Feridas causadas pela guerra reabrem em Roland Garros

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Feridas causadas pela guerra reabrem em Roland Garros
Elina Svitolina, sentada, celebra a vitória sobre a russa Anna Blinkova
Elina Svitolina, sentada, celebra a vitória sobre a russa Anna Blinkova
AFP
Há mais de um ano que os tenistas russos, bielorrussos e ucranianos têm de coabitar no circuito mundial, uma situação que fraturou o balneário e provocou tensões que, por vezes, explodiram, como aconteceu nesta edição de Roland Garros.

O presidente do Comité Olímpico Internacional (COI), Thomas Bach, que é favorável à reintegração dos atletas russos e bielorrussos nas competições após a sua exclusão devido à invasão da Ucrânia, evoca habitualmente o exemplo do ténis como uma das referências para uma boa coabitação entre os jogadores dos países envolvidos.

No entanto, a realidade é muito diferente da perceção do COI.

"Não é aceitável"

Poucos dias após a recomendação do COI, em março de 2022, de proibir russos e bielorrussos de competir, a ATP e a WTA excluíram-nos das competições, autorizando-os a jogar individualmente no circuito sob uma bandeira neutra.

E a ferida começou a abrir-se, mais no circuito feminino do que no masculino, já que nenhum jogador ucraniano está no top 100. O primeiro é o 183.º do mundo.

No circuito feminino, quatro jogadoras ucranianas têm de se cruzar nos courts e nos balneários com uma dúzia de russas e bielorrussas, todas no top 100 mundial.

Há meses que as jogadoras ucranianas se queixam desta situação e acusam os órgãos dirigentes do ténis mundial de falta de firmeza, exigindo a exclusão total das jogadoras russas e bielorrussas.

Como gesto simbólico, algumas recusam-se a apertar a mão às adversárias destes países, como Anhelina Kalinina após a vitória sobre a russa Veronika Kudermetova nas meias-finais em Roma, ou Elina Svitolina contra Anna Blinkova, na sexta-feira, na terceira ronda de Roland Garros.

Kalinina recusa-se a apertar a mão a russas e bielorrussas
AFP

"Não apertámos as mãos porque esta rapariga vem da Rússia. Não é segredo que este país atacou a Ucrânia", explicou Kalinina. "Não há nada de pessoal, mas, de uma forma geral, não é aceitável".

A número um do mundo, a polaca Iga Swiatek, falou sobre o assunto ao diário francês Le Monde: "Há de facto tensões entre as jogadoras, o ambiente no balneário é bastante pesado. Não sei bem o que Thomas Bach quis dizer. Há uma espécie de caos no desporto", acrescentou.

"Há duas realidades que coabitam, o desporto e a guerra. Quando as duas realidades se confrontam, a guerra é mais importante", resume Lukas Aubin, especialista em geopolítica do desporto e diretor de investigação do Instituto Iris de Relações Internacionais e Estratégicas.

As mulheres ucranianas utilizam frequentemente as palavras para exprimir o seu descontentamento fora do âmbito do desporto.

A Federação Internacional de Ténis recordou esta semana que as declarações políticas não são proibidas, depois de Novak Djokovic ter dito que o Kosovo devia fazer parte da Sérvia.

"A armadilha de Coubertin"

Na estreia em Roland Garros, a ucraniana Marta Kostyuk recusou-se a cumprimentar Sabalenka. A multidão vaiou a sua decisão e a jogadora disse depois, em conferência de imprensa, que os adeptos deviam "ter vergonha".

"Estas vaias em Roland Garros são uma novidade. O público parece ter escolhido o campo do desporto", analisa Aubien.

"É aquilo a que chamo de armadilha de Coubertin, que transmite uma mensagem muito antiga: o importante é participar. O desporto mundial assenta nesta máxima, que nós e outros investigadores estamos a tentar desconstruir, de que o desporto não é político", acrescenta.

Sabalenka também reconheceu que está a passar por um momento difícil. "Nunca senti tanto ódio no balneário, é difícil compreender que haja tanta gente que me odeia sem razão, eu não fiz nada", disse em Miami.

Depois de uma aparição em Roland Garros em que foi alvo de várias perguntas relacionadas com a guerra e a sua relação com o presidente bielorrusso Alexander Lukashenko, por parte de um jornalista ucraniano, a jogadora pediu para não ir à conferência de imprensa após o jogo de sexta-feira.

"Tenho de me sentir segura quando falo com os jornalistas depois dos meus jogos. Para a minha própria saúde mental e bem-estar, decidi não me colocar nessa situação hoje e o torneio apoiou a minha decisão", disse a jogadora sobre uma decisão apoiada pelos organizadores de Roland Garros.