Entrevista Flashscore a Afonso Figueiredo: "Quero fazer um luto ao futebol"

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Entrevista Flashscore a Afonso Figueiredo: "Quero fazer um luto ao futebol"
Afonso Figueiredo ao serviço do Moreirense, último clube que representou na Liga Portugal
Afonso Figueiredo ao serviço do Moreirense, último clube que representou na Liga PortugalAFP
Aos 31 anos, Afonso Figueiredo trocou os relvados pelo estúdio e pela entrada no mundo dos Podcasts. Com carreira feita em Portugal e no estrangeiro, elege a Ligue 1 como o ponto mais alto da sua carreira e lamenta nunca ter jogado pela equipa principal do Sporting. Nesta entrevista conduzida pelo Jornalista João Paulo Ribeiro, confessa-se desencantado com o mundo do futebol.

Começou a formação no Sporting, clube do coração, mas foi no Boavista que ganhou notoriedade, ao ponto de ter recebido uma proposta do Benfica, que rejeitou para jogar no Rennes, naquela que foi também a sua estreia a jogar fora de Portugal. Depois de dois anos no estrangeiro, regressou a Portugal, onde passou por mais cinco clubes até terminar a carreira, aos 31 anos.

Agora, Afonso Figueiredo dedica a vida ao podcast "Entrelinhas", mas já tem planos para o futuro, como contou nesta entrevista ao Flashscore, onde também explicou os motivos que o levaram a terminar a carreira tão cedo.

- Porque é que tomou a decisão de abandonar a carreira tão cedo?

- A minha decisão foi simples. Sempre disse que iria jogar até me sentir feliz a jogar futebol. Não por questões físicas, porque sempre me senti bem fisicamente. Felizmente, sempre tive poucas lesões. Foi mais por uma questão mental, um acumular de situações que aconteceram nos últimos anos e me foram tirando a paixão por estar no mundo do futebol. Por isso, para o meu bem, decidi que estava na altura de deixar o futebol.

- Olhando ao seu percurso, o que destaca? Como foi a carreira no futebol do Afonso Figueiredo?

- Olho para trás com orgulho. Como já disse, tive muito mais do que aquilo com que sonhei. Tenho a realização de muitos sonhos que tive, mas o ponto alto da minha carreira foi ter jogado na Ligue 1, ao lado de jogadores de elite e contra jogadores de elite. A época de maior felicidade acaba de ser no Boavista, que foi quando me estreei na Liga Portugal e se calhar o clube onde me senti mais importante e acarinhado.

- O que é que o futebol lhe deu enquanto futebolista?

- Acabou por me dar tudo. Sou muito grato ao futebol. Tudo o que tenho na vida foi conquistado com ajuda do futebol, tenho um sentimento de gratidão enorme por tudo o que o futebol me deu, por tudo o que conquistei, mas a minha paixão em jogar foi-se perdendo.

- Quais foram os melhores momentos da carreira?

- Acima de tudo, os grandes jogos nunca se esquecem e sempre gostei de estar nesses jogos. Contra os três grandes em Portugal, contra o Paris Saint-Germain, jogos com as grandes equipas são aqueles que me ficam na memória pelos ambientes que vivi. O golo que marquei em Setúbal, pelo Boavista, foi muito especial porque tinha lá o meu pai a ver e foi o meu único golo da carreira. Foi um dia muito especial para mim.

Afonso Figueiredo jogou duas épocas no Rennes
Afonso Figueiredo jogou duas épocas no RennesAFP

- E quais foram os piores momentos?

- Foi o perceber que não dependia única e exclusivamente do meu trabalho para poder jogar. Essa frustração, ter de lidar com algumas injustiças, se calhar é o que me deixa mais triste no futebol. Nem sempre é o mundo cor de rosa que as pessoas pensam. Algumas pessoas podem ter errado comigo e se calhar a minha maior mágoa do futebol é essa, mas fica para trás, não guardo rancor de ninguém. Sempre segui em frente, deixando os problemas para trás. Aprendendo com eles, mas sempre de consciência tranquila. 

- Quais foram os melhores jogadores com quem jogou?

- Ia destacar dois, mas foram vários. O Yoann Gourcuff, no Rennes, foi quem mais me surpreendeu, era um jogador fantástico. O Bruno Fernandes, na seleção, era alguém que conhecia, mas que fiquei apaixonado pela liderança, pelo futebol dele e pela qualidade. Foram muitos jogadores. Sou um sortudo, tive a sorte de jogar com muitos craques, mas hei de estar a ser injusto por me esquecer de alguém, mas destaco estes nomes como top 1 e top 2.

- E a nível de treinadores? Quem é que o ajudou mais, fez evoluir, quem destaca nesse aspeto?

- Foram dois que tiveram um papel fundamental na minha carreira. O mister Romeu, o meu treinador nos sub-17 do Belenenses e o mister Rui Jorge, treinador da seleção sub-21 há alguns anos. Foram dois treinadores que apareceram no momento e altura certa da minha carreira e que ajudaram bastante com conselhos, com treinos, com a maneira de ser deles e acabaram por me mudar um bocadinho e foi essa mudança que me fez ser jogador de futebol, não tenho a mínima dúvida, e sou-lhes eternamente grato por tudo o que me ensinaram e pelo futebol que me fizeram passar a jogar.

Afonso Figueiredo teve proposta do Benfica
Afonso Figueiredo teve proposta do BenficaFC Penafiel, Opta by Stats Perform

- Mas trabalhou com eles na fase inicial da carreira. Nos últimos anos, há algum treinador com que tenha gostado de trabalhar e tenha aprendido com ele?

- Tive vários. No Moreirense, tive três treinadores numa época e foram os três fantásticos. O César Peixoto, o Ricardo Soares e o Vasco Seabra. Sempre tentei tirar o melhor de cada treinador e tive treinadores muito bons, mas se calhar na relação pessoal acabei por ganhar um amigo para a vida no Estrela da Amadora porque ainda hoje tenho um respeito e amizade enorme pelo mister Ricardo Chéu, que a meu ver foi quem percebeu melhor o meu futebol e me fez desfrutar mais do futebol. Com ele, podia jogar onde me sentia confortável, ele percebia isso e desfrutei bastante de jogar com ele.

- Há algum desejo que não cumpriu no futebol?

- Só um, mas faz parte. A minha carreira foi como teria de ser e estou muito orgulhoso da carreira que fiz.

- Mas qual foi esse desejo? Pode revelar?

- Sim, jogar no meu clube do coração. Qualquer jogador gostaria de o fazer, todos sonham em jogar num clube grande. Para mim, o Boavista é um clube grande, também já foi campeão em Portugal, mas no nosso país destacam-se o Sporting, o Benfica e o FC Porto e eu, que fiz a formação toda no Sporting, venho de uma família sportinguista, sempre tive esse sonho. Quando voltei a Portugal foi um bocado com esse objetivo, mas infelizmente não o consegui realizar. Faz parte. Nem sempre conseguimos tudo o que queremos e estou muito feliz pelo que consegui.

Afonso Figueiredo nunca jogou pelo Sporting, clube do coração
Afonso Figueiredo nunca jogou pelo Sporting, clube do coraçãoAFP

- Parece que, em 2016, teve a possibilidade de jogar num dos grandes rivais do Sporting. Conte-nos essa história.

- Sim, é verdade. No ano anterior, tinha sido falado pelo Sporting, mas houve a mudança de treinador do Marco Silva pelo Jorge Jesus. No ano seguinte, surge a oportunidade de ir para o Benfica, mas na altura não achei que fosse o melhor passo para a minha carreira, pela avaliação que fiz com os meus pais, com o meu empresário, e decidi ir para França porque era um projeto que, financeiramente, era muito melhor e quis dar esse rumo à minha carreira. Não digo que hoje teria feito a mesma coisa, mas é muito fácil falarmos depois. Não me arrependo, mas se calhar ter ido para o Benfica na altura podia ter dado outras coisas à minha carreira.

- Rumou ao estrangeiro. Como foram as experiências em França e na Bulgária.

- Foram experiências boas, que me fizeram crescer muito. Nunca tinha saído do meu país. Percebi que não é fácil adaptarmo-nos a outro país e a outra língua, apesar de o futebol ser igual em todo o lado. Tive um período demasiado grande de adaptação para o que devia ter tido. Depois ganhei o meu espaço e algum conforto, em França posso dizer que vivi dos melhores momentos do que é ser jogador de futebol e desfrutar disso mesmo. Na Bulgária, não tanto. Foi uma má decisão minha, fui para um grande clube, mas tive logo problemas com o treinador e acabou por não ser uma passagem muito feliz para mim, não pelo país em si, Sofia é uma cidade incrível, mas pelas circunstâncias das pessoas que apanhei lá. Acabou por ser uma escolha má da minha parte.

- Já falámos do passado, falemos do presente e do futuro. Criou um podcast, quer explicar-me o que é o "Entrelinhas"?

- Tirei o curso de treinador, sempre foi um plano que tinha na minha vida, mas decidi que não era o momento para o usar. Quero fazer um luto ao futebol. Quero estar afastado do campo, não que não queira voltar, mas neste momento prefiro estar numa área que gosto muito, que é a comunicação, onde quero trazer o que considero melhor do futebol, as pessoas. Quero trazer jogadores, treinadores, pessoas que estão no mundo do futebol para termos uma conversa descontraída sobre todas as coisas do futebol e coisas que tenhamos vivido. Penso que as pessoas vão ter uma ideia diferente do que se passa no futebol. Quero trazer algo de positivo para o futebol e é isso que vamos ter no meu podcast, que já saiu e terá em breve novos episódios.

- E esse curso de treinador e ambição ficam para mais tarde?

- É uma paixão que eu tenho. Tirei o curso e gostei muito de treinar. Gostava de começar num nível de formação, gosto de ajudar miúdos e de os aconselhar, algo que o Rui Jorge fez comigo, por exemplo. Gostava de ser um Rui Jorge para alguns miúdos, acho que é uma fase muito importante, mas também chegar ao futebol profissional. Quem sabe? Às vezes podemos ter uma carreira melhor de treinador do que de jogador, já vimos vários casos desses e não ficaria admirado, no meu caso, se isso acontecesse porque acho que também me pode dar muito.

- Vê-se noutra função no futebol? Dirigente, por exemplo? Ou apenas treinador?

- Não, por acaso é uma pergunta boa porque já pensei muitas vezes nela. Gostaria, também, de estar numa posição como diretor desportivo porque é uma parte que também gosto muito, da relação com os jogadores. O facto de ter sido jogador ajuda muito porque conseguimos perceber o que é que um jogador precisa e como podemos ajudar. Acho que era uma parte que teria bastante interesse.