plantel o Guga, formado no Benfica, o João Graça, formaod no FC Porto, o Miguel Nóbrega, melhor amigo do João Félix, que fez toda a formação no Benfica... Estes jogadores têm grande experiência na formação e desde os 9/10 anos estão habituados à pressão. Quando chegam ao Rio Ave, com o apoio certo, dão o passo em frente porque estão preparados para esse nível.

- O Rio Ave é o clube certo para isso?

- O Rio Ave é um clube que não tem de lidar com toda aquela pressão de um clube grande. Claro que se perdermos um jogo, sabemos que vamos ser criticados nas redes sociais, nos jornais... mas não temos esse ambiente. Por isso somos o clube certo para trazer jovens jogadores e promover na nossa Liga. Não é fácil ter isto. É por isso que o Ederson, antes de assumir a baliza do Benfica, passou pelo Rio Ave. O Oblak e o Fabinho também. As grandes equipas em Portugal detetam os jovens talentos mas preferem colocar primeiro num patamar intermédio, como o Rio Ave. Se levarem um jovem talento direto para a equipa principal, têm de ganhar os jogos todos, têm de lutar para serem campeões, há muita pressão dos adeptos, da estrutura, do treinador, dos próprios companheiros de equipa. É muita coisa para lidar. Por isso existe este passo intermédio, como o Rio Ave, para ambientar.

Jacob Hansen em conversa com Nuno de Almeida
Jacob Hansen em conversa com Nuno de AlmeidaFlashscore

- Como tem sido recebido a entrada do investimento de Evangelos Marinakis no Rio Ave?

- Eles falaram com a direção, não com a parte desportiva. O que está claro é que quando se tem um clube em Inglaterra, um clube campeão na Grécia, que está sempre nas competições europeias, a maioria das vezes é preciso um clube intermédio. Com uma rede de scouting na América, em África, na Europa, quando se encontra um jogador talentoso, é preciso um passo intermédio. Eles têm, por exemplo, um jogador no Nottingham Forest, o Brandon Aguilera, de 20 anos e da Costa Rica. Na última época jogou no Mundial do Catar. Contrataram-no e a primeira coisa que fizeram foi colocá-lo nos sub-23 do Estoril. Ele esteve num Campeonato do Mundo e, depois de ser contratado, foi para uma competição sub-23. Imagine o passo de um nível de topo para esse. Agora ele está na equipa secundária do Nottingham Forest. Se eles já tivessem o Rio Ave na sua rede, o passo certo talvez fosse ele vir para aqui, estar entre a equipa principal e os sub-23, onde teria o tempo para se adaptar e os minutos de competição para o próximo passo. Agora, no Nottingham, não vai ser fácil. Mas ele é um talento de topo. Com esta corrente entre Rio Ave, Olympiacos e Nottingham Forest, encaixa-se bem no desenvolvimento dos jogadores. Podemos desenvolver os atletas, a fábrica estará no Rio Ave. É esta a minha visão nesta parceria.

(...)

- É um acordo que está fechado. Temos de nos lembrar que tivemos no Olympiacos treinadores portugueses como Pedro Martins, Marco Silva, Vítor Pereira e agora Carlos Carvalhal. Alguns jogadores da Premier League foram para o Olympiacos, alguns da liga portuguesa também. Talvez neste processo tenham percebido que o nosso mercado é ideal para eles.

- Já teve algum contacto com Marinakis?

- Não. Apenas a direção.

- A impossilidade do Rio Ave contratar já foi levantada. O plantel precisa de reforços?

- É um ponto muito sensível mas vou tentar explicar porque precisamos de ir ao mercado. Quando descemos de divisão fizemos uma grande mudança no plantel. Dos 26/27 jogadores só ficaram três. Depois disso, chegaram atletas da formação. É algo de que me orgulho muito, pelo trabalho de todos, não só meu. Hoje estamos no top 6 dos clubes formadores. Temos dois jogadores titulares na equipa principal, o Fábio Ronaldo de 2001 e o Costinha, de 2000. Com o Costinha uma das coisas que fizemos foi colocá-lo a titular na lateral-direita e depois contratar um suplente, alguém que soubesse à partida que esse seria o seu papel. Não foi fácil mas foi a melhor estratégia. O Costinha e o Fábio Ronaldo podem agora ser vendidos com bom lucro e são 100% do Rio Ave. E isso é muito importante.

"Precisamos de três ou quatro reforços que aumentem o nível da equipa"

(...)

- De todos os jogadores que contratámos, apenas o Renato Pantalon veio do estrangeiro, da Croácia. Todos os outros estavam em Portugal. Desde 2021 que temos mais ou menos os mesmos jogadores. No último mercado de inverno perdemos o nosso melhor marcador, o Aziz, que fez 19 goos na China e já tinha feito 10 no Rio Ave na primeira metade da época. Talvez possa voltar porque está apenas emprestado. Perdemos mais um jogador para a Arábia e outro para o Watford. No final da temporada passada perdemos também o Miguel Baeza, que voltou ao Celta de Vigo, o Paulo Vítor para o Cruzeiro e o Samaris, que foi para o Coritiba. Sem poder contratar jogadores, e perder estes seis, conseguimos ter na mesma uma equipa a competir na Liga. Os jogadores estão a ter um enorme desempenho, a equipa técnica tem feito um trabalho fenomenal, com enorme estabilidade, já na terceira época, algo que não é habitual em Portugal. É com essa estabilidade que se conseguem resultados mas esta situação confortável também acaba por ter outro lado, porque os jogadores não têm a competitividade interna necessária. Se estiveres sob avaliação todas as semanas, com um suplente à altura, melhoras e evoluis. É isso que queremos melhorar no mercado. Mais do que muitos jogadores, são três ou quatro reforços que aumentem o nível da equipa. Estamos a preparar pequenos ajustamentos na equipa mas esses têm de conhecer bem a nossa Liga e têm de estar um nível acima dos nossos. Senão não faz sentido contratar. Já temos os alvos identificados, agora a direção irá tratar das negociações.

- O Rio Ave foi o responsável pela vinda de Taremi para a Europa. Como foi o desempenho do iraniano em Vila do Conde?

- O Taremi foi um caso distinto, um golpe de sorte. Deu um passo ao contrário do que é habitual. Ele chegou do Catar a Portugal quando a maioria quer ir de Portugal para o Catar. É um jogador que chegou com enorme conforto financeiro, jogou no Irão e no Catar, com um grande salário. Mas queria jogar na Europa, um dos sonhos dele era jogar na Liga dos Campeões e numa liga dos big five. Quando quis vir para a Europa a maioria dos clubes rejeitou, tinham dúvidas por chegar do Irão, havia esse desconhecimento. O Carlos Carvalhal, que era o treinador do Rio Ave, conhecia o Carlos Queiroz, selecionador do Irão, e teve essas garantias. Quando ele chegou ao Rio Ave um dos impactos imediatos foi a sua humildade. Muito fechado em si, não falava com muita gente mas treinava muito. E tinha uma qualidade que fazia toda a diferença. quando o coletivo não conseguia criar as ocasiões de golo, ele criava-as por ele próprio. Para um clube como o nosso faz muita diferença. O Fran Navarro, que agora está no FC Porto, também tem essa capacidade, o Carlos Vinícius também. Este tipo de perfil pode ter sucesso em Portugal. O Taremi surpreendeu-me também porque foi para o FC Porto e não é um ponta de lança, é um segundo avançado, um playmaker. E faz 52 jogos por éoca sem lesões, isso é determinante no futebol atual. O Taremi na próxima época vai de certeza dar o salto para a Premier League ou para a Serie A. Tem a qualidade necessária para isso, sem qualquer dúvida.

Taremi chegou ao Rio Ave em 2019/2020
Taremi chegou ao Rio Ave em 2019/2020Rio Ave FC

"Foi o Taremi que escolheu o FC Porto"

- Como foram as negociações para a transferência de Taremi?

- Não vi os contornos mas conheço o agente e as conversações que o ex-presidente teve comigo. Ele veio para o Rio Ave num negócio de 50/50, ou seja, ele tinha metade do seu próprio passe. Quando ele saiu, o Rio Ave recebeu 5,1 milhões. O Taremi decidiu ir para o FC Porto porque eles tinham sido campeões nacionais e entravam diretamente na fase de grupos da Liga dos Campeões. Ele tinha esse sonho. O Sporting ofereceu oito milhões pelo Taremi e o Benfica ofereceu 12 milhões de euros. Imagine se o Benfica tivesse sido o campeão nessa altura, o Rio Ave tinha recebido ainda mais. Mas foi o Taremi que escolheu. Acabou por ser bom na mesma, temos é de trazer mais Taremis para o Rio Ave.

- E dos jovens jogadores, algum que mereça um olhar mais atento no Rio Ave?

- Temos um em que temos de nos focar. O Julien Lomboto, um médio de 21 anos, de 1,92 metros, francês, a família dele é do Congo. É um típico médio que não temos em Portugal: agressivo, físico, que pode cobrir todo o meio-campo. Temos muita confiança nele. Tem atualmente o problema de ter na sua posição o Amine, com mais experiência, que está a fazer uma grande época, e o capitão, suplente nessa posição. É complicado com esta concorrência mas na próxima época acho que vai ser titular. Tem o perfil ideal, que não existe em Portugal. Temos de recrutar no estrangeiro.